Em ano de eleições na Ordem dos Advogados, uma guerra interna entre o bastonário Luís Menezes Leitão, e seus apoiantes, e a presidente do Conselho de Deontologia de Lisboa, Alexandra Bordalo Gonçalves, arrisca a anular 1228 decisões disciplinares tomadas pelo dito Conselho.

Em causa está a escolha dos vice-presidentes daquele órgão. Paulo Almeida, número um da lista que o bastonário apresentou ao Conselho de Deontologia de Lisboa (CDL) no último ato eleitoral, que foi derrotado - 2663 votos contra 3052, o que resultou na atribuição de nove mandatos à lista vencedora, oito à lista do bastonário três a uma terceira lista -, queixa-se que a presidente do CDL violou os estatutos da Ordem dos Advogados ao indicar como vice-presidentes os três elementos que lhe seguiam na lista que apresentara ao órgão de disciplina, quando na realidade a distribuição dos nomes deveria decorrer da aplicação do método de Hondt, o que implicava que a lista com mais votos ficasse com a presidência do órgão e um vice-presidente, enquanto da lista de Paulo Almeida ficaria com dois nomes na vice-presidência.

Segundo documentos enviados ao SAPO24, a queixa inicial foi apresentada em fevereiro de 2020, tendo tido resposta dos vices-presidentes em funções em julho desse mesmo ano, mês em que o recurso entra no Conselho Superior, órgão máximo da Ordem dos Advogados. No entanto, só em julho de 2021 é que o processo é distribuído. A resposta só foi conhecida em janeiro de 2022, com a 3.ª Secção do Conselho Superior a dar razão ao à lista do bastonário, considerando assim ilegal o despacho de Alexandra Bordalo Gonçalves que fixara a composição do CDL.

Perante esta decisão, a presidente do órgão interpôs no início de março, no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, um processo cautelar onde se pede a suspensão da decisão de anulação do despacho.

No processo cautelar, a que o SAPO24 teve acesso, Alexandra Bordalo Gonçalves diz que a atual decisão "colocará em causa a legalidade das decisões proferidas desde então e até ao momento, porquanto, tendo sido proferidas por secções constituídas, supostamente ao arreio da lei, padecerão de vicio que fulmina quanto até agora praticaram".

A presidente do CDL acrescenta ainda que desde a tomada de posse do órgão até ao presente "foram julgados 1228 processos, tendo sido aplicadas 765 sanções e arquivados 293 processos".

Alexandra Bordalo Gonçalves explica ainda que foram aplicadas multas, num total de 86.050 euros e de sanções acessórias de 6.844 euros. A estes valores somam-se ainda a aplicação de duas penas de expulsão.

Com a decisão tomada até ao momento, "colocar-se-á, inevitavelmente, em causa a legalidade de toda a acção disciplinar até agora ocorrida".

Para além de levar a anulação dos processos já decididos, a decisão pode também condicionar os próximos meses de atividade do órgão disciplinar, uma vez que as eleições para a Ordem dos Advogados só se realizam em novembro.

A presidente da CDL defende os estatutos da Ordem são omissos à forma como se escolhem os vice-presidentes dos conselhos de deontologia, dando como exemplo o triénio de 2008/2010 para demonstrar que nos sucessivos CDL os vice-presidentes eram sempre, e apenas, da lista vencedora. Alexandra Bordalo Gonçalves alarga ainda o exemplo às atuais estruturas dos conselhos de deontologia do Porto e Faro, onde se repete o mesmo caso.

“Para além de ilegal, esta deliberação é um procedimento do senhor bastonário e dos seus apoiantes que tenta lançar o mais completo descrédito sobre os órgãos da Ordem dos Advogados", afirma a presidente do CDL.

Ao Público, Menezes Leitão, bastonário da Ordem, diz que agiu na defesa da lei que só tomou a decisão na sequência da queixa recebida em relação à distribuição dos lugares de 'vices' naquele Conselho.

“Nos outros conselhos não me foi participado nada. Desconheço como funcionam. Não me compete averiguar os conselhos de deontologia”, afirma.