Marta Garcez, Ângela Mendes, Marta Araújo, Filipa Pereira e Tânia Rato têm as suas profissões, três delas são mães, uma tem “dois filhos” de quatro patas. Há três anos, uma comunidade motociclista feminina internacional —  The Litas —  juntou-as, muito provavelmente, para a vida, depois de um encontro feito com o propósito de estenderem um braço em Portugal.

Apressaram-se a tirar a carta (exigível acima dos 125 cc de cilindrada), começaram a andar de mota e fizeram uma viagem juntas, há alguns meses, a Marrocos. Hoje, 25 de novembro, partem novamente lado a lado, desta vez para Cuba. São as Dust Girls, um nome de batismo que surgiu de “uma brincadeira".

"Foi por sermos só mulheres, gostarmos de aventuras sobre duas rodas e, na prática, pelo desejo de fazermos uma viagem”, explicou ao SAPO24, Marta Garcez, mentora do grupo e jornalista “de brincadeira”, antes de embarcar para uma aventura de “1500 quilómetros e oito dias” na ilha caribenha.

A “paixão” pelas motas, conforme resumiu Filipa Pereira, Pipa, doravante, foi o denominador comum e o que mexeu com estas cinco mulheres. “Se tivesse oportunidade andava todos os dias de mota. É uma sensação que se descreve como liberdade, mas que na realidade só quem anda é que sabe o quão bom é circular ao ar livre e passar pelos carros”, descreveu a benjamim do grupo, de 36 anos.

A vivência motard não é assim tão longa quanto esta vontade voraz de andar de cabelo ao vento, à partida, transparece.

“Tinha uma scooter (50 cc), em miúda. Há três anos peguei numa 125 cc, e tirei a carta de mota (acima de 125) há um ano”, resumiu Marta Garcez. A outra Marta, Araújo, 37, produtora que integra este agregado de cinco mulheres, imitou-a ao ficar encartada pela mesma altura, embora já antes tivesse acelerado “numa 125”. Tânia Moreira Rato, proprietária de uma loja em Sintra e nova nestas andanças, calcorreou os mesmos passos e ficou com o cartão mágico antes de terem saído para o norte de África. “Por volta dos meus 20 anos conduzi durante cinco anos e depois estive 23 sem conduzir”, contou Ângela Mendes, Jimi, como é conhecida a motard sénior do grupo (50), que voltou a sentir “há dois anos” a sensação de ter uma máquina nas mãos. A Pipa, embora tivesse carta, esteve anos sem comprar uma mota. “Comprei uma Harley e agora não a largo”, garantiu esta consultora SAP.

24 de abril, destino: Marrocos

Feitas as apresentações e o curriculum motard, 24 de abril marcou o início da viagem a Marrocos que lhes viria transformar a cabeça. Lisboa-Zagora-Lisboa. Mais de 3500 quilómetros, em 12 dias e 11 noites, uma viagem da qual resultou uma amizade que não se explica, mas sente-se. “Senti-me angustiada quando regressámos a Lisboa”, recorda Ângela Mendes.

Além da amizades feitas, nesta primeira incursão enquanto Dust Girls ganharam uma nova visão para as suas vidas e um espírito de missão que assumem desde então. “Queremos inspirar pessoas que tenham algumas dúvidas e receios [sobre andar de mota]”, apontou Marta Araújo. “Vemos pessoas a andar de mota quando já não andavam há muitos anos, ou [pessoas] que começaram a andar [agora] e já foram a Marrocos e seguiram o nosso percurso”, atirou em tom de satisfação.

Uma incursão que recordam com brilho nos olhos. Sem guião, o fotógrafo Manuel Portugal registou para a posteridade este caminho até à liberdade, um documentário exibido no Lisbon Motorcycle Film Festival.

A viagem mais não foi do que a realização de um sonho, “uma aventura sobre duas rodas”, resumem. O “fazer” levou de vencido o “gostaria de ter feito” e permitiu chegarem à conclusão “que nós também conseguimos”, destacou Marta Garcez.

Durante a viagem a Marrocos, por serem mulheres e viajarem sozinhas, os avisos foram mais do que muitos. “Diziam para metermos o cabelo dentro do capacete e andarmos juntas”, exemplificou Tânia Moreira Rato, realçando porém que foram “muito bem-recebidas” por onde andaram.

“Recordo-me de estarmos num hotel e ver a Pipa, com tatuagens e biquini, na piscina ao lado de uma miúda muçulmana toda vestida”, recuperou Marta Araújo, uma imagem que serviu para derrubar mitos e ilustrar a sã convivência entre os dois mundos que por vezes parecem tão distantes.

créditos: Paulo Rascão | MadreMedia

25 de novembro, destino: Cuba

Apesar de serem um grupo de cinco mulheres, a sua influência estende-se a mulheres e homens. Tânia, responsável pelo merchandising, disse que eles também “compram” e “vestem” as t-shirts.

“Mandam mensagens a dizer que nós as inspiramos. Mas não só mulheres, também homens”, reforçou Marta Garcez.

Hoje, 25 de novembro, partem para Cuba.

Do ponto de vista das curiosidades, não deixam de sinalizar a partida para Marrocos a 24 de abril, véspera do Dia da Liberdade, e a saída para Cuba, hoje, a 25 de novembro.

Vão andar por Havana, Cinfuegos, património mundial da Unesco e Santa Clara, a cidade de Che Guevara.

A partida para este pedaço de terra no mar das Caraíbas exigiu menos logística por estarem a convite de uma operadora turística portuguesa que atua naquele país. “Não sabemos as motas que iremos usar”, explicou Jimi. “Arrancamos os cabelos e decidimos depois”, disse, soltando em seguida uma gargalhada. “Não tinha a mesma piada termos todas as mesmas”, notou Marta Garcez.

A Pipa, gestora das redes sociais das Dust Girls, cabe divulgar esta nova aventura no Instagram e no Facebook. “O que me move é partilhar, não é a fama. Essa é virtual”, rematou.

E depois de Cuba? O passo seguinte já está presente na mente de quem ainda nem sequer voltou. “Tem que ser maior que o anterior, embora os nossos bolsos não permitem uma viagem tão grande de seguida”, antecipou Marta Garcez.

“Passos intermédios”, interrompeu, refreando, Marta Araújo.

“Passo temporadas fora de Lisboa, em filmagens, a Jimi viaja para fora de Portugal, temos trabalho, tenho cães e não tenho filhos, tal como a Tânia. As outras têm filhos. E todas temos família e amigos”, justificou. “Temos vidas diferentes, mas tentamos estar sempre que possível. E falamos todos os dias”, contou Tânia Moreira Rato.

“Isto não é um projeto profissional. Tem uma vertente [profissional] forte, porque é impossível que não tenha, mas não nasceu assim, nem é. É literalmente pessoal e une-nos a todas de uma forma que não esperei no início”, sublinhou Marta Garcez. “Não tínhamos feito uma viagem as cinco se não nos déssemos [bem]”, reforçou. E é essa amizade e vontade de inspirar outros que subjaz à segunda viagem conjunta feita debaixo da bandeira Dust Girls.

Por fim, a solo, desafiamos cada uma a partilhar a sua viagem de sonho, ainda por concretizar. A “Índia” une Marta Garcez e Tânia, a “Nova Zelândia” chama por Marta Araújo, a “América Latina” cativa Jimi e Pipa quer ir da “Cidade do Cabo a Maputo”.