Sob o olhar atento de militares moçambicanos e ruandeses que vigiam as ruas fortemente armados, a azáfama típica do centro da vila volta a ganhar forma.

Alguns empreiteiros já anunciaram o regresso a Afungi, local das obras, em meados deste ano, mas aguardam-se ordens da petrolífera francesa TotalEnergies.

Entretanto, a população queixa-se de falta de oportunidades para beneficiar do maior investimento privado de África (20 mil milhões de euros).

“A juventude de Palma espera muitas coisas” destes projetos de gás, mas “estas pessoas não estão preocupadas em ouvir a juventude”, disse à Lusa Abu Saíde, 41 anos, a poucos metros da sua pequena loja de venda de tecidos na principal rua da vila.

São quase 16:00 (menos duas horas em Lisboa), a mesma hora a que, no dia 24 março de 2021, soaram os disparos de rebeldes naquela rua.

O número de mortes nunca foi confirmado pelas autoridades e milhares de pessoas foram obrigadas a fugir, tanto residentes como expatriados ligados aos projetos.

Hoje, há segurança e isso devolve alguma esperança para quem, como Abu, depende do comércio informal para sobreviver.

“Infelizmente, a maior parte das pessoas que estão a beneficiar dos empregos não são de Palma. São pessoas de longe. Mas agradecemos”, porque agora há segurança, frisa António Likampuma, outro comerciante informal de Palma.

O desemprego e a falta de oportunidades – nomeadamente nos investimentos emergentes ligados ao gás – têm sido apontados por diversos observadores como algumas das causas de recrutamento de jovens para as fileiras dos rebeldes no norte de Moçambique.

Nos últimos tempos, várias entidades têm estado a anunciar projetos que visam criar oportunidades para a juventude da região, incluindo a TotalEnergies e o Governo, que criou a Agência de Desenvolvimento do Norte (ADIN) para a operacionalização de projetos de desenvolvimento.

“Está difícil para nós”, reitera Nordino Nassene, 42 anos, um mecânico que decidiu abrir uma pequena oficina para reparar motocicletas.

“Pelo menos agora, em Palma, a situação é segura, apesar de ser complicado viajar para alguns destinos a partir daqui”, frisou, numa alusão aos ataques que continuam fora a área segura que as tropas montaram em redor dos projetos de gás.

A relativa calma abriu espaço para a reabertura de várias empresas, incluindo o hotel Amarula, onde 200 pessoas se refugiaram durante o ataque rebelde de março de 2021.

“Hoje Palma está calma e segura. Na altura, daqui ouvíamos disparos”, descreve Lucílio Marcos, 36 anos, técnico de frio no empreendimento e que perdeu um amigo, atingido por uma bala.

“Era um vizinho de quarto, éramos amigos e às vezes sonho com ele”, acrescenta.

“Às vezes quando estou a dormir e há algum barulho, fico assustado”, com memórias do ataque: “há noites em que sonho, salto, grito, mas depois vejo que estou no hotel”, relata Lucílio à Lusa.

Agora a segurança voltou, por oposição a uma época em que não se sabia quem era insurgente ou não, recorda.

“Ainda ouvimos barulho, mas é longe daqui”, numa alusão aos ataques de insurgentes que continuam noutros distritos da província.

Em Palma, há segurança, “até mais do que antes dos ataques” e é a isso que quem lá vive se agarra.

A província de Cabo Delgado enfrenta há cinco anos uma insurgência armada com alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.

A insurgência levou a uma resposta militar desde julho de 2021 com apoio do Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), libertando distritos junto aos projetos de gás, mas surgiram novas vagas de ataques a sul da região e na vizinha província de Nampula.

O conflito já fez um milhão de deslocados, de acordo com o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), e cerca de 4.000 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED.

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