A morte de 27 pessoas, incluindo uma mulher grávida e três crianças, num naufrágio de um barco insuflável a 24 de novembro, e uma série de tempestades nas semanas seguintes não foram suficientes para desencorajar novas tentativas.
“Não são tantas, mas assistimos a algumas esta semana”, disse Kim Bryan, uma das voluntárias, à agência Lusa.
Este grupo surgiu no ano passado, quando o número de barcos insufláveis com grupos de migrantes de países em conflito, como Síria, Afeganistão ou Iraque, começou a multiplicar-se no Canal, entre o norte de França e o sul de Inglaterra.
Voluntários revezam-se com telescópios para tentar detetar embarcações e avisar a Guarda Costeira ou o serviço de socorro a náufragos Royal National Lifeboat Institute (RNLI) para que os recolham.
Atualmente têm cerca de 30 pessoas envolvidas, incluindo “equipas de resposta rápida”, que levam cobertores térmicos e bebidas aos migrantes quando chegam às praias, porque a guarda fronteiriça Border Force “nem sempre tem equipamento ou água para pessoas que chegam com hipotermia ou sede”.
A organização espera ter um barco no próximo ano para fazer patrulhas no mar e recentemente avançou com uma ação judicial contra o Ministério do Interior para impedir o uso da tática de forçar os barcos a voltarem para trás [push-back].
“É extremamente problemático porque é muito perigoso para as pessoas naquela situação”, lamenta Bryan.
Recentemente, a Channel Rescue, tal com o RNLI, que atua quando existe perigo de afogamento, estiveram em risco de ver criminalizada a assistência a migrantes pela proposta de lei da Nacionalidade e Fronteiras, que penaliza a assistência às travessias ilegais.
Uma emenda clarificou a situação e agora as organizações com fins humanitários podem continuar a operar sem risco de serem levadas a tribunal, mas a intervenção nem sempre é bem vista.
O RNLI tem sido alvo de insultos e protestos e alguns residentes locais já tentaram impedir barcos de saírem do porto.
O político eurocético Nigel Farage apelidou as operações de salvamento de “serviço de táxi aos migrantes”, mas os responsáveis do RNLI respondem que não cabe aos socorristas fazer controlo das fronteiras nem julgar quem precisa de ajuda.
Bridget Chapman, da organização Kent Refugee Action Network (KRAN), admite existir uma “minoria significativa de pessoas que se opõe completamente à imigração de qualquer tipo, mas que se faz ouvir nos comentários dos jornais”.
Porém, assegurou à Lusa, essa não é a realidade, porque a KRAN envolve um “exército” de voluntários locais, tantos que, às vezes, como quando os talibãs passaram a controlar o Afeganistão, entopem os telefones e caixas de ‘email’ e redes sociais com ofertas de ajuda.
A organização auxilia sobretudo menores requerentes de asilo a integrarem-se na comunidade depois de saírem dos centros de acolhimento, onde ficam cerca de dois meses.
Enquanto as crianças ficam a cargo dos serviços sociais, adolescentes a partir dos 16 anos podem ser colocados em habitações próprias sem a responsabilidade de um adulto.
“É um grande desafio quando só têm 16 anos e precisam de comprar e fazer a própria comida, limpar, lavar a roupa, certificar-se que acordam à hora certa para ir para a escola”, salienta.
A ajuda inclui desde apoio nos trabalhos de casa a cursos de língua inglesa, cozinha e de gestão do dinheiro para despesas ou informações sobre quais as embalagens que devem ser recicladas ou sobre a cultura britânica em geral.
“Eles teriam preferido ficar em casa com as famílias se tivessem escolha, nunca teriam saído, mas foram forçados por causa de conflitos, violência e repressão (…) Não podemos substituir a família, mas tentamos ser o mais próximo possível de uma família”, afirma.
Ao contrário de muitos adolescentes britânicos, Bridget Chapman, antiga professora, vê nos jovens refugiados uma grande dedicação aos estudos, a empregos, quando recebem autorização de residência, e à entreajuda.
“Nós precisamos mesmo deles”, defende, criticando a proposta de lei da Nacionalidade de Fronteiras, avançada pelo Governo britânico e atualmente em debate no Parlamento, a qual apelida de “lei anti-refugiados”.
Embora concorde com a ministra do Interior, Priti Patel, que o sistema de asilo atual não está a funcionar, receia que a situação fique pior devido às medidas propostas, como o reforço dos poderes da guarda fronteiriça, maior penalização para os indocumentados e possibilidade de serem transferidos para outro país.
Entre soluções de longo e curto prazo, sugere o restabelecimento da ajuda externa para permitir aos refugiados ficarem mais perto dos seus países de origem e criar formas de avaliar pedidos de asilo fora do Reino Unido, incluindo em França.
“Isso iria parar as travessias em pequenos barcos da noite para o dia e destruiria o negócio dos traficantes de pessoas, porque ninguém vai fazer uma viagem num pequeno barco através da rota de navegação mais movimentada do mundo se houver uma opção segura”, garante.
* Por Bruno Manteigas, da agência Lusa
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