“Infelizmente, penso que [uma quarta vaga] terá, com certeza, um impacto negativo no fluxo de vacinas para África”, afirmou John Nkengasong, em resposta a uma questão colocada pela Lusa na conferência de imprensa semanal da organização através da Internet.

“Vimos o que aconteceu na Índia. Logo que um país reconhece que se sente ameaçado pelo vírus, a tendência é colocar restrições às exportações de vacinas e outros medicamentos. Portanto, não me surpreenderia se a subida de uma quarta vaga de infeções na Europa venha a ter um impacto severo na disponibilidade dos países para redistribuírem vacinas ou para exportarem as vacinas de que dispõem”, acrescentou.

O responsável pelo organismo africano de controlo e prevenção de doenças considerou que “a situação do acesso às vacinas pelo continente é um dilema moral para todos”.

“Ouvimos promessas em todo o mundo, mas enquanto não virmos essas promessas transformadas na chegada de vacinas aos hospitais e serem inoculadas nos braços das pessoas, o problema do continente não é resolvido”, frisou Nkengasong.

“O continente foi completamente deixado para trás, não há outra forma de fizer isto. Não há vacinas. Não estamos a dizer que não temos vacinas suficientes, dizemos que não temos vacinas, ponto final”, vincou.

Apenas 1,12% da população está completamente imunizada num continente com 1,2 mil milhões de pessoas.

O responsável manifestou ainda a sua preocupação com o inverno no sul de África. “Com o frio, as pessoas tendem a ficar em casa e em ambientes fechados, onde as transmissões são muito mais elevadas”, sublinhou Nkengasong, que deixou uma mensagem de aviso às pessoas nestas regiões.

“Evitem grandes ajuntamentos”, aconselhou, pois “as pessoas relaxam nas medidas de segurança quando chegam a casa”.

O continente “está totalmente imerso numa terceira vaga”, afirmou o diretor do África CDC, apontando os casos de países como o Uganda, República Democrática do Congo (RDCongo) ou Zâmbia, onde se vivem situações “dramáticas”.

“A terceira vaga é brutal. É assustador o que estamos a assistir no continente. Não há outra forma de descrever isto”, salientou John Nkengasong.

“Claramente, estamos no meio de uma terceira vaga de infeções. Pelo menos 20 países estão completamento imersos numa terceira vaga. E o que percebemos também é que o pico desta terceira vaga é notavelmente mais elevado do que o pico da segunda. Talvez vários fatores expliquem este fenómeno, mas um deles pode ser o desta variante Delta [surgida na Índia], que está a assumir um papel muito significativo”, explicou.

O dirigente do África CDC referiu que se está “a observar o crescimento agressivo da variante Delta em relação a outras variantes, não apenas no Uganda, mas noutros países também, como a RDCongo”, onde se tornou predominante em seis semanas.

Um total de cerca de 5,2 milhões de casos de contágios de covid-19 foram reportados em todo o continente desde o início da pandemia, cerca de 3% dos casos registados em todo o mundo. O número de pessoas recuperadas, 4,6 milhões, representa cerca de 88% do total de casos de infeção reportados. O número total de mortos eleva-se a 139 mil, o que representa uma taxa de mortalidade de 2,6%.

Os cinco países que mais contribuem para o registo da pandemia no continente são a África do Sul (35% dos casos em África), Marrocos (10%), Tunísia (7%), Egito (5%) e Etiópia (5%).

Do ponto do vista das variantes com maior presença em todo o continente, um total de 55% dos Estados-membros da União Africana (UA), ou seja, 30 países, registam a presença da variante Alfa (surgida inicialmente no Reino Unido), 53% dos Estados-membros, ou 29 países, reportam a presença da variante Beta (surgida na África do Sul) e 24%, ou 13 países, reportam a presença da variante Delta, que está a expandir-se fortemente.

Um total de 61,4 milhões de vacinas foram adquiridas por 51 países membros da UA e um total de 48,6 milhões doses de vacinas foram administradas, o que corresponde a 79% do total de vacinas disponíveis em África. Estes números demonstram, segundo Nkengasong, que, “se as vacinas estiverem disponíveis, as pessoas querem tomá-las”.

“As vacinas têm que estar disponíveis de forma previsível, para que os países se possam organizar e garantir que são administradas imediatamente”, afirmou.

A cobertura da campanha de imunização em África é de 1,12% da população. Um número que diz respeito à população “totalmente imunizada, com duas doses tomadas”, sublinhou o diretor do África CDC.

Vários países não receberam ainda vacinas, como são os casos da Tanzânia, República Árabe Sarauí, Eritreia e Burundi, disse Nkengasong

No domínio das “boas notícias”, o diretor do África CDC apontou o Egito, que está a produzir uma vacina da Sino Biopharmaceutical, farmacêutica chinesa, desde o início de junho. Esta vacina tem ainda pela frente um período de testes e não estará disponível antes de, pelo menos, seis semanas.

Já o Senegal deverá começar a produzir vacinas no início de 2022, sob licença de uma farmacêutica belga. E a Organização Mundial de Saúde anunciou na terça-feira que haverá um centro de produção de vacinas na África do Sul, o que “representará um impulso nos esforços do continente para produzir as vacinas de que precisa”, disse Nkengasong.

Em relação à eficácia das vacinas na prevenção da covid-19, Nkengasong explicou que foi enviada uma equipa para as Seicheles para investigar o forte aumento de casos de infeções nesse pequeno país, não obstante ter uma taxa de imunização bastante elevada, na ordem dos 70%.

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