As táticas de desinformação utilizadas após o anúncio feito pelo Palácio de Buckingham, a dia 8 de setembro, sobre a morte de rainha, foram sobretudo velhos "truques" da desinformação, adaptados ao contexto atual, com vista a fazer circular informações falsas.

E porque é que somos tão susceptíveis a notícias falsas? "A familiaridade", com os temas "leva a um aumento da credibilidade", aponta Gordon Pennycook, cientista comportamental da Universidade de Regina, no Canadá.

Táticas bem elaboradas

Ainda a rainha estava sob supervisão médica e já se espalhava a desinformação, com contas de Twitter a suplantar os meios de comunicação social tradicionais, publicando atualizações falsas sobre o seu estado de saúde. O ritmo das 'fake news' acelerou, no entanto, após o anúncio da sua morte.

"Pessoas no mundo inteiro estavam cientes e impactadas com a morte da rainha, dando aos propagadores de desinformação uma variedade ilimitada de narrativas falsas para escolher", explica Dan Evon, da organização sem fins lucrativos News Literacy Project (NLP).

Os exemplos são diversos. Um antigo vídeo de bailarinas fora do Palácio de Buckingham circulou como uma celebração irlandesa pela morte da monarca. Já uma publicação nas redes sociais mostrava o ex-presidente americano Donald Trump, alegando que tinha sido nomeado cavaleiro pela rainha. Uma fotografia manipulada mostrava Meghan Markle vestida com uma camisa com a frase "a rainha está morta". Alguns atribuíram a morte da rainha às vacinas contra a covid-19, uma acusação que ativistas antivacinas também já haviam feito sobre a morte de artistas como Betty White ou Bob Saget. Outros culparam mesmo Hilary Clinton, alegando que a rainha anunciou, antes de morrer, que teria informações que poderiam prejudicar a ex-candidata presidencial e ex-chefe da diplomacia dos Estados Unidos. Outros líderes mundiais também receberam atribuições falsas desse tipo.

"Quando grandes eventos acontecem, pessoas em diferentes comunidades, principalmente ativistas, tentam descobrir se há um ângulo que podem explorar", explica Mike Caulfield, investigador do Centro para um Público Informado (CIP) da Universidade de Washington.

Seguidores de QAnon, uma teoria da conspiração associada à extrema-direita, vinculavam a morte da rainha uma máfia de tráfico sexual infantil. Estes apresentaram uma série de afirmações sem fundamento e relataram o evento como prova da legitimidade do movimento. Qual a ligação? "A família real, dadas as conhecidas conexões do príncipe Andrew com Jeffrey Epstein, sempre foi o assunto entre o QAnon", nota Rachel Moran, investigadora de pós-doutoramento no CIP.

Num vídeo popular na bolha QAnon, os seus seguidores afirmavam mesmo que um menino nu era visto a escapar do Palácio de Buckinham. No entanto, o vídeo divulgado no TikTok é, na verdade, um antigo vídeo publicitário para um programa de ficção na televisão.

Na semana seguinte à morte da rainha, a empresa de inteligência de media Zignal Labs rastreou mais de 76 mil menções à falecida monarca ligando-a a Epstein e à sua cúmplice, Ghislaine Maxwell, ambos condenados por agressão sexual, tanto nas redes sociais como em sites, transmissões de rádio e até nos media tradicional.

Contas feitas, foram detetadas 42 mil narrativas que vinculam a rainha com pedofilia, oito mil relacionando-a a Hillary Clinton e sete mil associadas às vacinas contra a covid-19.

Evitar a desinformação

A avalanche de notícias sobre a rainha e sua influência global explicam em parte a fixação em teorias de conspiração sobre a sua morte, explica Karen Douglas, professora de psicologia social na Universidade de Kent, que estuda o motivo de as pessoas acreditarem nestas histórias.

"Aceitar explicações mundanas para um evento de grande magnitude pode ser menos convincente ou atrativo", destaca a professora.

No entanto, há maneiras de resistir às armadilhas da informação falsa. Organizações como NLP e CIP recomendam alinhar o que é publicado na internet ou nas redes sociais com informações de fontes confiáveis antes de se partilhar com terceiros essa mesma informação.

"Até mesmo tirar alguns momentos de reflexão pode muitas vezes fazer uma grande diferença" no que toca a disseminação de informação falsa, recomenda Pennycook.

*Por Bill McCarthy/AFP