Cientistas de toda a Europa, organizados no grupo Scientist Rebellion, iniciaram no passado domingo, dia 16 de outubro, na Alemanha ações de desobediência civil contra a inação dos governos em relação às alterações climáticas, para que, dizem, os políticos os oiçam.

“A ideia é que os políticos nos oiçam. A comunidade científica, apesar de todos os avisos, tem estado silenciada. Os políticos não nos ouvem”, disse à Lusa, antes da viagem, uma das cientistas que está a participar nas ações em Berlim, a bióloga Teresa Santos.

Em declarações à Lusa minutos de viajar para a Alemanha, a cientista lamentou que os cientistas tenham de começar a fazer ações de desobediência civil, quando preferiam estar a fazer investigação e questionou: “Se não nos ouvem quando seguimos os tramites considerados normais o que havemos mais de fazer?”.

Desta pergunta saltamos para ação que salta os trâmites 'normais', neste caso, para as quatro ações que foram levadas a cabo por estes cientistas na Alemanha. Logo no domingo, 60 cientistas da Scientist Rebellion interromperam a abertura da World Health Summit, em Berlim, para exigir ações urgentes contra a emergência climática. Dois dias depois, 50 cientistas protestaram em frente ao Ministério dos Transportes e Infraestrutura Digital exigindo uma descarbonização imediata do setor de transportes. Vinte e cinco cientistas  protestaram na Volkswagen Autostadt contra a influência da empresa na política.

Já esta noite, de 19 para 20 de outubro, 15 membros da Scientist Rebellion ocuparam o centro de exposições da Porsche durante a noite ,em Wolfsburgo, e exigiram do CEO da Volkswagen que defendesse o limite de velocidade na Alemanha.

A comunidade científica, de modo geral, tem alertado nos últimos anos para o perigo das alterações climáticas provocadas pela ação humana, e alertado para a necessidade de se diminuírem as emissões de gases com efeito de estufa, que estão a provocar o aquecimento do planeta. O Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC, na sigla original), tem alertado continuamente para o problema, através de relatórios científicos.

As ações na Alemanha, que devem juntar mais de uma centena de cientistas, estão a ser organizadas pelo grupo de ação climática “Scientist Rebellion”, sob o mote “Juntos contra o Falhanço Climático”.

No anúncio das duas semanas de luta, os cientistas dizem mesmo que vão arriscar ser presos na Alemanha, apesar de as ações previstas serem não-violentas, mas vão exigir que o Governo admita que permanecer abaixo do limite de aquecimento global de 1,5ºC “é uma meta inatingível”.

O grupo “Scientist Rebellion” justifica a escolha da Alemanha por ser um dos países mais poderosos da União Europeia e um dos mais ricos do mundo, e por continuar a não cumprir as metas climáticas e de biodiversidade.

Questionada pela Lusa, Teresa Santos não revelou que ações vão ser desencadeadas, explicando que serão várias em Berlim e na próxima semana na Baviera, e que serão sempre ações de desobediência civil e não violentas.

Apesar de ser uma iniciativa de cientistas, a responsável explicou que qualquer pessoa, cientista ou não, se pode juntar às ações.

“A mensagem que queremos deixar é a de que a situação não está tão boa como se deixa passar. Estamos a fazer isto por toda a humanidade”, disse Teresa Santos, adiantando que depois da Alemanha as ações de cientistas vão decorrer em outros países, Portugal incluído.

A bióloga insiste que os governos pouco têm feito perante os “grandes avisos” dos cientistas, e lembrou um relatório deste ano do IPCC segundo o qual para que não se chegue a uma catástrofe total é preciso que não se construam mais infraestruturas fósseis.

“Nessa mesma semana foram anunciados vários projetos de infraestruturas de exploração de combustíveis fósseis”, disse, frisando que um deles envolve a Galp em Moçambique.

Em 28 de fevereiro deste ano foi lançado o último relatório do IPPC e em 9 de março foi anunciado que a produção de gás natural liquefeito na bacia do Rovuma, no norte de Moçambique, iria arrancar dentro de sete meses, numa operação que envolve diversas empresas, uma delas a portuguesa Galp (participação de 10%).

No comunicado divulgado pelo grupo “Scientist Rebellion” a bióloga Sara Gaspar, que também estará nas ações na Alemanha, afirmou que “ao admitir o fracasso climático, o governo alemão pode redefinir a sua política e o seu discurso sobre as mudanças climáticas e assim tornar-se num dos líderes mundiais nesta questão. Mas, para isso acontecer, os políticos devem ser honestos para com o público e admitir que o limite de 1,5°C de aquecimento global já não é viável”.

O grupo “Scientist Rebellion” diz que os governos dos vários países estão a quebrar o compromisso celebrado no Acordo de Paris sobre redução de emissões de gases com efeito de estufa de não olhar a meios para permanecer abaixo do limite de 1,5°C de aquecimento global.

“As emissões globais atingiram um máximo histórico em 2021, enquanto os governos gastaram mais em subsídios para as indústrias de combustíveis fósseis em 2021 do que em 2015, quando o Acordo de Paris foi assinado”, diz-se no comunicado.

*com Agência Lusa