Ao longo do seu discurso de encerramento do 23.º Congresso Nacional do PS, no Portimão Arena, no distrito de Faro, António Costa enunciou algumas das bandeiras que a sua governação irá ter ao longo do mandato legislativo, nomeadamente a juventude e a precariedade laboral, a formação profissional e o Ensino Superior, a natalidade e o combate à pobreza infantil.

O secretário-geral socialista anunciou que o Programa Regressar estender-se-á até 2023, que o IRS Jovem vai ser alargado ao trabalho independente e a um período de cinco anos e que vai ser reforçado o programa de creches com mais dez mil lugares em 2022.

 A questão da juventude e das suas condições de vida foi tema central da intervenção com que o líder socialista encerrou o 23º Congresso Nacional do PS, no Portimão Arena, particularmente o problema da “dignidade no trabalho”.

“É fundamental que as empresas compreendam que esta jovem geração, por ser mais qualificada, é – e tem o direito de ser – mais exigente nas suas condições de trabalho”, começou por acentuar o primeiro-ministro, recebendo uma salva de palmas dos congressistas socialistas.

António Costa disse então que serão apresentadas no parlamento 64 medidas da “Agenda para o trabalho digno”, das quais destacou duas: A introdução do princípio da presunção de quem trabalha para as plataformas digitais não é empresário em nome individual, mas trabalhador por conta de outrem, com direito a contrato; o Estado, municípios e freguesias, ao nível da contratação pública, só aceitam fechar acordos com empresas de limpeza, segurança ou catering se não estas não tiverem precariedade laboral.

Ao nível da concertação social, o líder socialista retomou um discurso de pressão política junto das confederações patronais e disse que os acordos em negociação sobre melhoria geral dos salários (sobretudo dos mais jovens) e conciliação da vida profissional e familiar “terão de passar à concretização”, ou seja, “à força da lei”.

Na sua intervenção, o secretário-geral prometeu depois benefícios fiscais para os jovens, começando pelo prolongamento do programa “Regressar” e pelo IRS Jovem.

“No programa Regressar, vamos prolongá-lo até 2023, assegurando que todo os jovens que voltem para Portugal terão uma tributação só sobre 50% do vencimento que auferem”, destacou.

Em relação ao IRS Jovem, de acordo com o primeiro-ministro, será assegurado o automatismo da sua aplicação.

“Vamos alargá-lo para que cubra também os rendimentos do trabalho independentemente. E vamos alargar de três para cinco anos, havendo uma isenção de 30% do rendimento nos dois primeiros anos, 20% do rendimento nos terceiro e quarto ano e 10% do rendimento no quinto ano”, especificou.

Uma medida que António Costa se manifestou convicto que apoiará “de forma eficaz a integração na vida ativa de muitos jovens portugueses”.

Na sua intervenção, já na parte final, o líder do executivo também anunciou aumento das bolsas para mestrados.

“Uma coisa são as liberdades da lei e outra coisa são as liberdades que a vida nos dá. Temos de assegurar que a vida dê a todas as famílias a liberdade de ter ou não ter os filhos que desejam ter e que nenhuma jovem família deixa de poder os filhos que quer ter por causa de qualquer tipo de constrangimento”, acrescentou.

“Iremos alargar as medidas de combate à pobreza ao longo dos próximos dois anos a todas as crianças, independentemente da sua idade. Por isso, as crianças que têm entre três e seis anos – e que atualmente, se estiverem na condição de pobreza extrema recebem 50 euros, ou 41 euros em situação de pobreza -, nos próximos dois anos, os apoios chegarão a 100 euros”, especificou o primeiro-ministro.

Em relação às crianças com mais de seis anos, o Governo vai aumentar o abono dos 27 e 31 euros “para que nenhuma tenha menos de 50 euros por mês”, acrescentou.

De acordo com António Costa, importa “olhar com muita atenção para as crianças e para essa chaga inaceitável numa sociedade decente que é a pobreza infantil, sendo fundamental assumir coletivamente um compromisso com o futuro do país”.

“Vamos mesmo erradicar a pobreza infantil no país, fenómeno que tem causas profundas e características duradouras”, sustentou, citando depois especialistas, segundo os quais a resolução da situação de pobreza infantil, por vezes, exige cinco gerações.

“Quem de nós está disposto a esperar cinco gerações para que as 130 mil crianças que estão ainda em situação de pobreza extrema possam estar numa família que atingiu o rendimento mediano? Quem está disponível para esperar várias gerações para que as crianças em risco de pobreza, cerca de 300 mil, possam libertar-se desta situação?”, questionou, antes de se referir a medidas tomadas pelo seu Governo a partir de 2015.

“Já provámos que era possível, porque desde 2015, com o reforço do abono para todas as crianças em situação extrema de pobreza, ou em risco de pobreza até aos três anos. Saíram da pobreza mais de 75 mil crianças até 2019”, disse.

Na questão da natalidade, o secretário-geral do PS considerou essencial que nenhuma família deixe de poder ter os filhos que quer ter por qualquer tipo de constrangimento económico.

“Vamos apostar no desenvolvimento do programa de creches, abrindo no próximo ano mais 10 mil lugares de creches”, começou por assinalar, quando começou a abordar o capítulo das políticas de incentivo à natalidade.

Segundo António Costa, o seu executivo tinha introduzido uma majoração fiscal na dedução fiscal para todas as famílias a partir do segundo filho, mas que apenas se aplicava às crianças entre os zero e os três anos – e que permitiu uma dedução de 900 euros a partir da segunda criança.

“Agora, vai deixar de ser só para as crianças dos zero aos três e aplica-se também até aos seis anos essa mesma dedução de 900 euros por ano – isto, para todas as famílias independentemente do seu rendimento”, destacou.

No entanto, a seguir, o primeiro-ministro referiu-se à situação das famílias que não têm rendimentos suficientes para descontar para o IRS.

“Para essas famílias, o Estado garante que nenhuma terá menos de 600 euros a partir do segundo filho”, salientou o secretário-geral do PS.

Neste contexto, apresentou uma explicação sobre os critérios em termos de política tributária.

“Ao contrário do que outros fizeram, esta medida não pode ter um efeito regressivo do ponto de vista fiscal”, acrescentou.

O recado a Marcelo

Antes de descrever estas medidas, porém, Costa deixou uma mensagem a Marcelo Rebelo de Sousa, dirigindo-se a Rita Magalhães Collaço, secretária do Conselho de Estado, cuja presença tinha sido saudada com palmas momentos antes, quando foi anunciada aos delegados socialistas.

"Pedia à doutora Rita Magalhães Collaço que transmitisse a sua excelência o senhor Presidente da República os votos que fazemos dos maiores sucessos no exercício deste novo mandato presidencial, desejando-lhe que mantenha as características que os portugueses tanto apreciaram no seu primeiro mandato e que de uma forma tão expressiva votaram na renovação para o novo mandato do Presidente da República. As maiores felicidades no exercício do novo mandato", declarou o secretário-geral do PS.

Em seguida, António Costa dirigiu-se ao vice-presidente da Assembleia da República e deputado do PCP António Filipe, para "saudar o órgão de soberania perante quem o Governo responde e de quem o Governo depende".

O secretário-geral do PS referiu que "ao longo destes seis anos, o PS tem tido a honra de chefiar um Governo que tem mantido um intenso debate e uma intensa relação com a Assembleia da República" e que, "naturalmente, não havendo maioria, tem sido possível desenvolver um diálogo profícuo com os diferentes partidos políticos e um diálogo institucional entre Governo e Assembleia".

"Creio que todos devemos estar orgulhosos depois de ano e meio em que vivemos períodos tão exigentes, tão difíceis, com sucessivos estados de emergência, pela forma tão cooperante, harmoniosa, responsável como Presidência da República, Governo, Assembleia da República, todos cooperaram para enfrentarmos esta pandemia em nome de Portugal e para bem dos portugueses", considerou.

O líder dos socialistas e primeiro-ministro dirigiu-se depois aos representantes de partidos políticos presentes no encerramento deste Congresso – PSD, Bloco de Esquerda, PCP, CDS-PP, PAN e o PEV, à distância – dividindo-os entre parceiros de "uma caminhada, umas vezes mais conjunta, outras vezes menos conjunta" e "aqueles a quem cabe ser oposição e construir a alternativa à alternativa de esquerda" liderada pelo PS.

Perante Vasco Cardoso, dirigente do PCP, e Jorge Costa, do Bloco de Esquerda, António Costa acrescentou: "É com gosto particular que vejo aqui presentes dois dos interlocutores mais exigentes, mas também mais produtivos com quem temos construído estes bons resultados para o país e para os portugueses. A todas e a todos as maiores felicidades da parte do PS".

Por fim, o secretário-geral do PS assinalou a presença dos representantes das duas centrais sindicais, CGTP-IN e UGT, e de confederações patronais, e defendeu "o diálogo social, a negociação coletiva, a concertação social" como "peças essenciais" da democracia.

Segundo o primeiro-ministro, num momento "de saída desta pandemia, de saída desta crise, de aproveitar as oportunidades extraordinárias de que o país dispõe para se transformar estruturalmente e resolver muitos dos problemas estruturais do nosso país, é cada vez mais necessário maior dialogo social, maior negociação coletiva e muita concertação social".

"Podem contar connosco. Estamos certos de que podemos também contar convosco", disse-lhes.

Costa destaca papel das autarquias nos fundos europeus e pede maioria em cada região

Prosseguindo o seu discurso, António Costa assinalou que "em várias das áreas mais importantes onde há recursos mobilizados no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ou no quadro financeiro plurianual são mesmo os municípios que terão um papel central na sua execução".

O secretário-geral do PS e primeiro-ministro realçou, por outro lado, que "as autarquias passaram a ter um papel decisivo na estratégia de desenvolvimento económico e social de cada região", com a mudança legislativa que introduziu a eleição indireta dos presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), que apontou como "um passo muito importante" para se poder "testar as vantagens da regionalização".

António Costa referiu que "as direções das CCDR passaram a responder aos autarcas dessas regiões" e que "o primeiro grande desafio que têm pela frente é já a elaboração dos planos operacionais regionais para a próxima geração de fundos comunitários, que está já aí e que têm de estar aprovados até ao final do ano".

"E para que isso aconteça, para que as opções sejam certas, para que também ao nível regional vamos por caminho certo, é fundamental que em cada região a maioria dos autarcas sejam autarcas do PS, autarcas que estão comprometidos com o caminho certo que tem gerado boas políticas e bons resultados para o desenvolvimento económico e social do nosso país", defendeu, em seguida.

Dirigindo-se aos delegados socialistas, António Costa encerrou esta parte do seu discurso dedicada às eleições autárquicas de 26 de setembro apelando a uma mobilização "para uma grande vitória".

"Pela descentralização, pelo papel central que vão ter na execução do PRR, pelo poder que passaram a ter ao nível regional, as autarquias são mesmo parceiros essenciais para cumprirmos aquele que é o lema do nosso congresso: garantir o futuro", afirmou.

No quadro do PRR, o secretário-geral do PS apontou a ação social como uma área em que deve haver "uma relação devidamente articulada" com as instituições particulares sobretudo "ao nível local, através das autarquias".

António Costa argumentou que "são as autarquias que, pela sua proximidade, melhor conhecem os parceiros e melhor conhecem as prioridades do investimento que é necessário fazer" e acrescentou: "Temos meios para investir, vamos investir bem, porque ninguém nos perdoará se desperdiçarmos um cêntimo que seja do dinheiro que temos disponível para poder investir".

Ainda sobre o PRR apresentado pelo Governo, o primeiro-ministro considerou que a política de habitação é "absolutamente fundamental para responder quer às necessidades da classe média quer para acabar com essa chaga que é haver mais de 26 mil famílias que continuam a viver em Portugal sem condições dignas de habitação".

"E agora temos não só as políticas, mas também os recursos para cumprir o nosso compromisso de até aos 50 anos do 25 de Abril [em 2024] assegurar a todas essas famílias habitação condigna", declarou, recebendo palmas.

António Costa salientou também a aposta em "mais e melhores transportes públicos, mais mobilidade ciclável, mobilidade sustentável" como meio para enfrentar "o desafio das alterações climáticas", defendendo que isso só pode ser feito "através e com as autarquias".

"A descentralização de competências que fizemos para a Área Metropolitana de Lisboa, para a Área Metropolitana do Porto, bem provaram o sucesso dessa medida de descentralização. É esse o caminho que devemos seguir e é isso que devemos continuar a fazer", disse.

O partido está “com paz de espírito e mobilizado”

Na parte final do discurso, o líder socialista referiu-se de forma breve ao atual estado do seu partido, dizendo que, "para irritação de muitos, não tem problemas internos”.

“Por isso, podemos dedicar-nos àquilo que importa, que são os problemas do país, os problemas dos portugueses e das portuguesas, porque é para isso que servem os partidos políticos: Para ajudar, para se mobilizarem, para terem programas e ideias”, recebendo uma salva de palmas dos congressistas.

O secretário-geral do PS considerou depois que o seu partido sai do Congresso de Portimão “com paz de espírito, mobilizado e com energia”.

“Com energia não para tratar dos nossos próprios problemas, mas para ajudar Portugal a vencer os problemas que tem. Para acabar de vez com esta pandemia, para avançar mesmo com a recuperação económica e para que não se desperdice a oportunidade de uma transformação estrutural”, acrescentou.

Costa iniciou o seu discurso depois de ser aprovada a lista que propôs à Comissão Nacional, órgão máximo entre congressos, por 92,45% dos votos.