“Finalmente fica reconhecido que, em Portugal, quem é preso ilegalmente e sem fundamento tem direito a ser indemnizado”, disse à Lusa o advogado Celso Cruzeiro, adiantando que isto “é a consagração final, ao fim de uma luta de 15 anos”.
O advogado falava em Aveiro, onde tem o seu escritório, após ter sido conhecida a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), que condena o Estado português a indemnizar Paulo Pedroso em 68.555 euros, após uma queixa do antigo ministro socialista relacionado com o processo Casa Pia.
O advogado aveirense referiu que a imagem de Paulo Pedroso já “estava limpa”, porque “estava reconhecido que não houve nenhum fundamento para a prisão”, mas realçou que "faltava que o Estado reconhecesse que também tinha que indemnizar por esse erro".
“O ordenamento jurídico português tinha consagrado que o erro tinha sido cometido, mas tinha defendido que o erro não era de tal monta que pudesse justificar uma indemnização e é isso que agora vem a ser posto em causa. É que o erro é de facto justificativo de uma indemnização”, explicou.
O valor indemnizatório atribuído pelo Tribunal Europeu fica muito abaixo do que era pedido pelo antigo ministro do PS, que rondava os 450 mil euros. No entanto, Celso Cruzeiro diz que isso é “um aspeto muito menor da balança nisto tudo”.
“A indemnização é uma coisa de somenos e redutora, mas é a consequência do reconhecimento da violação da lei”, afirmou o causídico.
Celso Cruzeiro revelou ainda parte de uma conversa telefónica que teve na segunda-feira com o seu cliente, que se encontrava nos Estados Unidos, que lhe disse que “a indemnização de um euro já era suficiente” e que o que era importante era “reconhecer a ilegalidade” da sua situação, “como foi tratado e a violação da lei praticada pelos órgãos jurisdicionais competentes”.
De acordo com uma decisão hoje divulgada, o TEDH deu razão a Paulo Pedroso, que exigia uma indemnização por ter sido detido preventivamente sem indícios suficientes no âmbito de uma investigação dirigida pelo Ministério Público no âmbito de alegados casos de pedofilia na Casa Pia.
Segundo a decisão do tribunal, no momento da detenção do ex-ministro, que ficou em prisão preventiva, “não havia suspeitas plausíveis de abuso sexual porque não tinha sido identificado pessoalmente” pelas vítimas.
As razões apresentadas para a sua detenção “não eram relevantes nem suficientes”, tal como já tinha sido decidido pelo Tribunal de Relação em 2003, acrescenta o TEDH.
Além disso, acrescenta a decisão, “as autoridades judiciais não consideraram a aplicação de medidas alternativas à prisão preventiva”.
Sob Paulo Pedroso recaíam suspeitas da prática de relações sexuais com rapazes daquela instituição pública de acolhimento de menores, tendo sido detido em 2003 e permanecido em prisão preventiva entre maio e outubro.
De acordo com a sentença do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, o Estado tem três meses para indemnizar o socialista, que era deputado e porta-voz do Partido Socialista quando foi detido no parlamento, num momento que foi captado pelos canais de televisão.
O TEDH determinou que o Estado terá de pagar a Paulo Pedroso 68.555 euros: 14 mil euros por danos materiais, 13 mil euros por danos morais e 41.555 euros relativos a despesas e custos nos tribunais nacional e europeu.
Paulo Pedroso foi detido, interrogado, constituído arguido e ficou em prisão preventiva, em 2003, indiciado de vários crimes de abuso sexual de crianças, designadamente numa casa em Elvas.
Em maio de 2004, o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decidiu não levar o dirigente socialista a julgamento, por existirem sérias dúvidas sobre a forma como Paulo Pedroso foi identificado pelas alegadas vítimas de abuso sexual, decisão que foi confirmada em 2005 pelo Tribunal da Relação.
Paulo Pedroso queixou-se então ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem pela sua detenção sem evidências relevantes da prática dos crimes que lhe foram imputados pelo Ministério Público.
Quando foi libertado da prisão, dirigiu-se imediatamente para a Assembleia da República, tendo sido recebido em apoteose pelos seus colegas de partido, num gesto que, na altura, gerou muita controvérsia.
Após ser ilibado, Paulo Pedroso anunciou a intenção de processar o Estado por erros grosseiros cometidos com a sua detenção e prisão preventiva.
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