Em declarações aos jornalistas em frente ao edifício da Direção Jurídica da Marinha, em Lisboa, Paulo Graça, um dos advogados dos militares que se recusaram a embarcar no navio Mondego, considerou que as acusações hoje conhecidas, decorrentes de processos disciplinares, “correspondem genericamente à tese que a Marinha tem estado a propalar nos últimos tempos”.

“Genericamente, aquilo que se imputa a estes senhores é a desobediência a uma ordem, é isso que está em causa. Não é uma situação de insubordinação, pelo menos não me apercebi que assim fosse, que lá estivesse escrito”, salientou, acrescentando que essa acusação é comum aos 13 militares.

Paulo Graça frisou que, apesar de ainda não ter lido a acusação “com detalhe”, a Marinha acusa também os 13 militares de terem “feito sair determinado de tipo de informação para uma associação militar”.

Questionado se, perante a acusação de desobediência, os 13 militares podem incorrer em pena de prisão, Paulo Graça respondeu que “tanto [pode estar em cima da mesa] a prisão, como pode estar uma mera admoestação”.

“A questão é que [a acusação] não diz, relativamente a qualquer um deles, qual é que é a sanção que se tem em vista, e isso é importante sob o ponto de vista constitucional, porque o direito à audiência e defesa supõe que o arguido saiba qual é a sanção que previsivelmente se lhe quer aplicar”, sustentou.

Paulo Graça considerou que, numa acusação, não se pode dizer que se vai aplicar, “de A a Z, qualquer uma das sanções [previstas no Regimento Disciplinar Militar], porque isso é a mesma coisa que não dizer nada”, acrescentando que esse será “obviamente” um dos argumentos da defesa, que pode contestar a acusação no prazo de 10 dias úteis.

Para o advogado, a acusação da Marinha “está eivada de profundas omissões e que são omissões importantes”, designadamente o que “se passou antes com o navio Mondego”, qual foi “o papel do comandante, que vai ser escalpelizado até ao fim” e qual era o estado em que se encontrava o navio.

Garcia Pereira, que também representa os 13 marinheiros, indicou que, “do ponto de vista da acusação, são completamente ignoradas as intervenções que foram feitas” no Navio da República Portuguesa (NRP) Mondego após os militares se terem recusado a embarcar, “sem nenhuma espécie de fiscalização ou sindicância exterior”.

“O que a Marinha afirma que era o estado do navio, é o que Marinha afirma que era o estado do navio. Houve intervenções no navio logo a seguir aos factos e nos dias subsequentes e, consequentemente, obviamente que a defesa põe em causa qualquer relatório”, referiu.

O advogado convidou também os jornalistas a fazerem contas e “verificarem que tipo de acompanhamento poderia ser feito relativamente a uma embarcação [navio russo] que está a 10 milhas a norte de Porto Santo e se desloca a 14, 15 milhas por hora, e uma embarcação [NRP Mondego] que está no Funchal e que não fazia mais de sete nós, que levaria cerca de três horas a ultrapassar a Ponta de São Lourenço”.

Questionado se teme que as palavras da ministra da Defesa - que, na quarta-feira, disse que “as ordens não são negociáveis” - possa ter impacto neste processo, Garcia Pereira respondeu que, “se a senhora ministra se está a reportar a processos disciplinares, eles são secretos até ao dia de hoje”.

“Portanto, se as referências, quaisquer que elas sejam, direta ou indiretamente se reportam ao processo, isso significa uma violação do processo disciplinar, coisa que também não surpreende a defesa desde o primeiro momento”, acrescentou.

O advogado sublinhou ainda que os 13 militares - só 12 é que conheceram hoje as acusações, por haver um que se encontra na Madeira - “estão a exercer normalmente as suas funções, colocado cada um nos diversos serviços”, encontrando-se no continente, em terra.

“Se alguma coisa [estes três meses] demonstram é que estes homens continuaram a servir a Marinha com o mesmo aprumo, dedicação e competência”, disse.

Em 11 de março, o NRP (Navio da República Portuguesa) Mondego falhou uma missão de acompanhamento de um navio russo a norte da ilha de Porto Santo, no arquipélago da Madeira, após 13 militares (quatro sargentos e nove praças) se terem recusado a embarcar alegando razões de segurança.

A Marinha participou o sucedido à Polícia Judiciária Militar (PJM), em Lisboa, no âmbito de inquérito criminal, tendo também instaurado processos disciplinares.

(Notícia atualizada às 12h51)