De um aterro erguido à pressa para proteger a cidade de Mehar, os minaretes da mesquita e a coluna de um posto de gasolina projetam-se no enorme lago que surgiu após as enchentes no Paquistão.
Atrás desta linha de areia na região sul de Sindh, centenas de aldeias e vastas áreas agrícolas foram submersas pela água que cobriu cerca de um terço do país.
"Ninguém sabe onde está a sua casa, um homem normal não pode mais reconhecer a sua própria casa", disse à AFP Ayaz Ali, cujo vilarejo está quase sete metros debaixo d'água.
O governo da região sul de Sindh diz que mais de 100.000 pessoas foram deslocadas por este novo mar, criado pelas chuvas recordes e pelo transbordamento do rio Indo.
Motorista de autocarro, Ali atua como guia para a Marinha, identificando cada cidade submersa pela localização de postes de energia e árvores.
Voluntários da Marinha navegam em duas balsas de resgate entregando ajuda doada por moradores e transportando pessoas que precisam de atendimento médico para a cidade.
Com a ajuda de Ali, também procuram áreas altas onde ainda há famílias que se recusam a ser retiradas, apesar da situação terrível, agravada pelo calor sufocante.
"As casas e pertences são valiosos demais para eles", diz um militar. "Quando entrei para a Marinha, nunca poderia imaginar que estaria a fazer isto", acrescenta, olhando para o enorme lago que se estende à sua frente.
Com o motor desligado, o barco navega lentamente pelas copas das árvores e sob as linhas de energia na frente de um punhado de casas em ruínas.
Há dezenas de pessoas à espera. Muitos não querem sair de casa, preocupados que o gado, tudo o que resta, seja roubado ou morra, e temem que a situação seja ainda pior nos campos de emergência montados em todo o país.
"A nossa vida e morte estão ligadas ao povoado, como podemos sair?", pergunta Aseer Ali, com água até os joelhos, que insiste em não permitir que a esposa seja retirada, estando no oitavo mês de gravidez.
Algumas pessoas em estado delicado (homens com febre, bebés com diarreia e uma senhora idosa) são ajudados a embarcar.
Entre os assistidos está uma jovem mãe que na semana passada perdeu o recém-nascido nas enchentes.
Oficiais da Marinha derramam água sobre ela e o seu outro filho de dois anos, por causa do sol escaldante do meio-dia.
"Mais famílias continuam a chegar ao campo. Elas estão em condições terríveis"
Até agora, um novo aterro de 10 quilómetros impediu que a enchente chegasse a Mehar, onde vivem centenas de milhares de pessoas.
Mas a cidade está cheia de deslocados que fugiram nas últimas três semanas de campos de emergência em estacionamentos, escolas ou rodovias.
"Mais famílias continuam a chegar ao campo. Elas estão em condições terríveis", diz Muhammad Iqbal, da Fundação Alkhidmat, uma organização humanitária paquistanesa que é a única a ajudar no maior campo da cidade, onde há 400 pessoas.
"Há uma necessidade imensa de água potável e casas de banho", protesta, embora saiba que terá que esperar porque a prioridade do governo agora é drenar as áreas alagadas.
A ameaça de inundação paira sobre barragens e reservatórios em plena capacidade, levando os engenheiros a liberar água intencionalmente para salvar algumas áreas densamente povoadas mesmo com o custo de piorar a situação nas áreas rurais.
"Eles fizeram tudo para proteger a cidade, mas não os pobres das áreas rurais", diz Umaida Solangi, uma mulher de 30 anos sentada com seus filhos em uma cama de madeira em um acampamento da cidade.
Comentários