Alice Gato, porta-voz do movimento estudantil "Fim ao Fóssil: Ocupa!", adianta ao SAPO24 que "este momento, há cerca de 70 alunos a fechar todas as entradas para a escola artística António Arroio", sendo que as ocupações duram desde 7 de novembro.
Ao início da manhã, os portões da escola foram fechados e dezenas de estudantes barricaram-se no interior, com algumas ativistas coladas à porta da entrada principal, impedindo que alguém por ali entrasse.
Se por um lado há estudantes a nível térreo "a impedir a entrada na escola", encontrando-se "colados às paredes e a bloquear a entrada de qualquer estudante", por outro há "uma dezena de alunos no telhado", barricados e a empunhar faixas de protesto.
Estes alunos, adianta Alice Gato, "foram trancados no telhado pela direção" e "já não conseguem sair de lá", sendo que as vias de diálogo com o conselho diretivo da escola são inexistentes nesta fase.
"A direção trancou as pessoas que estavam a ocupar. Cortou água às activistas e retirou um telemóvel de uma ativista", lê-se numa mensagem enviada às 10:30 no canal de Telegram criado a propósito desta iniciativa.
Perante a possibilidade da atuação das forças de segurança para acabar com o bloqueio, a porta-voz do movimento diz que têm passado carros da polícia pelo local, mas que "não houve nenhuma atuação".
"Os estudantes lá dentro estão preparados para resistir pacificamente quanto a quaisquer forças de segurança, privadas ou públicas", ressalva, mencionando ainda que em frente ao gradeamento da escola António Arroio encontram-se "cerca de 300 alunos e professores à porta a apoiar o que está a acontecer".
“Neste momento, (os alunos) perceberam que não estavam a ser ouvidos e decidiram fechar a escola. Porquê estarmos a ter aulas por um futuro que não vai existir se estas reivindicações não estão a ser ouvidas?”, questionou Alice Gato, para justificar a ação, à Agência Lusa.
Junto ao portão da escola, Matilde Santos, aluna da António Arroio, confirmou as motivações dos ativistas: “A manifestação tinha de escalar, porque não estávamos a ser ouvidos por todos, muito menos por alguns professores. Assim temos a certeza de que somos ouvidos”.
Direção entende protestos, mas considera que foram passadas linhas vermelhas
Entretanto, o diretor da escola, Rui Madeira, fez saber que não pretende chamar as autoridades por entender que "não vão ser necessárias". "Vamos tentar viver isto de forma o mais tranquila possível, e também para que eles alunos percebam que nunca estaremos contra estudantes que querem um mundo melhor", disse aos jornalistas no local.
Rui Madeira esclareceu ainda que a António Arroio não fechou, mas não está com atividades letivas por falta de condições, e que a direção não é "conivente" com as ações dos alunos nem incentivou aos protestos.
"É lógico que não podemos ser coniventes porque temos um papel institucional a cumprir. Mas há uma coisa que é verdade, é que daqui tem de se tirar uma aprendizagem, mesmo não havendo aulas", sublinhou, realçando ainda que muitos dos alunos não estão a tomar parte do protesto porque não concordam com os meios, apesar de concordarem com a mensagem. Por outro lado, não quer escalar qualquer tipo de conflito para não "degradar as relações sociais dentro da escola".
No entanto, Rui Madeira considerou-se surpreendido porque foi assumido um "compromisso de honra com os alunos em que eles não ultrapassavam linhas vermelhas". "Essas linhas, ao terem sido ultrapassadas, é lógico que a minha atitude terá de ser outra", disse, enquanto "autoridade da escola", considerando que essas "linhas vermelhas" consistem em "afetar a liberdade dos outros".
O diretor da António Arroio fez saber que está em constante contacto tanto com os encarregados de educação — que estão ao corrente da situação, afirma — como com o Ministério da Educação, e que recusou determinados pedidos dos alunos em protesto, com a justificação de faltas às aulas. "É impossível justificar faltas numa greve. Se estão em luta e faltam às aulas, essas faltas não serão justificadas", avisou.
O dirigente da António Arroio deixou ainda uma crítica ao acompanhamento por parte dos meios de comunicação social quanto aos temas da agenda climática, lamentando que os alunos não se envolvam em fóruns de participação, como as assembleias municipais, por saberem que estas têm pouca repercussão mediática.
"Se estes alunos tivessem ido às assembleias municipais, as televisões e os meios deviam acompanhá-los, para se perceber o que se pode fazer dentro daquilo que são as regras da democracia. Mas não, eles sabem que só havendo alguma luta, barulho e confusão é que a comunicação social surge, e aqui estamos hoje", afirmou.
"Vocês, enquanto comunicação social, dão-lhes os minutos de fama. Deixou de haver uma luta de classes e passou a haver uma luta de audiências. Eles sabem perfeitamente disso", atirou.
Ação afeta seis estabelecimentos de ensino em Lisboa
Iniciado a 7 de novembro, o movimento previa ações nas escolas secundárias Liceu Camões e António Arroio, bem como nas Faculdades de Letras e de Ciências da Universidade de Lisboa (FLUL e FCUL), no Instituto Superior Técnico (IST) e na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (FCSH-UNL) da Avenida de Berna.
A iniciativa faz parte do movimento internacional “End Fossil Occupy!” que desde o início do semestre foi responsável pela ocupação de escolas nos Estados Unidos e na Alemanha e que tem como objetivo apelar ao fim da utilização de combustíveis fósseis.
Quanto às outras ações a ter lugar nos estabelecimentos de ensino acima mencionados, Alice Gato ressalva que apenas está a haver uma situação de bloqueio na escola António Arroio, sendo que "as restantes ocupações estão relativamente tranquilas".
Os pontos de maior tensão encontram-se no IST, onde "o que era uma ocupação 'super calma', onde se estava a promover um programa de transição justa que o Técnico já deveria estar a fazer" resultou num pré-aviso de despejo por parte da direção, na FLUL e na FCUL.
Se na FLUL, tem "havido muitas tensões com a direção e os seguranças", mas os estudantes "têm conseguido aguentar-se", na FCUL foi pedido aos estudantes para darem nota de quando se retirariam, mas "a direção acabou de ceder, por enquanto".
Quanto às outras, Alice Gato disse que na FCSH-UNL, está a ser ocupado o "o átrio da Torre B, o ponto de acesso principal por onde todos os estudantes, para irem às suas aulas, têm de passar". Assim, são confrontados "pela crise climática e pelas nossas reivindicações", adianta.
Já no que toca ao Liceu Camões, "estão muitos alunos, mas nestes dois dias estão em período de avaliações intercalares". "Vão ficar lá durante o fim de semana", mas os protestos só "voltam em força" para a semana, já que "a parte de criar disrupção no funcionamento normal da sociedade vai regressar quando as aulas também estiverem de volta".
A motivação para estas ações, como já foi descrito, é pelo fim da utilização de combustíveis fósseis, mas as reivindicações a nível nacional são mais específicas, explica Alice Gato. Se por um lado, exige-se que "o Governo declare o fim aos combustíveis fósseis até 2030 através de um plano que não possa ser revogado nem por este executivo nem por outros vindouros", por outro, pede-se a "demissão imediata do ministro da Economia e do Mar, António Costa e Silva".
De acordo com a porta-voz, a oposição a Costa e Silva não é apenas "pelo que fez no passado" enquanto ex-CEO da petrolífera Partex — sendo responsabilizado por opor-se ao cancelamento das prospeções de gás na Bajouca, em Aljubarrota, mas também por "neste momento, enquanto ministro, continuar a defender o interesse das petrolíferas e de 'furar o nosso futuro'".
“A ideia é ocuparmos até vencermos ou até sermos retirados”, concluiu Alice Gato
No sábado, os estudantes vão também participar na marcha pelo clima, organizada pela coligação “Unir Contra o Fracasso Climático”.
[Notícia atualizada às 15:21 — atualiza com declarações e informações obtidas pela Agência Lusa]
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