No despacho do Tribunal Central de Instrução Criminal, a defesa alude a um artigo do Público, de 2018, tal como fez, por sua vez, o Ministério Público, e subsequente direito de resposta, garantindo que esta decisão, de pagar por alegados trabalhos a mais e maior permanência em obra, exigidos pelo consórcio, onde estava também o grupo Lena, foi “técnica e fundamentalmente discutida”, com o apoio de advogados.

Além disso, garante a equipa de defesa dos dois arguidos, foi “Rui Teixeira (administrador da EDP Produção) – e não António Mexia ou João Manso Neto – o administrador do grupo EDP responsável pela resolução de todo o diferendo espoletado pela reclamação” do agrupamento.

A defesa alegou ainda que esta decisão só foi levada ao Conselho de Administração Executivo (CAE) da EDP S.A. “porque a isso obrigam as normas de ‘governance’ em função do valor” e que os arguidos só nesta instância estiveram envolvidos, tendo o pagamento sido aprovado “por unanimidade”.

A defesa contesta ainda a alegação do Ministério Público, vertida no despacho, de que, no âmbito do concurso público internacional lançado para esta obra, em 2008, os arguidos “acertaram” a adjudicação ao consórcio, mesmo sabendo que “o custo final da obra seria muito superior ao da adjudicação”.

“Não só não se indicam os meios de prova que permitiram sustentar tal absurdo como, pior, nem se concretizam quaisquer factos que evidenciem” como é que os arguidos poderiam ter influenciado a adjudicação e o alegado custo superior, entre outros elementos, alegou a defesa, no documento integrado no despacho do Tribunal Central de Instrução Criminal, assinado pelo juiz Carlos Alexandre.

A defesa descreveu, neste âmbito, o processo de concurso da barragem do Baixo Sabor, alegando que o processo, que passou por um júri que abriu e avaliou as propostas, mostra que os arguidos “são alheios” a esta questão e que a decisão de adjudicação foi tomada pelos Conselhos de Administração “tanto da EDP Produção, como da EDP Energias de Portugal S.A. e, ademais por unanimidade”, ou seja, sem que Mexia e Manso Neto “pudessem, sozinhos, decidir ou ter alguma especial influência na decisão”.

O documento defendeu ainda o uso de duas avaliações do Crédit Suisse e do Caixa BI na avaliação da concessão do domínio público hídrico (barragens) que terá gerado um pagamento de mais de 700 milhões de euros pela elétrica, um valor abaixo do estimado pela REN.

A defesa alega que o recurso a estas entidades “foi sintomático de isenção e objetividade” no processo, citando uma decisão da Comissão Europeia, que interpretou como favorável neste caso e refutando a tese do Ministério Público de que teria interferido nas avaliações.

Aludindo a uma troca de ‘emails’ referida pelo Ministério Público, a defesa diz que se tratou de outro departamento e no âmbito de contactos com um analista do Credit Suisse e não da área da instituição responsável pela avaliação.

“É amplamente regulada a necessidade de estabelecimento das apelidadas ‘chinese walls’ entre departamentos de ‘corporate finance/assessoria financeira/área de investimento, por um lado, e os departamentos de ‘equity research’ por outro lado, dentro de entidades financeiras como o Crédit Suisse”, lê-se no documento. Estes mecanismos, sublinha a defesa, servem para prevenir “abusos de mercado e conflitos de interesse”.

O documento desmente ainda que a EDP tenha tido acesso antecipadamente a um ‘memorandum’ que teria dados sobre a avaliação, justificando que este documento foi recolhido em papel, durante as buscas à EDP e que o facto de estar “arquivado, por exemplo, após a impressão de ‘email’ não quer dizer, necessariamente, que esse documento tenha sido enviado/recebido através do ‘email’ que o parece capear” .

Ou seja, para a defesa “não há prova” de que este documento “tenha chegado à EDP em janeiro de 2007”, antes de ser publicado um diploma em Conselho de Ministros a determinar a avaliação do domínio público hídrico.

João Manso Neto a António Mexia foram suspensos, por ordem de Carlos Alexandre, no âmbito das medidas de coação, dos cargos de presidente da EDP e da EDP Renováveis, respetivamente, e obrigados a pagar pesadas cauções.

O inquérito em causa investiga os procedimentos relativos à introdução no setor elétrico nacional dos Custos para Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC), tendo António Mexia e João Manso Neto sido constituídos arguidos em junho de 2017 por suspeitas de corrupção ativa e participação económica em negócio.

O processo das rendas excessivas da EDP está há cerca de oito anos a ser investigado pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP).