A ideia partiu de Miguel Ricou, presidente da comissão de ética da Ordem dos Psicólogos e professor na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, para quem o suicídio assistido não está devidamente estudado em todas as suas vertentes, e as opiniões se dividem entre os que defendem a autonomia de cada um e os que marcam linhas vermelhas em torno do valor da vida.
“Comecei à procura, a tentar ler sobre o assunto e estruturar um artigo de fundo, e fui percebendo que havia uma falta enorme de informação, investigação e até preocupação sobre isto”, relatou à Lusa, indicando que, numa análise com um colega inglês de estudos recentes sobre psicologia e eutanásia, só encontrou 14 artigos publicados no mundo.
Para Miguel Ricou, é não só “assustador”, mas também “estranho”, que se queiram tomar decisões sobre “algo tão definitivo, como a morte”, e não haja preocupação em “estudar e encontrar formas de avaliar o pedido destas pessoas, para perceber se representa o que elas pensam e o que será melhor para elas”.
Reunindo 15 especialistas – incluindo psicólogos, médicos, advogados e especialistas em cuidados paliativos – a nova plataforma não tem como finalidade “influenciar o poder político e as agendas, mas sim dizer que não se sabe o suficiente sobre o assunto, não se estudou e isso é importante, estudar o máximo para se legislar em conformidade”.
Nesse sentido, a investigação da plataforma terá especial incidência em quatro dimensões: o processo de tomada de decisão, a consistência e o seu tempo, o impacto da posição da família do doente e o peso dos cuidados paliativos.
“Será que, tal como acontece no suicídio, a maioria das pessoas que pede para morrer muda de ideias? Quanto tempo será legítimo esperar para perceber se a pessoa pode mudar de ideias? Será diferente em doentes terminais e doentes com outras condições não terminais? Em que sentido?”, perguntam os especialistas da plataforma que se irá dedicar a estudar para responder a estas e outras questões em torno da eutanásia.
Para os especialistas, falta também, e no que concerne às repercussões sociais da decisão, saber até que ponto para a família estas decisões têm impactos positivos ou negativos, especialmente nos casos em que as pessoas pedem para morrer, porque sentem que são um fardo para os familiares.
“Não temos estas dimensões estudadas. É assustador perceber que toda a gente fala sobre o assunto, toda a gente tem opinião sobre o assunto, mas ninguém se preocupou em estudá-lo”, criticou Miguel Ricou, sublinhando a necessidade de encontrar soluções legislativas “que permitam dar resposta às pessoas que não têm alternativa, mas que evitem essa mesma resposta a quem se apercebe que é melhor ficar vivo”.
Segundo o especialista, também membro do Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde (CINTESIS), atualmente, em Portugal, é preciso estar ciente de que “há pessoas que queriam morrer, estão a sofrer e não vão ter essa oportunidade e vão continuar a sofrer”.
Simultaneamente, falta “perceber se, quando as pessoas tomam decisões sobre isso, estão cientes da decisão que estão a tomar” para que, no futuro, se diminua ao máximo o número de doentes que morrem e não queriam, apesar de terem pedido.
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