A líder do Executivo de Hong Kong emitiu um pedido de desculpas "às pessoas de Hong Kong por isto [a forma como o governo lidou com a polémica lei da extradição e com os protestos] e compromete-se a adotar a mais humilde atitude para aceitar críticas e fazer melhoramentos ao nível do serviço público", cita a Reuters. Um porta-voz do governo reconheceu que a forma como o Executivo tratou o tema gerou "grande controvérsia e disputas na sociedade, gerando desapontamento e tristeza".
Dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas este domingo, 16 de junho, em Hong Kong para exigir a retirada do polémico projeto de extradições para a China, forçando o governo pró-Pequim a apresentar "desculpas" por ter provocado "conflitos".
Os organizadores pretendem manter a pressão sobre Carrie Lam, chefe do Executivo pró-Pequim de Hong Kong, que no sábado suspendeu o projeto de lei autorizando as extradições para a China.
"Retire a lei do mal!", gritavam os manifestantes vestidos de preto. A marcha de protesto partiu de um parque na ilha de Hong Kong e seguia para o Conselho Legislativo (LegCo, Parlamento), no coração da cidade. Trata-se do mesmo percurso realizado há uma semana e que reuniu um milhão de pessoas, de acordo com os organizadores.
Segundo os críticos, o projeto colocaria a população da ex-colónia britânica à mercê do sistema judicial da China continental, opaco e controlado pelo Partido Comunista. A comunidade empresarial teme ainda a possibilidade de a reforma prejudicar a imagem internacional e a atratividade do centro financeiro.
Acusada de autoritarismo, Lam apresentou neste domingo as suas "desculpas" e reconheceu que as "lacunas no trabalho do governo provocaram muitos conflitos e rixas na sociedade".
Ela justificou a repressão das manifestações pelos atos de violência da parte de alguns manifestantes.
"A reação de Carrie Lam não foi sincera, é por isso que estou a manifestar-me hoje", explicou Terence Shek, de 39 anos, que veio com os seus filhos.
Na quarta-feira, Hong Kong registou os piores episódios de violência desde a devolução do território à China em 1997, quando milhares de pessoas foram dispersadas pela polícia de choque com gás lacrimogéneo e balas de borracha.
"Polícia de Hong Kong, o seu dever é proteger-nos, não atirar contra nós", dizia o cartaz de um manifestante.
Flores para lamentar uma morte
Lam não desistiu permanentemente do texto, mas os manifestantes exigem o abandono do mesmo, a renúncia da chefe de governo, além do pedido de desculpas pela violência policial.
"Esta suspensão significa que o projeto [da lei de extradição] pode ser reativado a qualquer momento", disse o militante Lee Cheuk-yan.
Quase 80 pessoas, incluindo 22 polícias, ficaram feridos na quarta-feira. No sábado, um homem morreu ao cair do telhado de um centro comercial, onde ficou por várias horas com um cartaz onde se lia: "Retire completamente a lei de extradição chinesa. Não somos baderneiros. Libertem os estudantes e os feridos".
Neste domingo, as pessoas formavam enormes filas para deixar flores e origamis no local da tragédia, além de mensagens de homenagem ao falecido.
Jimmy Sham, da Frente Cívica de Direitos Humanos, comparou o projeto de lei a uma "faca" que ameaça Hong Kong. "Quase atingiu os nossos corações. Agora o governo diz que não vai avançar, mas também recusa-se a retirá-lo".
A oposição ao projeto de lei é ampla, reunindo advogados, organizações jurídicas influentes, empresários, câmaras de comércio, jornalistas, ativistas, religiosos e diplomatas ocidentais.
Sob o princípio de "um país, dois sistemas", a ex-colónia britânica goza de liberdades face à China continental, teoricamente até 2047.
Ressentimento mais amplo
Mas o movimento vai além da questão das extradições e expressa um ressentimento muito maior contra o governo e contra Pequim, acusados de limitar as liberdades do território semi-autónomo.
Nos últimos dias, a chefe de governo tem estado cada vez mais isolada, com deputados do seu próprio campo a distanciar-se do polémico texto da lei de extradição.
"Apoiamos, respeitamos e entendemos" a decisão de suspender o texto, declarou o ministério das Relações Exteriores da China, falando da necessidade de "restaurar a calma o mais rápido possível" no território.
Os críticos de Lam culpam-na por perder várias oportunidades de se desculpar pelo comportamento da polícia.
Ela justificou a ação policial por atos de violência perpetrados por certos manifestantes. Mas a oposição acusa-a de usar as atitudes de uma pequena minoria para atacar todos os manifestantes, na sua maioria pacíficos.
"Os grupos pró-democracia não vão parar por aí. Querem aproveitar o impulso contra Carrie Lam", explicou à AFP o analista político Willy Lam.
Neste momento, os manifestantes exigem que a polícia retire as acusações contra os manifestantes acusados de serem desordeiros. Estes temem represálias do governo, disse o militante Lee Cheuk-yan, e querem a garantia de que "o povo, os manifestantes, não sejam assediados e politicamente perseguidos pelo governo".
Na China, a imprensa estatal e as redes sociais estavam em silêncio sobre o movimento de protesto, sem qualquer menção ao recuo do governo de Hong Kong.
Em Washington, o secretário de Estado Mike Pompeo informou que o presidente Donald Trump pretende comentar as manifestações com seu colega chinês Xi Jinping durante a cimeira do G20 no final de junho no Japão.
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