"Pode ter havido negligência ou uma conduta inaceitável, tudo está em aberto. Tem de haver uma investigação imparcial e independente que não deixe margem para dúvidas para não ficarmos neste limbo de incerteza", disse a deputada europeia Isabel Santos, eleita pelo PS. "O que tem acontecido no Mediterrâneo e no Mar Egeu é absolutamente terrível e este foi o pior de todos os acidentes".

Na carta enviada hoje, a que o "El País" teve acesso, o diretor da Frontex, o holandês Hans Leijtens, fala em "queixas de incumprimento dos direitos fundamentais dos migrantes por parte da guarda costeira da Grécia". O responsável dá ao chefe da Proteção de Fronteiras e Estrangeiros da Polícia grega, Dimitrios Mallios, até 10 de julho para prestar esclarecimentos.

"É esse o papel da Frontex", afirma Isabel Santos. "A agência tem passado por diversas crises ao longo dos últimos anos, até por críticas à sua atuação e envolvimento em alguns processos. Agora, tem de haver um esclarecimento cabal". Para a eurodeputada, que é membro da Subcomissão dos Direitos Humanos, "um incidente destes não pode ficar sem explicação. Tanto mais que aparecem algumas informações de sobreviventes que deixam no ar uma desconfiança sobre o que terá acontecido, negligência ou algo ainda mais complicado".

As dúvidas quanto à atuação da guarda costeira grega são cada vez maiores e contradizem a versão oficial. "A guarda costeira rebocou-nos a alta velocidade e virámos". Este é, segundo o diário espanhol, o testemunho de diversos sobreviventes. "Segundos antes de mergulhar no mar, Kamal, um refugiado sírio de 27 anos, olhou para o relógio. Eram 2h05 do dia 14 de junho. O seu corpo afundou na escuridão junto com cerca de 750 pessoas que viajavam com ele a bordo de um velho barco de pesca azul, que pretendia chegar à Itália", revela o "El País".

Este não é o único acidente em causa, há outros. Por exemplo, a Frontex tem em aberto um relatório de "incidente grave" ocorrido a 11 de maio, em que um grupo de 12 migrantes africanos, incluindo um bebé de seis meses, foi obrigado a seguir numa embarcação-patrulha da guarda costeira grega para depois ficar à deriva no mar num barco insuflável. As imagens foram divulgadas pelo "The New York Times".

Isabel Santos confessa ter "uma opinião pessimista em relação ao que está a acontecer". Para a deputada, "a evolução não tem sido suficiente para evitar estes desastres". O que falta? "Falta uma política comum de asilo e migração, falta abrir corredores humanitários para aqueles que precisam de proteção internacional e falta abrir canais legais de acesso para migrantes que querem vir trabalhar para a União Europeia.

A verdade, diz, "é que com a crise demográfica que atravessamos - e que se vai agudizar no futuro, porque a tendência é essa", nada disto faz sentido. E lembra que "só a Alemanha poderá perder perto de 11 milhões de pessoas em idade ativa até 2050. Se queremos manter o nosso modelo social e de desenvolvimento, precisaremos de mão-de-obra, e o Inverno demográfico que estamos a passar devia levar-nos a olhar para isto com atenção".

"Isto, além dos valores em que foi fundada a União Europeia, que são humanistas. Os refugiados já fomos nós [europeus], que fugíamos da guerra. Nesta perspetiva, não há como negar que devemos dar a estas pessoas uma vida digna e em segurança, sejam migrantes ou refugiados. Assim, o que estamos a fazer é a alimentar as redes de tráfico, que depois produzem acidentes como aquele a que assistimos", conclui.