Omir Bekali, de 42 anos, diz ter passado várias semanas no outono de 2017 num destes campos em Karamay, em Xinjiang, no oeste da China, onde vivem várias minorias muçulmanas, entre eles os uigures e os cazaques.

Nesta região, sob uma forte vigilância policial, estariam detidos até um milhão de muçulmanos dentro destes centros de "reeducação política", segundo especialistas e organizações de defesa dos direitos humanos.

Pequim desmente estas acusações e afirma que se tratam de "centros de formação profissional" contra a "radicalização" islamita. Uma espécie de "campus", declarou na semana passada o vice-ministro chinês das Relações Exteriores, Le Yucheng.

Deste "campus", Bekali saiu traumatizado. Ele é um dos poucos sobreviventes que, através de conferências no estrangeiro, quer divulgar a sua passagem por este local. A maioria prefere manter-se em silêncio, por medo de colocar em risco as suas famílias na China.

Bekali descreve um dia a dia baseado em humilhações, todas com um mesmo objetivo: extirpar dos internos a mínima presença de crença religiosa.

"Todas as manhãs, de 7h a 7h30, tínhamos que cantar o hino nacional chinês. Cantávamos juntos, 40 ou 50 pessoas, em frente a um muro", explica, enquanto revive a cena na sala de seu modesto apartamento, num bairro popular de Istambul.

créditos: Yasin AKGUL / AFP

"Não queria cantar. Mas à força de repeti-lo diariamente, entrou. Faz mais de um ano que saí de lá, mas a música continua a ressoar na minha cabeça", insiste.

Barba e orações proibidas

Nascido em Xinjiang, de pais uigur e cazaque, duas das principais etnias muçulmanas que vivem na zona, Bekali emigrou para o Cazaquistão em 2006 para procurar trabalho, como grande parte dos cazaques nascidos na China, e obteve a nacionalidade deste país.

Os problemas começaram em 23 de março de 2017, quando foi detido em Xinjiang durante uma viagem de trabalho para a sua agência de turismo cazaque.

Após passar sete meses na prisão por acusações de ajuda ao "terrorismo", foi enviado para um campo de "reeducação". "Havia professores, artistas, idosos. Eram terroristas?", questiona.

Uma das obrigações que os internos tinham que cumprir era comer porco às sextas-feiras, dia santo para os muçulmanos, segundo Bekali.

Estes "estudantes" também eram proibidos de falar em outro idioma que não fosse o chinês, assim como rezar ou deixar a barba crescer. As autoridades consideravam que estes eram sinais de "radicalização".

Se pôde sair em novembro de 2017 foi, segundo ele, graças à intervenção das autoridades do Cazaquistão.

Hoje em dia, Bekali não tem notícias dos seus pais nem dos seus irmãos.

Após ser libertado, saiu do Cazaquistão para se instalar na Turquia com a sua mulher e os seus filhos.

*Por Gokan Gunes/AFP

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