Foi o caso de Márcia Pereira, que vive na freguesia com mais casos de covid-19 nos Açores (66 até esta quarta-feira), mas que trabalha na Casa do Povo da Ribeira Grande.

“Eu preciso de ir trabalhar, já tenho aqui a declaração da entidade patronal e, por isso, acho que consigo passar”, disse à Lusa antes de se aproximar da cerca sanitária na zona de Santana.

Quando chegou à beira dos agentes da autoridade, que estão a estabelecer as fronteiras em vários acessos a Rabo de Peixe, foi-lhe permitida a passagem, mediante a apresentação da declaração.

Ao contrário do que aconteceu em abril, quando todos os concelhos de São Miguel estiveram sob cordões sanitários, não existem barreiras físicas a controlar as entradas e saídas de Rabo de Peixe, mas em todos os acessos existe uma equipa da Polícia de Segurança Pública (PSP) acompanhada por outros funcionários operacionais.

Quem também conseguiu sair de Rabo de Peixe foi a carrinha conduzida por Dionísio Medeiros, da empresa Lactaçor, que foi àquela vila piscatória abastecer os supermercados locais de queijo e leite.

“Já me deixaram entrar e agora deixaram-me sair. Isto é a nossa vida, tem de ser”, comentou.

O acesso a cuidados médicos também se inclui entre as exceções previstas, pelo que Maria (que não quis revelar o último nome) também conseguiu circular para ir a uma consulta na Ribeira Grande.

“Eu já vim precavida e trouxe o papel. Já tenho essa consulta marcada há algum tempo”, disse.

Menos sorte teve Stefano. O turista, acabado de chegar à ilha, queria ir conhecer Rabo de Peixe, mas não teve outro remédio senão voltar a Ponta Delgada.

“Cheguei agora a São Miguel e só queria ir ver a freguesia. Não sabia o que se estava a passar”, comentou o italiano, residente na Ericeira.

Eduardo Fonseca também não conseguiu sair de Rabo de Peixe, apesar de ter tentado demover os agentes da autoridade com a justificação de que apenas queria ir “uns quilómetros mais acima”, para a zona da Boavista, onde trabalha.

“Sou de Rabo de Peixe, mas trabalho aqui mais acima, na zona da Boavista. Sou mecânico de automóvel, não tenho declaração, mas não sei se vou ter sorte”, declarou à Lusa, antes de chegar perto da PSP.

Após ter sido impedido de atravessar a cerca sanitária, Eduardo Fonseca criticou a medida que isola Rabo de Peixe da restante ilha.

“Acho que a cerca é exagerada, desde que as pessoas tivessem cuidado, não era preciso nada disso. Isso cria um grande transtorno para quem trabalha. Não havia necessidade, não estamos numa situação extrema”, afirmou.

No centro da vila de Rabo de Peixe, a maior parte das pessoas encontrava-se de máscara. Muitas estavam a conversar em bancos de jardins, apesar de a circulação na via pública estar limitada a passeios higiénicos ou para passear o animal de estimação.

Vários cidadãos encontravam-se também em alguns cafés, que podem funcionar até um terço da lotação. A agência Lusa encontrou patrulhas da PSP a circular pela freguesia a alertar para o cumprimento das normas sanitárias.

Hoje, o comando regional da PSP nos Açores, informou, em comunicado de imprensa, que a cerca sanitária iria ser “concretizada através de pontos de fiscalização e controlo policial”, sendo, também, “utilizadas várias barreiras físicas que delimitam toda a área da vila de Rabo de Peixe”.

“A atuação da Polícia de Segurança Pública incidirá numa intervenção pedagógica e sensibilizadora da comunidade quanto à interdição das deslocações que não sejam justificadas”, acrescentou a PSP.

Na terça-feira, o Governo dos Açores anunciou a criação de uma cerca sanitária a Rabo de Peixe, seguida da realização de testes rápidos a todos os cerca de dez mil habitantes da freguesia.

Com a cerca sanitária – atualmente a única do país - ficam interditadas as deslocações, por via terrestre e marítima, entre Rabo de Peixe, no concelho da Ribeira Grande, e as restantes freguesias. Fica proibida a circulação e permanência de pessoas na via pública, são encerradas todas as escolas e fixa-se a limitação da lotação máxima de um terço da respetiva capacidade na restauração e nos bares.

*Por Rui Pedro Paiva (texto) e Eduardo Costa (fotos), da agência Lusa