No ataque de hoje há duas vítimas mortais e um ferido. Mas nas contas finais há cinco vítimas, juntam-se três crianças, filhos do atacante, que já não tinham mãe e que, agora, terão que carregar com mais um estigma. O SAPO24 falou com a professora e investigadora Maria João Tomás (ISCTE) e questionou-a acerca do futuro destas crianças e da possibilidade de estarem permeáveis a manipulações radicais. A professora respondeu repetindo a palavra "informação" três vezes. Esta é uma resposta que se repetirá ao longo da conversa.
Maria João Tomás acredita que a informação mitiga a maioria dos males, muitos deles fruto de ignorância. No caso dos filhos do atacante a solução também passará por aí. "Dar informação, formação e apoio psicológico. Dar-lhes uma família de acolhimento. Dar-lhes perspectivas futuras de vida. Explicar-lhes que o que aconteceu foi provavelmente um ato de desespero. Informar. Acompanhar."
A investigadora acredita que a maioria das vezes é-se demasiado rápido a analisar e a comentar, "esquecemo-nos de olhar para a história das pessoas. Vemos tudo com o nosso ponto de vista. Achámos que ele tinha tudo, que estava a ser acompanhado, a ter aulas de português e... então porque é que ele fez isto?" Explica contextualizando a vida e a fuga dos afegãos, ressalvando que nada justifica este tipo de violência, "mas há um enquadramento que pode ser feito". "Os afegãos saíram do Afeganistão em circunstâncias trágicas. Muitos deles à pressa sem qualquer tempo para levar os seus pertences."
E a tragédia não começou na fuga, nem acabou na viagem, "depois chegam a Portugal e deparam-se com imensas dificuldades de burocracias de situações que não percebem. Coisas tão simples como a existência de um banco, ou as multas da polícia, coisas que para nós são básicas. No Afeganistão a organização era diferente e, agora, chegam a uma realidade que não compreendem."
É por isso que, para Maria João Tomás, municiar os migrantes de informação é tão importante. E, por isso, ao longo da conversa vai repetindo como resposta a várias perguntas "informação, informação, informação". Depois desenvolve, "dar às pessoas a informação do que podem fazer, que recursos têm. As pessoas precisam de saber que há instituições, como as Misericórdias por exemplo, que as podem ajudar. Não podemos permitir que fiquem desesperadas."
E, no país, para a investigadora o que parece faltar é mesmo a divulgação. "Nós temos capacidade de resposta em Portugal, temos meios e mecanismos de resposta que as pessoas não sabem que existem." Refere a linha de apoio ao migrante como exemplo de um bom serviço que acaba por ser desconhecido.
Sem justificar o ataque isolado de um homem, a professora insiste que o enquadramento e a informação são importantes. E que, até para evitar situações de radicalização e de revolta, urge que as pessoas saibam que mecanismos têm ao seu dispor. "É preciso dizer aos pais e mães que chegam sozinhos que há algumas associações que acolhem, que ajudam, que dão ferramentas para ajudar a encontrar um emprego. Mas as pessoas não sabem."
Quando questionada acerca da estratégia a tomar, para que este caso não abra a porta a mais situações de violência, é peremtória. "O mecanismo é não tornar as pessoas desesperadas, eu sei que é um lirismo estar a dizer isto. Mas é real, pode-se fazer. É dar mecanismos às pessoas para perceberem como é que funciona a nossa sociedade, o que é que têm que fazer, por exemplo, para ter a documentação. Isso é importante."
Mas, acrescenta, que esta informação, esta partilha, tem que ser ajustada para chegar às pessoas que a procuram. "Isto tem que ser feito de uma forma a que chegue às comunidades: escrita em papel, distribuída nas associações, nos templos, nas mesquitas, à entrada dos aeroportos - mas muitos não vêm de avião como se sabe." E continua sugerindo, e enumerando formas de partilhar informação. "Estas pessoas precisam de saber o que é que podem fazer para melhorar a sua vida. E é isso que tem que ser dito de forma escrita, em papel, digital, numa app, no youtube, por exemplo, e claro em várias línguas."
Este é um passo não só para o acolhimento, mas também para a segurança interna: "Ter essa informação disponível é essencial, é essencial dar informação às pessoas daquilo que têm que fazer para não cair nas redes que existem em Portugal e no mundo inteiro."
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