Na manhã desta terça-feira, a Polícia Judiciária (PJ) anunciou a realização de buscas em Lisboa, Funchal e Sesimbra. Em causa estava "um grupo económico" que terá lesado vários bancos, por suspeita de administração danosa, burla qualificada, fraude fiscal e branqueamento.
No total aconteceram 22 buscas domiciliárias, 25 não domiciliárias, três buscas numa instituição bancária e uma num escritório de advocacia e nelas participaram 138 investigadores da PJ, 26 da Autoridade Tributária, nove profissionais do Ministério Público e sete do Juízo de Instrução Criminal.
Segundo a PJ, este grupo contratou, entre 2006 e 2009, "quatro operações de financiamentos com a Caixa Geral de Depósitos, no valor de cerca de 439 milhões de euros" e terá causado "um prejuízo de quase mil milhões de euros" à Caixa, ao Novo Banco e ao BCP. Desta forma, os investigadores procuram indícios de "atos passíveis de responsabilidade criminal e dissipação de património".
Posteriormente, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) informou que dirige a investigação à Caixa Geral de Depósitos, lamentando que a investigação não tivesse a "celeridade desejável, apenas por carência de meios técnicos e outros ajustados à natureza, dimensão e complexidade da investigação".
Esta podia ser apenas mais uma notícia das tantas operações feitas pelas autoridades, mas trazia um nome bem conhecido entre os detidos: o empresário e colecionador de arte Joe Berardo, bem como o seu advogado André Luís Gomes.
Tendo começado a vida de negócios na África do Sul, Berardo envolveu-se em investimentos empresariais e bolsistas mais alargados em 1980, tendo posteriormente passado para a banca: participou na 'guerra' acionista no BCP — chegando a ser presidente da Comissão de Remunerações do banco — e contraiu empréstimos avultados (que vieram a resultar na detenção de hoje) junto da Caixa Geral de Depósitos, precisamente para comprar ações do BCP.
No comunicado da PJ, relativo à detenção, são referidas as quatro operações de financiamento que foram objeto de análise pelos deputados durante a II Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco, em maio de 2019, que levou o empresário ao parlamento. E daí surgiu uma das frases mais recordadas do momento: "Pessoalmente não tenho dívidas. Claro que não tenho dívidas".
Hoje, a notícia da detenção causou várias reações, entre elas:
- A dirigente do BE, Mariana Mortágua, afirmou esperar que seja feita justiça em relação a devedores aos bancos como Joe Berardo "expostos nas comissões de inquérito" que cometeram ações "muitas delas de caráter fraudulento";
- O Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV) pediu "que seja feita justiça", a propósito da detenção do empresário Joe Berardo e do advogado André Luís Gomes, já que "quem pratica crimes deve ser condenado por isso";
- A deputada Cecília Meireles, do CDS-PP, considerou "uma boa notícia" ver "a justiça a funcionar", mas recusou comentar "os contornos do caso" em concreto;
- O presidente do Chega, André Ventura, considerou que a detenção do empresário mostra que "ninguém é intocável" e disse esperar que "a justiça seja célere" e que este processo "não se arraste";
- A Iniciativa Liberal recebeu "sem surpresa" a notícia da detenção de Berardo, considerando que o empresário "fez parte de um esquema orquestrado" a partir das "mais altas esferas do poder político", com a "complacência dos reguladores".
Sobre o colecionador de arte, sabe-se que "está muito sereno e muito calmo", de acordo com as declarações do advogado Paulo Saragoça da Matta aos jornalistas, que aproveitou o momento para criticar o sucedido: "acho sempre curiosas estas investigações que duram 5 ou 6 anos e só depois é que alguém se lembra de haver uma detenção", disse.
Quanto ao processo, mais novidades apenas amanhã, dia em que o empresário madeirense vai ser interrogado pelo juiz de instrução criminal Carlos Alexandre. Até lá, diz a Rádio Renascença, há uma noite a ser passada numa cela da Polícia Judiciária.
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