A inflação, o custo da habitação e a subida das taxas de juro, apontam associações contactadas pela Lusa, estão a obrigar novas franjas da população a procurar apoio alimentar, ajuda que é normalmente solicitada por pessoas em situação de pobreza ou sem-abrigo.
Tendo-se especializado, nos últimos anos, na área da saúde, apoiando atualmente cerca de 600 famílias, a Caritas Diocesana do Porto retomou no início do ano a disponibilização de cabazes com produtos essenciais perante o aumento dos pedidos de ajuda.
À Lusa, o presidente da instituição, Paulo Gonçalves, revelou que, de forma direta, no primeiro trimestre do ano foram ajudadas mais 300 famílias (cerca de 100 por mês), 56% das quais de cidadãos estrangeiros.
“Neste momento, estamos a apoiar 102 famílias mensalmente, [o que representa um] incremento de 20% em relação ao mês passado”, disse, explicando que este é um apoio de emergência, que não se repete, sendo depois estas famílias encaminhadas para outras instituições parceiras para um apoio mais regular e permanente.
O responsável identifica dois perfis na procura destes apoios: no primeiro, a que chama de “pobreza envergonhada”, cabem famílias que até tinha a sua vida estruturada e que de um momento para o outro têm de escolher entre pagar a prestação ou renda da casa ou colocar comida na mesa.
Já por outro lado, acrescenta, têm chegado à Cáritas muitos pedidos de cidadãos estrangeiros provenientes da Ucrânia, Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), norte de África (Marrocos, Tunísia) e América do Sul (Argentina, Colômbia, Chile).
Uma realidade também relatada pelo responsável pelo projeto ‘Porta Solidária’, Rubens Marques, onde o número de pedidos de ajuda também tem vindo a ser engrossado por famílias de classe média e média baixa, migrantes e idosos.
“O número de utentes tem aumentado muito. Têm aumentado as famílias que vem buscar a refeição em ‘take away’, para que as crianças não tenham de almoçar nas nossas instalações, e também os que fazem as refeições na cantina” da instituição, sobretudo “devido aos migrantes”, detalhou.
Em março, revelou, das 343 pessoas que faziam refeições nas instalações do projeto, 177 eram cidadãos estrangeiros, número que, entretanto, já aumentou. São maioritariamente da América Latina, destacando-se os de nacionalidade brasileira (55), da Argélia e dos PALOP.
“Depois, aumentaram as famílias devido aos juros. Temos famílias onde pelo menos um trabalha, mas um ordenado não chega para sustentar a família durante o mês”, referiu.
Aberto desde 2009, o projeto da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição, da Diocese do Porto, serviu, em 2022, 119.223 refeições e até 31 de março 30.205, um número que o pároco diz não ter dúvidas de que vai continuar a aumentar.
A perceção da realidade é a mesma no projeto Coração da Cidade, departamento de apoio social da Associação Migalha de Amor.
A organização sem fins lucrativos é clara: no primeiro trimestre do ano, os pedidos de ajuda aumentaram cerca de 30%, com mais gravidade nas últimas três semanas.
Carlos Duarte, responsável pela área social, diz que a lista foi engrossada por “muitos imigrantes” – sobretudo marroquinos, brasileiros e ucranianos -, por famílias de classe média e média-baixa e idosos com pensões mínimas.
Os pedidos, frisa, chegam todos os dias, sendo já 2.700 as famílias alimentadas todas semanas pelo Coração da Cidade.
“Não é fácil”, reconhece Carlos Duarte, que revela que, devido à crise, o valor da ajuda diminuiu e está mais difícil encontrar novos parceiros.
A instituição disponibiliza ainda ajuda para aquisição de medicamentos. Através de um protocolo com uma farmácia local, os beneficiários podem levantar os medicamentos gratuitamente. Também aqui o número de pedidos aumentou.
Para os responsáveis, esta realidade tende a agravar-se.
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