Num vídeo de 30 minutos, em direto através da rede social Instagram, Isabel dos Santos admitiu estar preocupada com as suas empresas em Angola, nomeadamente por causa dos pagamentos a fornecedores e mostrou reservas sobre a capacidade de acompanhar a gestão das mesmas sem poder mexer no dinheiro.

O Tribunal Provincial de Luanda decretou o arresto preventivo de contas bancárias pessoais da empresária angolana Isabel dos Santos, do marido, Sindika Dokolo, e do português Mário da Silva, além de nove empresas nas quais detêm participações sociais.

A empresária, que começou por reagir no Twitter, onde considerou que todo este processo teve motivações políticas, levou as suas preocupações para o Instagram, onde respondeu a perguntas de seguidores.

"Estou triste e estou preocupada", começou por assumir a empresária. "Os últimos dois ou três dias têm parecido um tsunami", acrescentou. "Tenho tido tantas mensagens de apoio, é muito bom", agradeceu.

"Gosto de trabalhar, gerar empregos, investir", respondeu a um dos utilizadores. Quando questionada sobre o atual momento disse que a sua expectativa é de que "tudo dê certo", mas ressalvou que "há muita mentira, tantas mentiras que são ditas por pessoas que deviam ser as que nos protegem, que de vez em quando somos pequeninos e não é fácil passar a nossa mensagem".

Isabel dos Santos assumiu que está "preocupada". "Há muitas pessoas que trabalham comigo e estão há muitos anos nestes projetos. Sei que neste momento o coração deles também está apertadinho e com aquele frio no coração", disse.

"[O fim de ano] não está a ser fácil, não tenho muitas soluções ainda, espero que haja bom senso", respondeu a um dos utilizadores.

Questionada sobre o que significa este arresto de contas, Isabel dos Santos respondeu que "significa que não pode fazer pagamentos". "Não vou poder pagar a um fornecedor, se tiver pagar um contrato, um empréstimo ou dívida não vou conseguir pagar e isso causa muitos problemas e vai causar problemas. O dinheiro tem de ser utilizado para trabalhar não pode ficar parado, temos de comprar equipamentos, pagar salários, fornecedores e vai ser muito difícil não poder fazer estas coisas".

"Hoje talvez Angola tem paz, mas não é um sítio de paz", comentou ainda a empresária. "Vou pedir [aos meus colaboradores] para continuarmos a trabalhar, para servir bem, para continuar a servir os nossos clientes. Vamos continuar a trabalhar por Angola", disse.

"É importante a justiça ser justa e que dê uma oportunidade às pessoas de se poderem defender, de mostrar documentos e factos. Ninguém quer uma sociedade em que alguém possa ser acusado e não se possa defender, a mim não foi dada essa oportunidade", reiterou — uma informação que já tinha avançado anteriormente.

A empresária angolana afirmou, em comunicado enviado à agência Lusa no dia 31 de dezembro, “que nunca foi notificada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) ou citada pelo Tribunal Provincial de Luanda”, desconhecendo o teor da acusação e que “não teve oportunidade de apresentar defesa”.

“Este despacho sentença é resultado de um julgamento de uma providência cautelar, que ocorreu sem conhecimento das partes, de forma aparentemente arbitrária e politicamente motivado. Não compreendendo nem se podendo conformar com este enquadramento num Estado de Direito democrático como é Angola, Isabel dos Santos pretende opor-se a cada uma destas alegações em sede e tempo próprio nos termos estabelecidos na lei angolana”, lê-se no comunicado.

No Instagram, Isabel dos Santos diz que não sabe se a PGR era obrigada a notificá-la, mas disse que "seria o melhor caminho". "Eu não sei se eles são obrigados a notificar, mas quando estamos a falar de tantos trabalhadores, acho que pela a atenção a todas as pessoas que trabalham nestas empresas [detidas pela empresária], chamar e pedir um esclarecimento seria o melhor caminho e não criaria este nível de ansiedade".

Questionada sobre a possibilidade de algumas empresas da empresária em Angola encerrarem, Isabel dos Santos assumiu que "há essa possibilidade". "Como sabe estamos num momento de crise económica e assim sendo essas empresas não sendo acompanhadas de perto pelo acionista, por quem as criou, o risco está sempre aí".

Isabel terminou esta interação com os seguidores no Instagram a falar do pai, ex-presidente de Angola, José Eduardo dos Santos: "O meu pai está preocupado, acredita que em Angola tem de vencer a verdade. O que ele me disse foi 'a luta continua, muita coragem'".

O arresto

O Tribunal Provincial de Luanda decretou o arresto preventivo de contas bancárias pessoais da empresária angolana Isabel dos Santos, do marido, Sindika Dokolo, e do português Mário da Silva, além de nove empresas nas quais detêm participações sociais.

Um comunicado de segunda-feira da PGR de Angola refere que o Serviço Nacional de Recuperação de Ativos intentou uma providência cautelar de arresto no Tribunal Provincial de Luanda contra Isabel dos Santos, Sindika Dokolo e Mário Filipe Moreira Leite da Silva.

De acordo com a PGR, Isabel dos Santos, filha do ex-Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, Sindika Dokolo, marido de Isabel dos Santos, e Mário Silva celebraram negócios com o Estado angolano através das empresas Sodiam, empresa pública de venda de diamantes, e com a Sonangol, petrolífera estatal.

O arresto consiste numa apreensão judicial de bens e funda-se no receio de perda da garantia patrimonial face ao crédito não pago.

No comunicado enviado à Lusa, Isabel dos Santos afirma desconhecer “quando teve lugar a audiência de testemunhas referida no despacho sentença, a sua identidade ou quaisquer outros supostos elementos de prova trazidos ao processo”.

“Não existe racional ou justificação para o valor apresentado no despacho sentença de 1.136.966.825,56 dólares [mais de mil milhões de euros] valor no qual supostamente o Estado foi lesado”, acrescenta, sobre a reivindicação dada como provada e que consta da ação contra as alegadas ações dos três requeridos, por negócios em que envolveram as empresas Sodiam, empresa pública de venda de diamantes, e com a Sonangol, petrolífera estatal.

Além das contas dos três requeridos em Angola, foram ainda arrestadas as participações de Isabel dos Santos em várias empresas angolanas, como a Unitel, Zap, BFA, Contidis.

A empresária afirma no comunicado que os “factos dados como provados para fundamentar” a decisão de arrestar os seus bens “padecem de evidentes falsidades, imprecisões e omissões”. Sublinhando que “não compreendendo nem se podendo conformar com este enquadramento num Estado de Direito democrático como é Angola”, pretende “opor-se a cada uma destas alegações em sede e tempo próprio nos termos estabelecidos na lei angolana”.

Entre as várias acusações que para o tribunal ficaram provadas consta a de que Isabel dos Santos, por intermédio do seu sócio Leopoldino Fragoso do Nascimento "está a tentar transferir alguns dos seus negócios para a Rússia, tendo a PJ portuguesa intercetado uma transferência no valor de 10 milhões de euros que se destinava à Rússia".

No comunicado, Isabel dos Santos afirma tratar-se de uma informação “falsa e forjada”, bem como “é também falsa a afirmação da intervenção da Polícia Judiciária portuguesa", garantindo Isabel dos Santos que não tem "ligação a este assunto e desconhecendo o mesmo”.

“Novamente devendo a PGR, se estiver de boa fé, informar sobre os detalhes da suposta instrução bancária de Isabel dos Santos relativamente a uma conta do General Leopoldino do Nascimento e informação sobre a intervenção da Polícia Judiciária portuguesa”, afirma a empresária angolana, ao mesmo tempo que assegura que “é falsa” a afirmação de que “está a ocultar património obtido à custa do Estado transferindo para outras entidades”.

A empresária angolana afirma que, conforme “comunicado várias vezes publicamente e comprovado” pela documentação legal das sociedades, “não é, e nunca foi, sócia ou beneficiária” da empresa Geni, do General Leopoldino Fragoso do Nascimento, que detém entre outras participações 25% da operadora de telecomunicações móveis angolana Unitel.

“É igualmente falsa a informação de que Isabel dos Santos tentou vender participação na Unitel a um suposto cidadão árabe, devendo então a PGR, caso esteja de boa fé, informar o público o nome do cidadão árabe contactado e pormenores das datas de reunião e outras diligências realizadas”, sublinha.

Afirma igualmente que não é e nunca foi sócia ou beneficiária das empresas De Grisogono (joalharia suíça de luxo detida em partes iguais por Sindika Dokolo e pela Sodiam) e Vitoria, e que por isso “nunca estabeleceu nenhuma parceria” com a diamantífera estatal angolana, que para o tribunal de Luanda terá sido prejudicada por esta parceria.

“É falsa a afirmação de que o Presidente José Eduardo dos Santos terá orientado a Sodiam para a venda de diamantes a preços inferiores aos praticados no mercado. Tal como é falsa e forjada a afirmação de que as empresas Iaxhon, Relactant, Odissey, Nemesis vendiam diamantes no exterior do País, sem que o Estado angolano tivesse qualquer visibilidade”, garante Isabel dos Santos.