“Não quero acreditar que o senhor ministro da Energia [Jorge Moreira da Silva] queira deixar para o seu sucessor o ato administrativo (despacho) que o senhor secretário de Estado da Energia [Artur Trindade] considera de acordo com […] os compromissos assumidos”, lê-se na carta de 14 de outubro de 2015, que dirigiu ao “senhor primeiro-ministro e caro amigo”.
A carta, a que a agência Lusa teve acesso e que consta da documentação da comissão parlamentar de inquérito ao pagamento de rendas excessivas aos produtores de eletricidade, foi escrita por Eduardo Catroga – com indicação de ser uma missiva ‘Pessoal’ – quando o executivo PSD/CDS-PP, liderado por Passos Coelho, se encontrava em gestão, após as eleições legislativas de 05 de outubro desse ano.
No entanto, quando a referida carta é escrita, Artur Trindade já tinha assinado o despacho, em 03 de outubro, que só viria a ser publicado em Diário da República em 15 de outubro, um dia depois de o ex-presidente do Conselho Geral e de Supervisão da EDP e ex-ministro das Finanças do PSD ter escrito ao chefe do executivo.
“O seu chefe de gabinete e o assessor Rudolfo [Rebelo] têm todos os documentos. Também enviei o parecer junto que ‘desmonta’ o falso argumento que a impossibilidade deriva do Governo estar em gestão”, refere ainda Eduardo Catroga.
Contactado pela agência Lusa, Eduardo Catroga disse apenas não ter presente nem a referida carta, nem o seu conteúdo, sem fazer quaisquer comentários.
No parecer de 13 de outubro, assinado por Miguel Nogueira de Brito, da sociedade de advogados Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, lê-se que a EDP solicitou “uma informação sucinta sobre a questão de saber se se inclui no âmbito dos poderes de um governo em gestão a consideração do valor da contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) na determinação do valor da revisibilidade anual respeitante a 2014 do montante inicial dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC).
Segundo o advogado, esta decisão não excede “os limites dos poderes dos governos de gestão”.
“De resto, o exercício da competência em causa, através da prática do ato de homologação da revisibilidade dos CMEC de 2014, não pode deixar de ocorrer, nos termos da citada disposição do decreto-lei 240/2004, de 27 de dezembro, durante o ano em curso”, concretiza.
O parecer vai ainda mais longe quando avisa que, não refletir os custos com a CESE no cálculo do CMEC, “configuraria uma clara violação das mencionadas disposições legais, pondo ainda em causa a credibilidade da EDP perante o mercado, apesar de ter sempre agido no estrito cumprimento da legislação aplicada”.
Entretanto, em outubro do ano passado, o atual Governo anulou parte deste despacho assinado pelo anterior executivo, em véspera de legislativas, que permite à EDP e à Endesa repercutirem a tarifa social e a CESE na conta da eletricidade, decisão que está a ser contestada na Justiça pelas duas empresas.
Eduardo Catroga deixou de presidir, em maio passado, ao Conselho Geral e de Supervisão (CGS) da EDP, órgão onde estão representados os acionistas da elétrica, tendo sido substituído pelo ex-ministro de governos socialistas Luís Amado.
Eduardo Catroga continua no CGS da EDP até 2020, por convite do maior acionista da elétrica, a China Three Gorges (CTG).
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