“Os militares não trabalham debaixo da mesa. Isso, normalmente, é muito usual noutros setores da nossa atividade nacional, aos quais não me quero estar a referir agora. Os militares fazem tudo às claras. Eu, pelo menos, fui assim educado”, afirmou, em declarações à agência Lusa.

Antes, o responsável governamental, Gomes Cravinho, tinha afirmado à Lusa que não se intimidava com “manobras escusas” para “perpetuar a influência” nas FA de “agremiações de antigos chefes militares”, numa clara alusão ao GREI (Grupo de Reflexão Estratégica Independente).

Esta associação congrega ex-chefes militares e oficiais na reserva ou reforma e, além de posições públicas de vários membros, reuniu com os vários grupos parlamentares para criticar as alterações legislativas defendidas pelo Governo para o setor.

Os antigos responsáveis militares condenam o “desaparecimento da maior parte dos graus intermédios de comando e de direção”, sublinhando que será uma “fonte de permanente atrito entre os patamares de Ministro da Defesa Nacional (MDN), CEMGFA e do Conceito Estratégico Militar (CEM)”.

“Não faço parte do GREI, tenho lá bons amigos, mas estou à vontade”, fez questão de esclarecer Luís Araújo, depreciando “o nível” das declarações do atual responsável da tutela face a “grupos de almirantes e generais que deram tudo o que tinham e que não tinham, apelidando-os de agremiações”.

Para o membro do governo minoritário do PS, “existe, claramente, um conjunto de manobras escusas por parte de uma agremiação de antigos chefes militares para tentarem perpetuar a influência que tinham em relação às FA, mas, em democracia, não é assim que as coisas funcionam”.

“No meu entendimento, este não é o tempo certo nem a terminologia adequada — terminologia utilizada pelo senhor ministro -, que só serve para acicatar clivagens em assuntos tão sensíveis, estruturantes e institucionais, que dizem respeito às FA e ao nosso país”, continuou Luís Araújo.

O também antigo Chefe do Estado-Maior da Força Aérea (2006-11) foi CEMGFA entre 2011 e 2014, o período da intervenção externa da ‘troika’ em Portugal, durante o Governo PSD-CDS-PP, dirigido por Passos Coelho e Paulo Portas.

“Até há uma expressão: ‘clarinho, clarinho, para militar perceber’. É bom que o senhor ministro a conheça. Neste caso, eu digo: ‘para político perceber’…”, vincou o ex-CEMGFA.

As propostas do executivo liderado por António Costa para alterar a Lei de Defesa Nacional e a Lei Orgânica de Organização das FA (LOBOFA) vão ser apreciadas, num primeiro momento, esta terça-feira, na comissão parlamentar de Defesa Nacional, seguindo-se o debate alargado em sessão plenária na semana seguinte.

O executivo, na senda de tentativas similares por parte de outros Governos, em 2009 (PS) e 2014 (PSD/CDS-PP), pretende concentrar mais poderes e competências na figura do CEMGFA, em termos de comando operacional conjunto dos três ramos (Marinha, Exército e Força Aérea).

“O senhor ministro devia preocupar-se muito mais com o estado do Arsenal do Alfeite [Marinha] e a prontidão da esquadra [frota] — só está uma fragata a navegar — e a modernização dos [aviões pesados de transporte] C-130, que está atrasadíssima na OGMA (Alverca) e dos [helicópteros] EH-101, em termos de fluxo logístico”, disse Araújo.

Os militares do GREI, que não Luís Araújo, reformados ou na reserva, estão numa situação de maior liberdade de expressão, em termos de deveres e obrigações, do que os chefes militares no ativo.

O antigo Presidente da República, inerentemente Comandante Supremo das FA, segundo a Constituição, o general Ramalho Eanes, também já condenou às mexidas legislativas em causa.

Além de CEMGFA e CEMFA, a carreira militar do general piloto-aviador Luís Araújo passou pela Guerra Colonial, com cerca de mil horas de voo em helicópteros Alouette III.

Já em plena democracia, entre 1988 e 1994, o general “de quatro estrelas douradas” aprofundou formação e funções na Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), destacado nos EUA.

Em março de 1996, passou a desempenhar as funções de assessor militar no Palácio de Belém, com a tomada de posse do socialista Jorge Sampaio como chefe de Estado.

Em junho de 1998, durante a crise político-militar da Guiné-Bissau, comandou a “Força Conjunta de Proteção e Recolha de Cidadãos Nacionais”.

Luís Araújo recebeu a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo, Grã-Cruz da Ordem Militar de Avis, Cavaleiro da Ordem Militar de Avis, medalha de ouro de Valor Militar coletiva, Cruz de Guerra de 2ª Classe e quatro medalhas de ouro de Serviços Distintos.

E também duas medalhas de ouro de Serviços Distintos coletivas, duas medalhas de prata de Serviços Distintos, medalhas de Mérito Militar de 1ª e 2.ª Classes, medalhas de Mérito Aeronáutico de 1ª e 2.ª Classes, medalha de Cruz Naval de 2ª Classe, Medalha de D. Afonso Henriques de 1.ª Classe, medalhas de Ouro e Prata de Comportamento Exemplar e a Medalha Comemorativa das Campanhas.