"Foram descobertos vasos de cerâmica que continham, no interior, grãos de cereais tais como centeio, cevada e trigo. Estas sementes vão agora ser analisadas por uma equipa de arquirromântica e nos próximos tempos os resultados serão divulgados", disse hoje à Lusa, Luís Seabra, aluno de doutoramento da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP).
O também investigador do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO-InBIO) adiantou que esta descoberta poderá dar a conhecer o que as comunidades do passado cultivavam e, ao mesmo tempo, perceber o seu contexto arqueológico das descobertas.
"As sementes encontradas dentro e fora do vaso são minúsculos pontinhos pretos, com aparência petrificada, e carregam muita história", concretizou o investigador.
O que despertou a atenção de Luís Seabra e dos orientadores da sua tese de doutoramento na área da arqueobotânica/carpologia para estas escavações foi a descoberta, pela equipa de arqueólogos, nas campanhas de prospeção arqueológicas de 2016 e 2017, de vasos bem preservados, quase intactos, com sementes.
"Trata-se de uma achado raro, um pequeno tesouro, que poderá agora revelar muito sobre o que cultivavam os povos que ali viveram há centenas de anos e como o faziam", explica, em comunicado, a equipa de investigadores.
A ocupação do castro de São João das Arribas, em Aldeia Nova, Miranda do Douro, no distrito de Bragança, situa-se entre antiguidade tardia e a Alta Idade Média.
"É raro encontrar estes vasos. Acaba por ser um pequeno tesouro para nós e é importante realizar as devidas análises para, depois, fazermos então as interpretações. A descoberta destes vasos foi o ponto fulcral", destaca Luís Seabra.
O investigador do CIOBIO-InBIO, acrescenta, em nota enviada à Lusa que, com base na sua experiência de trabalho no Norte de Portugal, não tem conhecimento de achados semelhantes.
"Penso que é excecional terem sido encontrados estes vasos quase intactos", remata.
Do sítio arqueológico para o laboratório, tudo é escavado, descoberto e analisado ao pormenor.
"Na zona das escavações, nas diferentes camadas, nós fazemos a recolha de sedimentos para posterior estudo. O processo é bastante simples. Fazemos a recolha de uma amostra, normalmente usando um balde de terra e depois fazemos um processo chamado flutuação, que consiste em colocar água sobre o sedimento, agitar, e, deste modo, todo o material orgânico sobe, explicou Luís Seabra.
Os responsáveis pelos trabalhos arqueológicos do Projeto de Investigação sobre o Castro de São João das Arribas já tinham recolhido vários materiais, incluindo vasos e sementes, em anos anteriores, desde 2016, e cedo perceberam o potencial e a riqueza dos achados, tendo iniciado então uma colaboração com a equipa do CIBIO-InBIO para integrar estudos de Arqueobotânica/Carpologia.
Para já, foi possível “identificar a presença de centeio, de cevada e de trigo”.
“No entanto, vamos precisar agora de mais tempo, nos próximos anos, no âmbito do meu doutoramento, para fazer a análise das restantes amostras e depois conjugar os resultados", disse Luís Seabra.
A arqueobotânica é o estudo de vestígios botânicos antigos recolhidos em jazidas arqueológicas e a carpologia um ramo de estudo mais específico focado nas sementes e frutos.
O Projeto arqueológico de S. João Arribas é coordenado pelos arqueólogos Mónica Salgado, Pedro Pereira e Susana Temudo e tem como parceiros a Palombar, a associação francesa Rempart, a Junta de Freguesia de Miranda do Douro e o município de Miranda do Douro.
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