Garcia Pereira reagia à Lusa às declarações da ministra da Saúde, Marta Temido, que disse hoje que a Procuradoria-Geral da República (PGR) considerou ilícita a greve dos enfermeiros nos blocos operatórios.
A ministra afirmou que já homologou o "parecer complementar" da PGR e que este é vinculativo, pelo que a greve que está em curso desde 31 de janeiro "deverá ser suspensa".
Segundo Garcia Pereira, que representa o Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor), o parecer da PGR é "uma opinião jurídica" que, ao ser homologada pela ministra, "é uma ordem de serviço que não pode servir para condicionar ou anular a greve".
"É mais uma operação de intoxicação da opinião pública e uma tentativa de pressionar o tribunal, e isso é completamente inaceitável", sustentou, sublinhando que "é unicamente aos tribunais que compete declarar a licitude ou ilicitude de qualquer situação".
O Supremo Tribunal Administrativo admitiu na quinta-feira a intimação para a proteção de direitos, liberdades e garantias da classe apresentada pelo Sindepor a contestar a requisição civil decretada pelo Governo, que abrange quatro dos dez hospitais onde decorre a "greve cirúrgica", dando cinco dias ao Governo para apresentar a sua defesa.
"A greve é um direito fundamental que não pode ser eliminado por um ato administrativo do Governo", apontou Garcia Pereira, assinalando que o parecer da PGR foi "emitido apenas com os elementos fornecidos por uma das partes do conflito e sem contraditório".
Em conferência de imprensa, em Lisboa, a ministra da Saúde indicou que "duas circunstâncias justificam" o parecer da PGR: o pré-aviso de greve "não especificava" em que moldes a paralisação se iria realizar e questões relativas ao "financiamento colaborativo que se colocam à própria greve".
Para Garcia Pereira, a serem estes os argumentos, "a situação é ainda mais absurda".
"A Lei da Greve não contém nenhuma exigência de conteúdo acerca do pré-aviso que não seja informação sobre o início da greve e a definição dos serviços mínimos necessários à segurança e manutenção dos equipamentos e à satisfação de necessidades sociais impreteríveis", alegou, acrescentando que "o financiamento colaborativo está legalmente previsto e corresponde a uma atividade lícita".
De acordo com o advogado, especialista em direito do trabalho, "mesmo que se levantasse alguma espécie de questões acerca da regularidade do financiamento da greve, nunca isso é causa adequada para provocar a ilicitude da mesma greve".
O Governo pediu, em 29 de janeiro, um "parecer complementar" ao Conselho Consultivo da PGR para que se pronunciasse sobre as duas greves dos enfermeiros nos blocos operatórios, a que decorreu entre 22 de novembro e 31 de dezembro e a que começou em 31 de janeiro e com término previsto para 28 de fevereiro.
O pedido de parecer visava esclarecer a licitude da paralisação e do seu financiamento.
Num primeiro parecer, relativo à primeira greve, a PGR considerou, em 30 de janeiro, a convocatória da greve lícita, advertindo que a paralisação seria ilícita se cada enfermeiro decidisse o dia, a hora e a duração.
Marta Temido esclareceu hoje que o Ministério da Saúde fez um primeiro pedido de parecer, antes do início da primeira greve, "antes de 22 de novembro de 2018", e que esse parecer "foi no sentido de que não havia elementos suficientes para a Procuradoria se pronunciar sobre a ilicitude da greve".
"O Ministério da Saúde decidiu fazer um pedido de parecer complementar, juntando um conjunto de elementos sobre a forma como a greve vinha sendo exercida", que incidiam "sobre o primeiro período de greve", acrescentou.
Sendo a greve em curso, "como tem sido referido por várias estruturas sindicais, uma greve igual à primeira, e sendo a primeira ilícita, a ilicitude da greve está fixada", frisou Marta Temido.
"Temos uma greve que não é lícita e que, como tal, deverá ser suspensa de imediato", salientou, adiantando ter confiança de que os profissionais retomam o trabalho.
A ministra disse que, até quinta-feira, foram adiadas mais de 3.800 cirurgias, o que deverá ser mais de metade das programadas, mas não explicou o que vai acontecer aos profissionais em greve, tendo em conta que esta foi considerada ilícita, preferindo salientar que o parecer permite "retomar a normalidade" no Serviço Nacional de Saúde.
Marta Temido não se alongou sobre o parecer, mas disse também que a PGR não considera ilegal o financiamento colaborativo, mas que "se for forma de subtrair ao trabalhador o prejuízo tradicionalmente associado a uma greve" configura "elemento de ilicitude".
O Conselho de Ministros decretou em 7 de fevereiro uma requisição civil na greve dos enfermeiros em blocos operatórios em curso desde 31 de janeiro, alegando incumprimento da prestação de serviços mínimos.
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