Mostrando-se perplexo com a decisão de não abertura do processo de classificação daquele local como património de interesse municipal, aquele grupo de cidadãos questiona a decisão do Departamento Municipal de Gestão Cultural da Câmara Municipal do Porto (DMGC) que, em 21 de dezembro, emitiu um ofício "lacónico" informando da decisão.

"O DMGC emitiu um ofício o mais lacónico possível, limitando-se a comunicar a sua decisão, sem a fundamentar e sem indicar em concreto que critérios estipulados na lei não eram cumpridos. Ora, não é aceitável que seja comunicada uma decisão em termos tais que se assemelha a uma decisão arbitrária, apesar de invocar a legislação em vigor", assinala o movimento num comunicado.

O grupo informal recorda igualmente que a legislação citada pelos serviços municipais estipula que para se proceder à classificação de um bem imóvel basta que este cumpra um dos nove critérios indicados em diploma, sendo que, no entender do Movimento, suportado pelo parecer da Associação Portuguesa para o Património Industrial, a antiga estação ferroviária cumpre pelo menos cinco desses critérios.

Entre eles o valor técnico do bem; a conceção arquitetónica do bem; a extensão do bem e o que nela se reflete do ponto de vista da memória coletiva; e a importância do bem do ponto de vista da investigação histórica ou científica.

Para o movimento, o imóvel em questão cumpre ainda o critério das circunstâncias suscetíveis de acarretarem diminuição ou perda da perenidade ou da integridade do bem, neste caso decorrente do avanço do projeto imobiliário previsto para o local e que acarretará a destruição da estação e do incêndio que deflagrou, no dia 11 de dezembro, provocando danos importantes.

Na sequência do incêndio, o Ministério Público instaurou um inquérito para apurar se houve mão criminosa.

Acresce ainda que a estação tem interesse cultural relevante em termos de memória, antiguidade, autenticidade, originalidade, raridade, singularidade ou exemplaridade em pelo menos cinco dos dez domínios enunciados na legislação que suporta a decisão do município.

O Movimento recorda que a estação ferroviária do Porto Boavista foi a primeira estação operacional do Porto, inaugurada em 1875, numa altura em que o caminho-de-ferro separava as cidades "modernas" e "progressivas" das demais.

Foi também a primeira aplicação bem-sucedida da tecnologia da bitola estreita que seria fulcral para estender a malha ferroviária às periferias nacionais e até às antigas colónias, tendo contribuído para a expansão urbana da cidade para ocidente em direção à Boavista.

Em mais de um século, indica o movimento, recebeu e expediu milhões de passageiros e toneladas de mercadorias entre o Porto, a Póvoa de Varzim, Famalicão e mais tarde Guimarães.

"Por tudo isto, o Movimento não pode concordar com a decisão da DMGC, considerando-a inclusivamente lesiva dos interesses do património histórico do Porto, tendo por isso já entregue uma reclamação pedindo a reversão da mesma", declaram.

O grupo lamenta ainda que o pedido, submetido em junho por 62 personalidades ligadas à academia e ao património ferroviário, tenha demorado seis meses a ser respondido, quando o limite legal previsto na lei é de 60 dias úteis.

"O Movimento não pode deixar de se questionar quanto tempo mais demoraria, se não tivesse informado os meios de comunicação social que o DMGC não estava a cumprir os prazos legais", lê-se no comunicado.

O edifício da antiga estação ferroviária da Boavista sofreu entretanto

O projeto da cadeia espanhola, para a antiga estação ferroviária tem sido alvo de contestação, tendo levado, em junho, um grupo de cidadãos a pedir a classificação municipal da antiga estação ferroviária da Boavista, depois de a Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) ter arquivado o pedido nacional.

Para os terrenos da antiga estação ferroviária da Boavista, está prevista, para além de um grande armazém comercial, a instalação de um hotel e de um edifício de habitação comércio e serviços, cujo Pedido de Informação Prévia (PIP) foi aprovado em outubro.

Até ao momento, o El Corte Inglés terá pago à IP 18,7 milhões de euros.