Desde o início do ano fecharam mais de 340 camas em unidades de cuidados continuados por “estrangulamento financeiro” destas instituições, alertou hoje a Associação Nacional dos Cuidados Continuados, admitindo que até final do ano possam fechar mais.
O presidente da associação, José Bourdain, que foi hoje ouvido na Comissão de Saúde, a pedido do partido Chega, sobre as dificuldades sentidas pelas Unidades de Cuidados Continuados Integrados, garantiu que todas as unidades que fecharam no ano passado encerraram por dificuldades financeiras, apontando os curtos valores pagos pelo Estado face, sobretudo, ao aumento das despesas das instituições.
“Em relação a 2023, tínhamos indicação de que a Casa da Criança do Rogil, no Algarve, iria encerrar este ano (…). Pois foram mais três no Norte, uma delas com duas tipologias, a fechar por subfinanciamento em três semanas, num total de 342 camas”, afirmou o responsável.
Questionado pelos deputados sobre declarações de elementos da Comissão Nacional de Coordenação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados que também foram hoje ouvidos na mesma comissão, e que disseram que nem todas as instituições fecharam por dificuldades financeiras, respondeu: “Uma delas, que é a minha, fechou por falta de enfermeiros (…). Apesar dos pedidos na rede, não reabri porque me dava um prejuízo brutal”.
“Portanto, a causa de estar fechada é efetivamente financeira. Não a falta de enfermeiros, porque hoje já os há”, acrescentou.
A propósito das dificuldades financeiras das unidades de cuidados continuados, José Bourdain leu um ‘email’ de uma instituição associada, com 150 anos, que se encontra em programa especial de reabilitação a nível financeiro, e que confirma que a situação nas valências de Estrutura Residencial Para Pessoas Idosas (ERPI) e Cuidados Continuados é “muito delicada” e pondera, por isso encerrar, se não for revista a comparticipação do Estado.
“Não o fizemos no período pandémico porque, apesar das dificuldades, entendemos que não seria justo para os utentes que usufruem dos nossos serviços, que são de qualidade, nem para o serviço Nacional de Saúde, para o qual contribuímos orgulhosamente, mas neste momento a situação é deveras complicada”, referia o ‘email’ lido pelo responsável.
Insistindo que o valor pago pelo Estado, apesar das atualizações do ano passado, é insuficiente para os gastos das instituições, deu o exemplo da unidade que dirige, em Sintra, com 49 camas de Média Duração e 10 de Longa Duração.
“Pela legislação, devia ter 50 profissionais, mas tenho 70. Os profissionais exigidos [pela rede] não chegam para os cuidados que os doentes precisam”, disse o responsável, exemplificando: “Na legislação da rede não está previsto pessoal de cozinha, de lavandaria, limpeza, farmacêuticos ou administrativos”.
Sublinhando a dificuldade que atravessam estas instituições, José Bourdain aludiu ainda a um “esquema, ou marosca” usada por quem faz a referenciação dos utentes com úlceras de pressão para estas unidades.
“A legislação diz que paga úlceras de pressão para as Unidades de Longa Duração, logo, manda-se para a de Média Duração para não se pagar o correspondente valor e as unidades que tratem os doentes de forma gratuita”, afirmou.
A isto – sublinhou – junta-se o facto de estas pessoas, que ficam em unidades de média duração, mas muitas das quais deveriam estar em longa duração, pois não têm possibilidade de recuperação, ocuparem lugares que seriam necessários para quem, por exemplo, tiver um Acidente Vascular Cerebral (AVC).
“Se uma pessoa tiver um AVC e precisar de uma vaga em cuidados continuados para recuperação, corre o risco ficar numa cama, dependente, porque não consegue entrar numa unidade de média duração pois alguém sem potencial de recuperação, que devia estar numa unidade de longa duração, está a ocupar o lugar”, explicou.
Sobre os aumentos da comparticipação do Estado definidos no ano passado, disse serem insuficientes porque “a rede já estava subfinanciada” e sublinhou a “inflação brutal” que as unidades tiveram de enfrentar, com aumentos de 500% nas contas do gás e de 200% na energia.
“Houve apoios para as empresas, mas nós ficámos de fora” lamentou.
O responsável referiu-se ainda ao período da pandemia, sublinhando que o Orçamento do Estado não previu qualquer reforço em dois anos para os cuidados continuados.
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