Confrontado pelo coletivo de juízes com esta situação ocorrida na madrugada de 3 de novembro de 2013, que configura o crime de homicídio na forma tentada, Alexandre Silva, de 27 anos, relatou que ia à boleia de carro, de regresso a casa, “após uma noite de copos no Cais do Sodré”, quando o grupo avistou o rapaz num passeio em Benfica.
Alexandre Silva justificou que saíram todos do carro para agredir o jovem porque um dos membros do grupo que seguia na viatura “tinha um problema com aquele indivíduo”.
O arguido admitiu que já depois de o rapaz ter sido agredido e estar no chão rodeado por quatro agressores, ainda lhe deu murros e pontapés, justificando a atitude por estar “um pouco embriagado”.
Reconheceu ainda que um dos colegas do carro “desferiu um corte” na vítima (Wilson Neto), mas que só se apercebeu que havia uma faca após um deles gritar “já chega” e quando o rapaz estava “estendido no chão”.
Alexandre Silva admitiu que um dos agressores utilizou também uma “chave de rodas” do carro para acertar no corpo da vítima.
O juiz presidente, Noé Bettencourt, confrontou o arguido com declarações prestadas na fase de interrogatório e cuja versão não é totalmente coincidente com a narração de hoje, ao não abordar matérias relacionadas com os ‘hammerskins'(movimento neonazi).
Antes, Alexandre Silva declarou que na altura era ainda um ‘prospect’ (candidato) aos ‘hammerskins’, mas recusou-se a responder ao juiz adjunto Francisco Coimbra quando este o questionou sobre o que um candidato tinha que fazer para aderir aos 'hammerskins'.
O arguido mostrou-se arrependido pelos atos então praticados, alegando que foi “uma fase má de inconsciência”, em que “não tinha noção do mal que estava a fazer” e admitiu que era de “extrema-direita”, mas que se juntou ao grupo de ‘hammerskins’ mais “pelas pessoas do que pela ideologia” que, disse, nunca aprofundou.
Alexandre Silva declarou que já não segue aquele movimento, cuja ideologia “já não o seduz” e que hoje é estudante de Desporto numa universidade.
Durante a sessão da tarde foi ainda inquirido o arguido e guarda prisional João Vaz, que negou pertencer aos ‘hammerskins’, embora tenha confirmado que participou, em 2015, numa manifestação contra os refugiados em Lisboa.
Após a manifestação deslocou-se com outros manifestantes até ao Rossio, onde disse ter assistido a um desacatado entre um militante do PCP e membros que tinham estado na manifestação e que envergavam camisolas a dizer “refugiados não são bem-vindos”.
O desacato gerou o conflito violento que terminou com um elemento do grupo a desferir uma cotovelada na fonte do militante comunista, que ficou inconsciente no chão e com espasmos musculares.
O arguido relatou que face à indignação de dezenas de transeuntes, decidiu regressar ao carro para fugir a uma eventual agressão, tendo deixado cair a carteira com os documentos, situação que só se apercebeu quando chegou ao veículo. Regressou então ao local do incidente, já sem a t-shirt da manifestação anti-refugiados, e aí alguém apresentou queixa contra ele na esquadra da PSP.
Negou alguma vez ter pertencido aos ‘hammerskins’ ou agredido alguém, mas teve dificuldades em explicar porque razão foi encontrada uma soqueira, um cachecol daquele movimento neo-nazi e um livro escrito por Hitler numa busca efetuada à sua residência.
Durante o julgamento, disse costumar assistir aos jogos do Futebol Clube do Porto junto à claque dos Super-Dragões, conhecer o líder daquela claque Fernando Madureira, mas que não está imbuída de qualquer discriminação racial.
O julgamento prossegue na próxima quarta-feira. Hoje, apenas três dos 27 arguidos manifestaram a intenção de prestar declarações em julgamento, no Juízo Central Criminal de Lisboa.
Este processo tem 24 volumes, 5.800 páginas e 88 apensos. Quatro dos 27 arguidos estão pronunciados por tentativa de homicídio, estando ainda em causa entre os restantes arguidos os crimes de ódio racial e sexual, ofensas corporais, incitamento à violência, tráfico de droga e posse de arma proibida.
Os 27 arguidos conotados com o movimento ‘hammerskin’ terão provocado várias vítimas na zona da Grande Lisboa. Este grupo violento foi desmantelado no decorrer de uma operação da Unidade Nacional Contraterrorismo da Polícia Judiciária (PJ), em 2016.
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