"No essencial está tudo esclarecido", declarou Paulo Sá e Cunha no final da inquirição de Sofia Fava no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), que durou cerca de três horas e meia, incluindo o intervalo.

Questionado sobre se a questão da sinalização da compra de um monte alentejano por Sofia Fava com dinheiro emprestado pelo empresário Carlos Santos Silva, amigo de longa data do antigo primeiro-ministro José Sócrates, tinha dominado a sessão, Paulo Sá e Cunha contrapôs que o assunto do monte no Alentejo "está esclarecido há muito tempo", ou seja, desta a "fase anterior do processo (inquérito)".

Apesar de dizer que a arguida Sofia Fava prestou os esclarecimentos na linha do que tem sido a estratégia da defesa e o requerimento de abertura de instrução (RAI), o advogado vincou que há factos ocorridos há sete, oito e nove anos em que "não é possível" à sua constituinte recordar "tim-tim por tim-tim".

"Fizemos o que nos propúnhamos fazer (...) vamos continuar o trabalho" foram algumas das frases deixadas por Paulo Sá e Cunha aos jornalistas, adiantando que, embora seja impossível antever o que irá acontecer durante uma instrução "tão demorada", não tenciona à partida pedir que Sofia Fava volte a ser inquirida pelo juiz Ivo Rosa.

Paulo Sá e Cunha referiu que na terça-feira serão ouvidas testemunhas arroladas pela defesa, as quais ajudarão o tribunal a perceber a questão da compra do monte no Alentejo.

Na fase inicial do processo, Sofia Fava disse nada saber sobre os alegados estratagemas do ex-primeiro-ministro e do amigo deste, Carlos Santos Silva, para ocultar vantagens financeiras obtidas de forma ilegal.

Admitiu, porém, que o empresário Carlos Santos Silva lhe emprestou 150 mil euros par sinalizar a compra de um monte no Alentejo e que a contratou para trabalhar numa das suas empresas, pagando-lhe uma remuneração elevada.

Alegou ter a ideia de que o empresário Carlos Santos Silva era uma pessoa abastada, que vivia desafogadamente do ponto de vista financeiro.

Sofia Fava, que responde por um crime de branqueamento de capitais e por outro de falsificação de documentos em coautoria com Sócrates e o empresário Carlos Santos Silva, pediu já ao juiz Ivo Rosa que fosse apreciada a nulidade da acusação, alegando "falta de fundamentação e ininteligibilidade".

A declaração de nulidade da acusação é, aliás, a opção que Paulo Sá e Cunha coloca em primeiro plano na defesa da sua constituinte, sendo as hipóteses alternativas a não ida a julgamento (não pronúncia) de Sofia Fava ou a suspensão provisória do processo relativamente à ex-mulher de José Sócrates.

Os restantes advogados presentes na sessão, incluindo Pedro Delille (advogado de Sócrates) e Paula Lourenço (advogada de Carlos Santos Silva) abandonaram o tribunal sem prestar quaisquer declarações à comunicação social.

O inquérito Operação Marquês, que teve início há mais de cinco anos, culminou na acusação a 28 arguidos, 19 pessoas e nove empresas, e investigou a alegada prática de quase duas centenas de crimes de natureza económico-financeira.

José Sócrates foi acusado de três crimes de corrupção passiva de titular de cargo político, 16 de branqueamento de capitais, nove de falsificação de documentos e três de fraude fiscal qualificada.

Entre outras imputações, o Ministério Público está convencido que Sócrates recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no Grupo Espírito Santos e na PT, bem como para garantir a concessão de financiamento da Caixa Geral de Depósitos ao empreendimento de luxo Vale do Lobo, no Algarve, e por favorecer negócios do Grupo Lena.

Entre os 28 arguidos estão Carlos Santos Silva, Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Armando Vara, Bárbara Vara, Joaquim Barroca, Helder Bataglia, Rui Mão de Ferro e Gonçalo Ferreira, empresas do grupo Lena (Lena SGPS, LEC SGPS e LEC SA) e a sociedade Vale do Lobo Resorts Turísticos de Luxo.