A advogada Autumn Scardina ligou para a pastelaria em junho de 2017 para encomendar um bolo de aniversário azul por fora e cor-de-rosa no interior. Na ocasião, Scardina explicou que o bolo visava celebrar não apenas o seu aniversário mas também o aniversário da sua mudança de sexo.

A pastelaria Masterpiece acabou por declinar o pedido, com base em argumentos religiosos. "Phillips recusou criar o bolo azul e rosa porque este visava celebrar mensagens contrárias à sua convicção religiosa que de o sexo - ser mulher ou homem - é atribuído por Deus, é determinado biologicamente, e não por perceções ou sentimentos, e não pode ser escolhido ou alterado".

Um ano depois, a 28 de junho de 2018, a Comissão de Direitos Civis do Colorado determinou que Phillips discriminou Scardina com base na sua identidade de género. Em resposta, o pasteleiro avançou esta terça-feira, 14 de agosto, com uma ação federal contra o estado do Colorado, alegando discriminação religiosa.

Esta deliberação da Comissão de Direitos Civis do Colorado teve lugar dias depois de o Supremo Tribunal de Justiça ter decidido, a 4 de junho, a favor de Jack Phillips, quando este se recusou a criar um bolo de casamento para um casal gay. A decisão não foi unânime e contou com 7 votos a favor e 2 contra.

À data, evitando abrir um precedente, o Supremo Tribunal não tratou amplamente o assunto, limitando-se apenas a constatar que Phillips não beneficiou da neutralidade necessária nas instâncias inferiores (comissão de direitos civis e tribunais estaduais) para expor seus argumentos.

Mais especificamente, o tribunal considerou que a Comissão de Direitos Civis do Colorado — que numa fase inicial deliberou também contra o pasteleiro — mostrou uma hostilidade inadmissível contra a religião quando descobriu que Jack Phillips violou a lei antidiscriminação ao recusar-se a prestar um serviço ao casal gay David Mullins e Charlie Craig, em 2012.

O que está em causa: Se por um lado a lei estadual impede que as empresas recusem o serviço com base em raça, sexo, estado civil ou orientação sexual; por outro lado o pasteleiro argumentou que a sua fé cristã o impediu de aceder ao pedido — porque não iria utilizar os seus dotes para veicular uma mensagem em que não acredita — e os seus advogados argumentaram que não se trata de um bolo comum, mas de casamento, pelo que tem uma mensagem subjacente.

Apesar de deliberar a favor do pasteleiro, o tribunal reafirmou à data a proteção dos direitos das pessoas homossexuais. "O resultado de casos como este em outras circunstâncias deve aguardar uma maior elaboração dos tribunais", considerou, acrescentando que estas disputas "devem ser resolvidas com tolerância, sem desrespeito por crenças religiosas sinceras e sem sujeitar pessoas homossexuais a indignidades quando procuram bens e serviços no mercado livre".

Assim, o tribunal concluiu que a Comissão violou os direitos religiosos de Phillips no âmbito da Primeira Emenda da Constituição, onde está consagrada a liberdade de expressão — escusando-se desta forma a deliberar sobre em que situações podem as empresas estar isentas das leis antidiscriminação. O organismo evitou ainda ser claro sobre se a criação um bolo um bolo é um ato de expressão protegido pela garantia da liberdade de expressão prevista na Constituição.

Desta forma, e procurando não abrir um precedente, o Supremo Tribunal perdeu a oportunidade de defender de forma clara os direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, ou de explicar até onde os Governos podem ir quando se trata de regular um negócio cuja atividade possa estar ligada a princípios religiosos.

Agora, a luta voltou aos tribunais, desta vez por causa de um bolo de aniversário.