O diretor falava perante os deputados da Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, da Assembleia da República, onde se deslocou para uma audição, realizada na sequência do requerimento apresentado pelo grupo parlamentar do PSD para ouvir o responsável sobre as razões que o levaram a anunciar que sairá em junho, e não se irá recandidatar ao cargo.

António Filipe Pimentel, acompanhado pelo diretor-adjunto, José Alberto Seabra Carvalho, recordou que fez "denúncias sucessivas sobre as limitações orçamentais e falta de recursos humanos", no museu, aos ministros da Cultura João Soares e ao seu sucessor Luís Filipe Castro Mendes, "não tendo obtido respostas aos problemas e fragilidades" do MNAA.

"A direção do MNAA tentou evitar esta decisão de sair até ao limite, mas as questões de segurança e preservação do património do museu não estão a ser asseguradas”, apontou, acrescentando que a ideia foi “muito ponderada”, em conjunto com o diretor-adjunto, José Alberto Seabra Carvalho, historiador de arte de 66 anos, que irá aposentar-se este ano.

Quanto à proposta do novo regime jurídico de autonomia de gestão de museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos, que a atual tutela pretende aplicar ainda este ano, o diretor considerou que, a ser efetivada, irá confrontar os diretores "com um contrato-programa de cinco anos, sem condições para o cumprir".

"Não há uma autonomia sem financiamento e recursos humanos", sublinhou, perante os deputados.

No início de janeiro, António Filipe Pimentel anunciou que sairá em junho, no final da sua comissão de serviço, "por falta de condições" para trabalhar numa instituição que "está no limite das forças", decisão que já comunicou à ministra da Cultura, Graça Fonseca.

Queixou-se de falta de recursos humanos, numa "pressão constante", que tem obrigado ao encerramento temporário de várias salas do museu ao longo dos anos, e de uma filosofia da tutela que apoie o MNAA.

O trabalho de António Filipe Pimentel, de 59 anos, na liderança do MNAA, desde 2010, incluiu o lançamento inédito de campanhas públicas para a angariação de fundos para adquirir novas obras para o museu, a renovação de várias galerias, nomeadamente de têxteis, pintura e escultura portuguesas, e a realização de parcerias com privados para a realização de exposições internacionais.

António Filipe Pimentel também tem sido um dos vários diretores críticos da proposta de decreto-lei que o Governo está a preparar sobre o novo regime jurídico de autonomia de gestão dos museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos.

Sobre esta matéria, o responsável considerou que a proposta de lei "trata igual o que é diferente": "Embora a falta de recursos seja transversal a todos, o projeto mistura museus, monumentos e sítios arqueológicos, que são unidades orgânicas muito diferentes, e também de escalas muito diversas, que, embora tenham uma mesma dignidade intrínseca, têm necessidades distintas".

"Estamos a trabalhar no fio da navalha", reiterou Luís Filipe Pimentel, voltando a alertar os deputados para as condições de segurança do acervo do museu e da necessidade de reforçar os seus meios.

Criado em 1884, o MNAA é um dos museus com maior número de obras classificadas como tesouros nacionais, e é um dos mais importantes museus públicos devido ao seu espólio dentro do património histórico do país.

Na audição, o deputado José Carlos Barros, do PSD, criticou a proposta de autonomia da tutela, considerando que foi "criada em segredo", enquanto a deputada Carla Sousa, do PS, apontou que os problemas do MNAA "são os mesmos com que se deparam os outros museus", e remeteu as responsabilidades das atuais carências para os anteriores governos do PSD, elogiando a iniciativa do atual Governo em "construir um novo regime jurídico de autonomia".

Na terça-feira, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, garantiu, na mesma comissão, que o regime de autonomia que a tutela pretende aplicar este ano a museus, monumentos e sítios, irá contemplar "o reconhecimento da sua identidade fiscal própria".

A autonomia proposta "apoia-se na equiparação a personalidade coletiva destas estruturas e, por essa via, ao reconhecimento da sua identidade fiscal própria na diversidade da DGPC" (Direção-Geral do Património Cultural), uma medida que vai ao encontro das reivindicações dos diretores destas entidades.

Perante os deputados, a ministra disse que, no início de janeiro, numa reunião com os diretores de museus e monumentos, anunciou que "o NIF [Número de Identificação Fiscal] estava garantido, embora não seja esta a maior das preocupações" para o setor.

Na Assembleia da República, a ministra Graça Fonseca disse que "a obtenção do número de identificação fiscal, que em 2013 o anterior governo retirou aos museus, é o garante da devolução a quem sabe melhor as necessidades de cada museu, assegurando a responsabilidade partilhada e o comprometimento com os objetivos estratégicos definidos pela tutela".

Questionado pelos deputados sobre esta matéria, o responsável respondeu: "O museu usa o NIF do Grupo de Amigos do Museu Nacional de Arte Antiga, sem o apoio do qual não teríamos a possibilidade de abrir ao público", mas ressalvou que os seus meios não resolvem os problemas mais graves que são os recursos humanos, sem os quais a entidade não pode funcionar.

O novo regime jurídico de autonomia de gestão dos museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos deverá abranger as 30 designadas unidades orgânicas tuteladas pela DGPC e pelas Direções Regionais de Cultura (DRC).

A proposta de diploma foi apresentada em junho aos diretores de museus e entidades representativas e, entre os objetivos, constam a delegação de competências nos diretores dos museus, a redução da burocracia e o maior acesso aos recursos próprios gerados.

De acordo com a proposta de diploma, a que a agência Lusa teve acesso, na altura, preconizam-se várias alterações, nomeadamente a abertura de concursos para diretores de âmbito internacional, e não apenas nacional, para comissões de serviço de cinco anos, com a limitação máxima de dez anos, alterando o regime atual de três anos, sem limite de renovação, feita através da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública.

O ponto essencial do novo regime é a delegação de competências nos diretores das designadas "unidades orgânicas", que será muito mais alargada, através da celebração de um contrato-programa a cinco anos que os poderá autorizar a assinar despesas de aquisição de bens e serviços, pequenas empreitadas e contratações temporárias, mas o limite do valor terá de ser negociado para ser autorizado.

A proposta de diploma tem como objetivos "que o património cultural beneficie de uma maior autonomia de gestão para concretização de projetos que importem mais-valias para a cultura, o património, a economia e o turismo, fomentando-se o estabelecimento de parcerias entre museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos com outras entidades, públicas e privadas, e com a sociedade civil, valorizando o seu papel enquanto instituições com ligações estreitas ao território e às comunidades onde se inserem".