O primeiro-ministro, António Costa, falou esta manhã durante um debate no Parlamento Europeu, onde apresentou as prioridades da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia aos eurodeputados.
Menos de uma semana após ter acolhido a visita a Lisboa de uma delegação do colégio da Comissão Europeia, liderada pela presidente Ursula von der Leyen, na passada sexta-feira, e de também já ter recebido o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, no lançamento da presidência, no início do mês, Costa completa assim a ronda de discussões institucionais sobre o programa do semestre com o Parlamento Europeu.
Pilar Europeu dos Direitos Sociais da UE, a "melhor vacina contra as desigualdades"
Costa qualificou hoje o Pilar Social de “melhor vacina contra as desigualdades, o medo e o populismo” e defendeu que servirá para “dar confiança aos europeus” de que as mudanças atuais “são uma oportunidade”.
Adotado há três anos, o Pilar dos Direitos Sociais defende um funcionamento mais justo e eficaz dos mercados de trabalho e dos sistemas de proteção social, nomeadamente ao nível da igualdade de oportunidades, acesso ao mercado de trabalho, proteção social, cuidados de saúde, aprendizagem ao longo da vida, equilíbrio entre vida profissional e familiar e igualdade salarial entre homens e mulheres.
“Os populismos que minam as nossas democracias alimentam-se do medo. Concretizar o Pilar Social é por isso a melhor vacina contra as desigualdades, o medo, o populismo”, referiu o primeiro-ministro.
Frisando que a concretização do Pilar Social é uma prioridade da presidência portuguesa e que servirá de “base de confiança dos europeus na capacidade da Europa liderar as transições climáticas e digitais”, António Costa referiu que “não há tempo a perder” e que “é tempo de agir”.
“O desenvolvimento do Pilar Social é fundamental para dar confiança aos Europeus de que as mudanças que estamos a viver não são uma ameaça, mas podem e têm de ser uma oportunidade”, destacou o primeiro-ministro.
Nesse âmbito, o chefe do executivo referiu que a sua concretização terá lugar no que qualificou de “evento central” da presidência portuguesa – a Cimeira Social, a 7 de maio no Porto – e que irá juntar “os parceiros sociais, a sociedade civil, os presidentes das instituições e os Estados-membros”.
“O principal objetivo da Cimeira é dar um forte impulso político ao Plano de Ação, que a Comissão vai apresentar em março e que materializa a ambição expressa pelos nossos cidadãos de pôr em prática os 20 Princípios Gerais proclamados em 2017 em Gotemburgo”, frisou.
António Costa explicitou ainda que o Pilar Social servirá para “reforçar as qualificações dos cidadãos”, de maneira a que estes “sejam atores e não vítimas” da transição climática e digital, e para “investir mais na inovação” e “reforçar a competitividade” das empresas.
Tudo isto, segundo o primeiro-ministro, permitirá o “reforço da proteção social” e assegurará que “ninguém fica para trás”.
Neste sentido, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, agradeceu hoje ao primeiro-ministro português, pela sua “liderança e apoio” no pilar dos direitos sociais.
“Quero agradecer ao António pela sua liderança e apoio nesta questão”, declarou a líder do executivo comunitário, falando no Parlamento Europeu, em Bruxelas.
“Estou ansiosa para a cimeira social no Porto, em maio, onde poderemos passar uma mensagem unida juntamente com os sindicatos, associações de empresários, parceiros sociais e instituições da UE”, referiu a responsável.
Ursula von der Leyen adiantou que, em fevereiro, a Comissão Europeia irá “dar resposta a alguma das grandes tendências societais”, para depois, em março, “apresentar o plano de ação dos direitos sociais”.
A necessidade da criação de empregos
Neste campo do combate às desigualdades, os líderes das principais famílias políticas europeias pediram hoje a Portugal que se concentre na recuperação económica da União Europeia e na criação de empregos, e saudaram o foco da presidência portuguesa no desenvolvimento do Pilar Social.
“Temos de falar de empregos, empregos, empregos, temos de falar de questões económicas. Por isso, apoiamos a ideia de uma Europa social. O mais importante é que as pessoas tenham empregos, sobretudo os mais jovens: temos de evitar que haja uma nova geração perdida”, sublinhou o líder do Partido Popular Europeu (PPE), Manfred Weber.
Durante o debate com António Costa, a presidente da Aliança Progressista dos Socialistas e Democratas(S&D), Iratxe García Pérez, também referiu que a Europa aprovou “um plano de recuperação e um orçamento ambicioso”, mas que agora a questão é saber todos se os cidadãos irão ver “da mesma maneira os esforços que foram feitos”.
“A Europa é uma área de prosperidade e estamos orgulhosos do nosso modelo, mas temos de ser francos: [a pandemia] não afeta todos da mesma maneira e a diferença entre os salários mais elevados e os mais baixos aumentou no último ano, para não falar no desemprego”, referiu García Pérez.
Assim, numa altura em que a pandemia tornou as “desigualdades ainda mais evidentes”, a líder socialista pediu que seja aproveitada “a janela de oportunidade” aberta pela presidência portuguesa ao fazer do Pilar Social uma das suas prioridades, e saudou a experiência do primeiro-ministro português.
“A experiência de António Costa para fornecer a liderança necessária neste momento específico é óbvia. É a altura de cumprir”, frisou García Pérez.
Também Dacian Ciolos, líder do grupo Renew Europe, frisou que Portugal assegura a presidência numa altura em que é necessário “mudar de práticas” e fazer de 2021 “o ano do renascimento”.
“Temos de reparar o nosso tecido social e económico e sei que essa é uma das vossas prioridades. O plano de recuperação histórico tem que ser implementado o mais rapidamente possível e temos de estar prontos para fazer mais se for necessário”, salientou Ciolos.
O eurodeputado referiu ainda que, na aprovação dos planos de recuperação, há “uma responsabilidade partilhada” de assegurar que os investimentos são feitos a pensar no futuro da Europa.
“Há uma responsabilidade partilhada em nos assegurarmos que cada governo implementa as reformas e os investimentos de maneira estratégica, para que o dinheiro europeu contribua para um mundo melhor no pós-covid. Não devemos permitir que os governos utilizem este dinheiro para melhorar as suas economias sem garantir efeitos estruturais positivos e de longo prazo”, sublinhou Ciolos.
Os três líderes apelaram ainda a que Portugal avance na negociação do Pacto para as Migrações e Asilo e no processo de vacinação da UE e concordaram na necessidade de dar início à Conferência sobre o Futuro da Europa.
“Temos de agir de maneira responsável, temos de quebrar o impasse, não devemos subestimar a importância que esta conferência tem. Irá trazer-nos não apenas caras conhecidas, mas também as vozes de milhões e milhões de europeus que querem ter algo a dizer na Europa que estamos a construir”, referiu Iratxe García Pérez.
Dacian Ciolos sublinhou também que o destino “está nas mãos dos europeus” e confiou na capacidade de Portugal para ultrapassar as diferenças entre as instituições neste tema.
“O nosso destino ficará melhor definido se conseguirmos dar início à Conferência sobre o Futuro da Europa. Estou convencido que, com o trabalho conjunto entre a presidência portuguesa e o Parlamento, conseguiremos fazê-lo”, referiu.
Manfred Weber frisou ainda que os portugueses “sabem o quão importante é uma Europa unida” e “acreditam que ser Europeu não significa perder nada, mas ganhar muito”.
“Tendo em mente a história de Portugal, acho que é óbvio que Portugal olha para lá do horizonte, olha para novas coisas e não tem medo do desconhecido. É deste espírito que a Europa precisa atualmente: do espírito de um descobridor”, destacou Weber.
Os "motores das transições climática e digital"
De olhos postos no futuro, António Costa destacou também que a presidência portuguesa da União Europeia (UE) dará prioridade à retoma pós-pandemia guiada pelos “motores das transições climática e digital” e apelou à rápida ratificação dos planos nacionais de recuperação.
“Para isso temos de concluir os processos de ratificação da decisão de recursos próprios em todos os Estados-membros, de votar neste Parlamento o regulamento que foi já acordado e, finalmente, aprovar os 27 Planos Nacionais de Recuperação e Resiliência”, apelou António Costa.
E salientou: “Só venceremos esta crise no conjunto da União”.
António Costa entregou no dia 15 de outubro, em Bruxelas, o primeiro esboço do Plano de Recuperação e Resiliência à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Na semana passada, o Governo português aprovou, em Conselho de Ministros, a resolução relativa aos recursos próprios da União Europeia e requereu à Assembleia da República a ratificação do diploma com caráter de urgência.
Em causa está a decisão alcançada pelo Conselho Europeu em julho passado de um Fundo de Recuperação de 750 mil milhões para fazer face à crise gerada pela covid-19.
“Temos de pôr em execução os instrumentos de recuperação económica e social” na UE, apelou hoje o chefe de Governo.
Além do Fundo de Recuperação, esta ‘bazuca’ é constituída também pelo orçamento plurianual da União para 2021-2027, no montante global de 1,8 biliões de euros.
“Temos de iniciar a implementação dos programas do novo Quadro Financeiro Plurianual, designadamente aqueles que graças à determinação do Parlamento Europeu beneficiaram de um importante reforço, como os Programas Horizonte Europa, EU4Health, ou ERASMUS +, que tanto reforçam o espírito europeu”, disse ainda António Costa.
O responsável insistiu que, apesar da “máxima atenção que o combate à pandemia exige”, não permite que a UE “descure os [seus] desafios estratégicos”, razão pela qual “a recuperação europeia deve basear-se nos motores das transições climática e digital”.
“Estamos em emergência sanitária, mas continuamos em emergência climática”, apontou o chefe de Governo, instando à concretização do Pacto Ecológico Europeu para combate às alterações climáticas, nomeadamente através da aprovação da nova Lei do Clima a nível europeu.
“Esta é a década decisiva, que exige maior esforço e ambição, para conseguirmos cumprir o nosso compromisso de atingir a neutralidade carbónica em 2050”, apontou.
Para António Costa, “esta é também a década da Europa Digital”, pelo que a presidência portuguesa da UE irá dedicar “uma atenção particular ao novo Pacote dos Serviços Digitais, recentemente proposto pela Comissão, enquanto instrumento legislativo fundamental para a proteção dos direitos individuais e da soberania democrática, e para trazer maior concorrência ao mercado digital, estimulando o empreendedorismo e a criatividade”.
“A recuperação não se pode limitar a responder às necessidades do presente com estímulos de conjuntura, mas com investimentos e reformas que nos permitam sair da crise mais resilientes, mais verdes, mais digitais”, concluiu.
Olhar para os cidadãos — e não só para as instituições
O primeiro-ministro defendeu ainda, em Bruxelas, a realização "o mais rapidamente possível" de uma Conferência sobre o Futuro da Europa.
“Precisamos da Conferência sobre o Futuro da Europa, como fórum de debate entre os Estados-membros e com os nossos cidadãos sobre o que queremos construir juntos como União no futuro”, salientou Costa, acrescentando que esta “deve ser centrada nos anseios e angústias dos cidadãos e não nas questões das instituições”.
“Enquanto presidência do Conselho [da UE], tudo faremos para que conferência possa ser lançada o mais rapidamente possível para que a possamos poder concluir com um debate aberto e esclarecedor”, anunciou.
O futuro da Europa, defendeu, passa pela partilha de “uma casa comum e os mesmos valores”, respeitando as “diferentes visões da UE” sem renunciar à identidade nem à liberdade de cada um fazer as suas escolhas.
“O futuro da Europa não é compatível com um pensamento único, qualquer que ele seja”, defendeu António Costa, sublinhando a necessidade de se fazer “jus à divisa de uma Europa ‘Unida na diversidade’”.
Na apresentação, o primeiro-ministro defendeu que a conferência deve ainda ser “orientada para as políticas e as respostas comuns aos desafios estratégicos que temos de enfrentar num mundo cada vez menos eurocêntrico”.
No primeiro semestre de 2021, no qual Portugal preside ao Conselho da UE, o primeiro-ministro comprometeu-se a tudo fazer “para que a conferência possa ser lançada o mais rapidamente possível para que possamos ter um debate aberto e esclarecedor com uma ampla participação”.
A Conferência sobre o Futuro da Europa, um fórum de discussão que está previsto durar dois anos, deveria ter começado a 09 de maio de 2020 e prolongar-se até ao verão de 2022, mas a pandemia da covid-19 obrigou ao seu adiamento.
Além disso, até ao momento, as diferentes instituições ainda não conseguiram chegar a acordo sobre o nome do político que deverá presidir a conferência.
A Conferência visa nomeadamente abordar os desafios internos e externos com que se defronta a Europa, bem como os novos desafios societais e transnacionais que não foram previstos na íntegra aquando da adoção do Tratado de Lisboa, criando uma plataforma para discussão entre os cidadãos e as instituições europeias.
Uma Europa aberta ao mundo (e às relações com os EUA)
Abordando aquela que é a terceira prioridade do semestre – a vertente de política externa, de “uma União Europeia aberta ao mundo” -, Costa lembrou que hoje mesmo há uma mudança de administração em Washington, que espera que abra as portas a uma nova relação transatlântica com os EUA.
“Neste dia em que tomará posse o Presidente Joe Biden, não posso deixar de lhe dirigir os votos dos maiores sucessos no seu mandato e de referir a necessidade de relançarmos as relações, cada vez mais próximas, com os Estados Unidos", nomeadamente nas áreas do clima, da luta contra a covid-19, na defesa do multilateralismo, da segurança, do comércio, e também do digital, declarou o primeiro-ministro português.
No contexto da maior abertura da Europa ao mundo, Costa defende que a Europa deve procurar também, “naturalmente, continuar a reforçar, desde logo, as parcerias de vizinhança, a Leste e a Sul, e a parceria estratégica com o continente africano”, além das relações transatlânticas com o Reino Unido, os Estados Unidos e a América Latina.
O chefe de Governo deixou também uma palavra em particular para o “novo vizinho e velho aliado” Reino Unido, que deixou em definitivo a União no dia em que Portugal assumiu a sua quarta presidência do Conselho da UE, em 1 de janeiro passado.
“Atenção especial merece, obviamente, o Reino Unido, novo vizinho e velho aliado, que continuará a ser um importante parceiro para a União Europeia", disse Costa, que espera em breve o consentimento do Parlamento Europeu ao acordo de comércio e cooperação alcançado na véspera de Natal entre a UE e Londres.
Apontando que “a principal marca” da presidência portuguesa, quanto ao Indo-Pacífico, “será promover uma parceria mais próxima e estratégica entre as duas maiores democracias do Mundo, a União Europeia e a Índia”, Costa lembrou aquele que será o principal evento do semestre em termos de relações com países terceiros: “acolheremos uma cimeira UE-Índia, no Porto, em maio, centrada na cooperação em matéria do digital, comércio e investimento, produtos farmacêuticos, ciência e espaço”.
O primeiro-ministro português reiterou que a UE deve reforçar a sua autonomia estratégica apontando que, “como esta pandemia evidenciou, a Europa não pode estar totalmente dependente do fornecimento por terceiros de bens essenciais, nem de cadeias de valor tão extensas, que têm um elevado risco de interrupção”.
“Trata-se de um debate muito exigente porque implica ao mesmo tempo a política industrial, a política de concorrência e a política comercial”, admitiu, ressalvando de imediato que tal “não pode significar nem uma deriva protecionista, nem a mirífica promoção de «campeões europeus»”.
Por fim, Costa fez questão de se referir ao que classificou como “uma questão central da relação da Europa com o Mundo: as migrações”, um tema que admite não ser consensual entre os 27.
“Estamos cientes das diferentes sensibilidades existentes. Mas as migrações são uma realidade desde que existem seres humanos no planeta. E assim continuará a ser enquanto a espécie humana conseguir sobreviver. É também inegável que a sua gestão exige uma ação europeia comum. Devemos, portanto, continuar o trabalho sobre o novo Pacto para as Migrações e o Asilo, tentando encontrar o equilíbrio adequado entre as suas dimensões interna e externa, sem esquecer também a migração legal”, declarou
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