“Não temos de ser os últimos sempre em tudo. Neste caso somos os primeiros”, afirmou, em declarações à Lusa, o presidente da Câmara Municipal do Corvo, José Manuel Silva.
O Governo Regional dos Açores decidiu incluir toda a população da ilha do Corvo com mais de 16 anos na primeira fase do plano de vacinação contra a covid-19, devido às especificidades da ilha, que tem perto de 400 habitantes e um centro de saúde com apenas um médico e dois enfermeiros.
A primeira dose foi administrada a 322 pessoas nos dias 17, 18 e 24 de fevereiro, o equivalente, segundo a Secretaria Regional da Saúde dos Açores, a mais de 95% da população residente no Corvo com mais de 16 anos e a cerca 85% de toda a população da ilha.
Sem entraves colocados pelo mau tempo, tantas vezes habituais no grupo ocidental dos Açores, o segundo lote de vacinas chegou hoje ao Corvo, num avião em que seguiam também dois enfermeiros da ilha de São Miguel, que dão apoio à operação.
A maioria da população receberá a segunda dose entre hoje e quinta-feira, mas o processo só ficará concluído na quarta-feira da próxima semana com a vacinação dos últimos 16 habitantes.
“Há um ambiente de alguma festa no Corvo”, admitiu à Lusa o único médico da ilha, António Salgado.
“A partir de agora sentimo-nos seguros. Já se dizia que o Corvo era uma ilha segura, pelo seu isolamento e por um certo controlo que se foi fazendo da infeção, mas a partir de agora é uma confiança redobrada e uma sensação de segurança redobrada, quer para nós profissionais de saúde e também para a população”, acrescentou.
Desde o início da pandemia de covid-19, a ilha registou apenas um caso de infeção pelo novo coronavírus, diagnosticado, em janeiro, num rastreio realizado aos viajantes.
O utente esteve sempre assintomático e não transmitiu o vírus a outras pessoas, mas o caso contribuiu para convencer os mais indecisos a aderir à vacinação.
“Tivemos algumas resistências de início, algumas dúvidas, mas a situação foi melhorando. Houve também algum trabalho de convencimento, de esclarecimento. Penso que a própria situação da covid e o que foi acontecendo também fez perceber a importância da vacinação”, revelou António Salgado.
Para o médico era “quase impossível” conseguir uma adesão maior à que foi registada no Corvo e os números permitem garantir a tão almejada imunidade de grupo, ainda que não se saiba por quanto tempo.
“O Corvo seria um bom local para quem se interessa por essas coisas poder avaliar até que ponto é consistente esta imunidade. Estamos disponíveis para essa colaboração com quem entender que pode fazer algum estudo”, salientou.
“No final deste mês”, o Corvo deverá atingir a imunidade de grupo, acrescentou António Salgado, garantindo, contudo, que a população da ilha não vai “baixar a guarda”, embora vá “de certeza viver uma vida ainda mais normal”.
“O Corvo foi dos sítios do mundo que viu a tempestade ao longe, viu as coisas a passar à distância. Vivemos uma vida muito próxima do normal”, adiantou.
Apesar de o isolamento natural ter protegido, de certa forma, o Corvo, o médico reconheceu que havia algum “receio” e alguma “ansiedade”, sobretudo quando chegavam turistas à ilha.
“[A vacinação] pode contribuir para que o verão seja bem diferente aqui no Corvo, que é uma terra aberta a quem nos visitar e quem vier já não é olhado como um potencial portador de covid, porque, mesmo que o seja, os corvinos já têm as suas defesas”, frisou.
Também o presidente da Câmara Municipal do Corvo considerou que a vacinação trouxe “alívio” e “tranquilidade” à população, falando em “sensação de conforto”
“Não quer dizer que se elimine todas as recomendações da Autoridade de Saúde Regional, mas obviamente que é uma sensação de algum conforto e de algum alívio psicológico, tendo em conta os recursos que nós temos. Num caso mais grave de covid nós estamos a cinco, seis, sete horas de um hospital e isso causa, obviamente, alguma preocupação nas pessoas”, salientou.
Para o autarca, a vacinação de toda a população da ilha, incluindo a menos vulnerável, foi uma “boa decisão”, tendo em conta a escassez de recursos para prestação de cuidados de saúde na ilha e a distância dos hospitais.
“As pessoas, não vou dizer que estavam em pânico, mas estavam bastante preocupadas exatamente por perceber que se o vírus se alastrasse podia ser muito complicado, eu diria mesmo caótico”, disse.
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