A posição surge numa carta, com data de 20 de janeiro e à qual a Lusa teve hoje acesso, em que o gestor português, considerado o braço direito da empresária angolana Isabel dos Santos, comunica ao conselho fiscal do Banco de Fomento Angola (BFA) a sua renúncia ao mandato.

“Em particular, no último triénio, em que desempenhei as funções a que agora renuncio, o banco obteve resultados sem paralelo”, lê-se na carta, em que Mário Leite da Silva justifica a sua renúncia ao cargo com a exclusão da nova lista de administradores aprovada em dezembro pela operadora de telecomunicações angolana Unitel (que detém 51,9% do capital social do banco e que até 2019 foi liderada por Isabel dos Santos).

Afirma, para explicar o desempenho do BFA, que os resultados gerados neste triénio atingiram os 1.470 milhões de dólares (1.325 milhões de euros) e que só neste período o banco distribuiu dividendos no valor de 139 mil milhões de kwanzas, valor equivalente a 452 milhões de dólares (407,6 milhões de euros).

O português, braço direito da filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos, assumiu o cargo de presidente do BFA em janeiro de 2017, após a assinatura do acordo de compra de 2% do BFA pela Unitel, sendo eleito para o triénio 2017-2019.

Mário Leite da Silva substituiu Fernando Ulrich em 5 de janeiro de 2017, logo após o Banco Português de Investimento (BPI) concretizar a venda de 2% do BFA à Unitel, passando a operadora angolana a controlar o banco (51,9%, cabendo os restantes 48,1% ao BPI).

Na carta em que renuncia ao cargo, Mário Leite da Silva afirma que o rácio de solvabilidade do BFA cresceu de 34,7% em janeiro de 2017 para mais de 65% no final de 2019.

“Este reforço da solidez do banco foi conseguido à custa de uma gestão focada na salvaguarda da rentabilidade e do património acionista, que levou a que os capitais crescessem de 173,2 mil milhões de kwanzas (1.000 milhões de dólares) para 460,9 mil milhões de kwanzas, resistindo de forma absolutamente notável ao impacto de uma desvalorização cambial que atingiu cerca de 65%”, lê-se na carta enviada ao conselho fiscal.

Refere igualmente que apesar de a carteira de crédito ter crescido de 235 mil milhões de kwanzas em janeiro de 2017 para 308 mil milhões de kwanzas em setembro de 2019, e “apesar de uma conjuntura fortemente adversa, o rácio de incumprimento passa de cerca de 4,7% no final de 2016 para pouco mais de 6,3% no final de 2019”.

Destaca também o financiamento do BFA ao Estado, que se manteve neste triénio “apesar das severas condições de liquidez da economia”: “O banco foi capaz de manter o seu suporte financeiro ao Estado, assegurando o financiamento de dívida pública no montante de 933 mil milhões de kwanzas (setembro de 2019)”.

Para além disso, o BFA pagou em impostos, nos últimos três anos, mais de 300 milhões de dólares, “sendo seguramente um dos 10 contribuintes mais importantes de Angola”.

“Em suma”, descreve Mário Leite da Silva, foram “quase 12 anos a promover a inclusão financeira, a promover o emprego qualificado, a fazer crescer a marca mais sólida, confiável e socialmente responsável de Angola”.

A carta em que comunica ao conselho fiscal do BFA a sua renúncia ao mandato surge em simultâneo com o chamado processo 'Luanda Leaks'.

Mário Leite da Silva é apontado como um dos facilitadores portugueses dos negócios de Isabel dos Santos que envolvem esquemas financeiros suspeitos, revelados na investigação jornalística conhecida como ‘Luanda Leaks’.

A Procuradoria-Geral da República de Angola anunciou na quarta-feira que Isabel dos Santos foi constituída arguida por alegada má gestão e desvio de fundos durante a sua passagem pela Sonangol, tal como alguns cidadãos portugueses, entre os quais Mário Leite da Silva.

O gestor foi também alvo, tal como Isabel dos Santos e o seu marido, Sindika Dokolo, do arresto preventivo de participações em empresas e contas bancárias decidido em dezembro pelo Tribunal Provincial de Luanda.

O 'Luanda Leaks' detalha esquemas financeiros da empresária angolana e do marido que lhes terão permitido desviar dinheiro do erário público angolano, utilizando paraísos fiscais, alegações que Isabel dos Santos considera "completamente infundadas".