O estudo, publicado na revista científica Nature, teve a participação de oito investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) e foi liderado pela Universidade de Warwick, no Reino Unido.
"É a primeira vez que observamos o núcleo de um planeta gigante", sublinhou à Lusa uma das coautoras do trabalho e investigadora do IA, Susana Barros, assinalando que "é muito difícil estudar" o núcleo rochoso de planetas gigantes, como Júpiter, Saturno, Úrano ou Neptuno, uma vez que "são compostos por uma grande quantidade de gás".
O planeta extrassolar (fora do Sistema Solar) em causa é o TOI-849b, que orbita muito próximo a estrela TOI-849, localizada a 730 anos-luz da Terra.
Segundo o IA, o facto de ter sido detetado fora do Sistema Solar, o núcleo de um planeta gigante, semelhante a Neptuno no tamanho, mas com o quíntuplo da sua massa, constitui "um alvo ideal para se tentar conhecer melhor o interior sólido profundamente escondido sob as espessas atmosferas dos gigantes do Sistema Solar".
A deteção do núcleo de um planeta como o TOI-849b desafia as teorias de formação de planetas gigantes, que "não preveem" a existência deste exoplaneta, apontou a astrofísica Susana Barros.
Quando "um protoplaneta (núcleo de planeta) atinge 10 a 20 massas da Terra, começa a atrair gás muito eficientemente e transforma-se rapidamente num planeta gigante".
Contudo, o TOI-849b tem um núcleo de 40 massas terrestres.
"Por isso, por alguma razão, não conseguiu atrair o gás quando o devia ter feito (pode ter-se formado tarde e já não existir gás no disco de acreção da estrela) ou então perdeu o gás devido, por exemplo, a colisões com outros planetas", admitiu Susana Barros.
O astrofísico Sérgio Sousa, coautor do estudo e também investigador do IA, disse à Lusa que o exoplaneta em questão "terá eventualmente migrado para órbitas cada vez mais perto da estrela, e estando assim tão perto da estrela e sofrendo de uma radiação muito mais forte, terá perdido a sua componente gasosa, restando apenas o seu núcleo".
Pela sua massa, o planeta extrassolar TOI-849b "deveria ter atraído mais gás (hidrogénio e hélio) para formar uma atmosfera densa", como a de Júpiter ou Saturno, refere o comunicado do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço.
Porém, "em vez disso, parece expor a nu o núcleo primordial de formação destes planetas gigantes", acrescenta o IA, sublinhando que "nestes núcleos a matéria está sujeita a elevadas pressões, com propriedades ainda mal conhecidas" devido à espessa atmosfera.
O TOI-849b foi descoberto em 2018 pelo satélite norte-americano TESS e confirmado posteriormente por outros instrumentos. O exoplaneta dá uma volta completa à sua estrela em 18 horas e a sua camada exterior atinge cerca de 1.500ºC.
Através da identificação das propriedades da estrela-mãe do planeta, uma estrela semelhante ao Sol, mas um pouco mais velha, a equipa científica pôde "inferir as abundâncias químicas" do TOI-849b e as suas "proporções de ferro e silício", com base nas quais concluiu que a atmosfera do exoplaneta "será, no máximo, de apenas 4% da massa total", adianta o IA.
Os astrofísicos esperam, numa fase seguinte, e com novos telescópios, como o James Webb, com lançamento para o espaço previsto para 2021, "estudar a atmosfera residual deste planeta, que terá provavelmente origem na evaporação do próprio material sólido sob elevada temperatura".
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