Em declarações à agência Lusa, à margem da apresentação de uma iniciativa de inovação social, Clara Santos, do Observatório de Cidadania e Intervenção Social da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC), explicou que o projeto visa criar "uma mini-manufatura, uma mini-industria" de fabricação de teares e tapetes, com mão-de-obra assegurada pelos migrantes e refugiados.

"A ideia que se teve e que ainda não está totalmente operacionalizada, estamos a pensar implementá-la agora numa segunda fase, será um casamento feliz entre o ‘know-how' da região Centro, que tem a ver com este trabalho artesão [os tapetes de Almalaguês] e o ‘know-how' da população refugiada [na manufatura do produto, dado o conhecimento que trazem de países como a Síria e outros]", explicou.

Com a criação da mini-indústria, "os homens fariam os teares, que também podem ser vendidos, e as mulheres fabricam os tapetes, tendo em conta já um nicho de mercado de trabalho para o mercado internacional", adiantou Clara Santos.

O projeto, que arrancou em outubro de 2018, promovido pela associação Peaceful Parallel, localizada em Coimbra e que trabalha na área das migrações, asilo e refugiados, encontrou no Observatório de Cidadania e Intervenção Social da FPCEUC uma parceria na área da capacitação e integração dos migrantes estrangeiros.

A primeira fase envolveu um trabalho com mulheres que encontraram asilo em Portugal, na zona de Coimbra, e receberam formação "em termos de língua", tendo também sido elaborado, em conjunto, um "experimento económico e social".

"Fizeram-nos uma proposta de capacitação e o que nós tentamos perceber é que há um problema social claro: não há integração. A integração, neste momento e da forma como o Estado a prevê, só é possível pelo mercado de trabalho", argumentou Clara Santos.

Existe também "uma série de problemas paralelos" associados aos refugiados que demandam ao país: "Não falam português, não falam inglês, muitas vezes têm uma cultura muito diferente que é preciso respeitar. E então a grande ideia foi capacitar esta população nova, mas tendo em conta o desenvolvimento da região de Coimbra", assinalou.

A opção recaiu pelo conhecimento que alguns dos migrantes possuem nas técnicas tradicionais de produção de tapeçaria decorativa - "as cores, saberem tingir as cores e os desenhos, apelativos, mas muito diferentes" dos portugueses - apelando àquilo em que a população em causa "se sentiria mais à vontade".

"Por um lado, por as mulheres a trabalhar naquilo que já conhecem, podendo os homens também colaborar, fazendo eles próprios os teares. E estamos a falar de teares que são muito caros, são Património da Humanidade e estão em vias de desaparecer porque também não há investimento ", alertou Clara Santos.

A segunda fase do projeto deverá iniciar-se em agosto e decorrer durante um ano, até ao verão de 2020, e pretende envolver associações locais que, no terreno, "estão a atentar revitalizar a tapeçaria de Almalaguês" e que já foram contactadas e sensibilizadas para a iniciativa.

A produção de tapeçaria por parte de cidadãos migrantes não é, no entanto, exclusiva deste projeto, notou a responsável do Observatório de Cidadania e Intervenção Social: "Sabemos que a [multinacional sueca] Ikea, neste momento, está com um plano de negócios que tem a ver com a integração de produto elaborado pelos refugiados nas suas vendas", revelou.

Clara Santos afirma que a problemática dos refugiados "não é muito visível na cidade de Coimbra", mesmo se o município acolhe cerca de 170 pessoas, homens, mulheres e crianças, de países como a Síria, Egito, Afeganistão, Líbia, Eritreia ou Nigéria, entre outros.

"A verdade é que temos muitos e com uma agenda para recebermos muitos mais".

Ainda sobre o projeto de tapeçaria tradicional, em que está envolvida na parte de investigação e apoio, Clara Santos, que possui formação de base em serviço social e política social, sustenta que o interesse da parte dos refugiados também deriva da sua própria cultura.

"Não temos uma única cultura, temos várias. O que vem da Síria é totalmente diferente do refugiado da Eritreia. O de origem muçulmana é totalmente diferente do de origem não muçulmana. Mas ter 50 [adesões] é muito bom e eu estou apaixonada pelo projeto", declarou.

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