É a primeira vez que uma cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Verão se realiza fora de um estádio. A 26 de julho, Paris2024 apresentará um desfile inédito e tão audaz quanto desafiante.

Em plena rua, ao trocar o tartan das pistas de atletismo pelas águas do Rio Sena, as comitivas, submersas pela presença do público nas margens do rio que corta a cidade parisiense, e, acima de tudo, a organização, ficam expostas a um gigantesco desafio à segurança. Em especial face aos riscos inerentes ao atual contexto geopolítico, que trazem à memória Munique 1972.

A cerimónia, um passeio pelo Sena, está envolta no mais secreto dos segredos.

O percurso, de Leste para Oeste, ao longo de seis quilómetros e mais de três horas, leva os atletas da Ponte Austerlitz, ao lado do Jardin des Plantes, à Ponte Léna e termina no Trocadéro, na margem oposta à Torre Eiffel.

 Ao todo, passam por debaixo de 16 pontes. Estas prometem dançar. “Não haverá uma simples ponte sem um dançarino”, disse Maud Le Pladec, coreógrafa que comanda 400 bailarinos, misturados com 3000 artistas num espetáculo que se desconhece.

Um postal ilustrado de Paris e de França

A versão olímpica do sightseeing, passeio romântico e de Paz pelo Sena terá, à esquerda e à direita, vista privilegiada por alguns dos mais emblemáticos bilhetes-postais da capital gaulesa e de França. Alguns, testemunham as lutas pelas medalhas.

O SAPO24 percorreu o Rio Sena a bordo de uma embarcação com bandeira Eurosport /Max, canal detentor dos direitos televisivos que irá transmitir 3.800 horas e os 329 eventos para medalha, dos 32 desportos olímpicos.

Começou do lado oposto do rio onde tudo culminará. Torneou as duas ilhas no centro da cidade (Île Saint Louis e a Île de la Cité) e fez o trajeto – ida e volta - em sentido inverso ao que os atletas e comitivas irão fazer.

Partiu da famosa torre de ferro forjado idealizada pelo engenheiro que lhe deu nome. E à Torre Eiffel, símbolo de Paris e de França, regressou. O Voleibol de Praia aparece no local de uma das selfies mais desejadas.

A seus pés, a arena dos jardins do Champ de Mar, batizado em homenagem a Marte, Deus da Guerra, palco de paradas e manobras militares, assiste-se ao Judo e à Luta.

 Na margem oposta, a Praça de Trocadéro, construída para a Exposição Universal de 1878, será palco das cerimónias oficiais, o içar das bandeiras, juramentos e a tão esperada chegada da Chama Olímpica. Ali terminará o percurso da cerimónia de abertura, mas não termina a ação. Recebe o Ciclismo de Estrada e a Marcha.

Na Ponte Alexandre III, monumento histórico inaugurado em 1900 na Exposição Universal e símbolo da amizade franco-russa, assenta o Triatlo, Desportos Aquáticos (Maratona) e a chegada do Ciclismo de Estrada (contrarrelógio).

Do outro lado da margem, na Esplanada do Les Invalides, Palácio onde Napoleão Bonaparte descansa para a eternidade, escuta-se o Tiro com Arco, assiste-se à partida do contrarrelógio no Ciclismo e à chegada da prova de todas as provas, a Maratona.

Em frente, no Grand Palais, sítio de exaltação das artes da 3.ª República francesa, exibe-se a Esgrima e o Taekwondo.

Ao lado, na Place de la Concorde, no chão onde se ergue o Obelisco de Luxor, monumento da antiguidade egípcia, refugiam-se atuais tendências desportivas: Basquetebol 3x3, dança-se ao ritmo do Breaking, novidade olímpica que conta com a portuguesa Vanessa Marina, voa-se nas manobras de Skate com Gustavo Ribeiro (Street) e Thomas Augusto (Park) e pedala-se nas BMX freestyle (Ciclismo).

A visão deixa-se ofuscar pelo postal que se segue. Museu Dorsay, antiga estação ferroviária, hoje “cofre” de um riquíssimo acervo de arte moderna e pintura impressionista, de Matisse, Monet, Degas, Van Gogh e Rodin.

A vista alcança a envidraçada pirâmide do Museu do Louvre, obra do ex-Presidente François Mitterrand e a entrada no famoso museu, a maior mostra de arte do mundo, com as pinturas instagramáveis, como “Mona Lisa”, de Da Vinci, a “A liberdade guiando o povo”, de De La Croix e a estátua grega, “A Vénus de Milo”.

O turbilhão de flashes turísticos não cessa e os olhos fixam os inacabados trabalhos de recuperação da Catedral Gótica de Notre Dame, na Île de la Cité, rodeada pelas águas do Sena. A obra prevista cessar em dezembro de 2023, ainda decorre.

Em frente, na margem direita seguindo a rota da cerimónia, o l'Hotel de Ville, imponente fachada neo-renascentista que alberga os Paços do Concelho desde 1387, marca a linha de partida dos 42,195 quilómetros mais esperados.

A Ponte de Austerlitz, marca a saída do tour. O cortejo olímpico parte da ligação metálica e ferroviária entre margens, batizada em honra da vitória de Napoleão na batalha dos três imperadores em Austerlitz, na província da Morávia, opondo o exército francês ao Russo e Austro-húngaro. Ali, o SAPO24 deu meia-volta para regressar ao ponto de partida do passeio e de chegada, da cerimónia.

“A cidade inteira transformar-se-á num enorme estádio olímpico”

No longínquo mês de dezembro de 2021, a propósito da parada de estrelas olímpicas, Tony Estanguet, presidente do Comité Organizador, anunciou que a “cidade inteira se transformará num enorme estádio olímpico. O Sena representa a pista e as margens do rio as bancadas dos espetadores”, descreveu.

“Não há um plano B, ou melhor há um plano B, mas as circunstâncias não exigem que esteja a ser colocado em prática”, sublinhou Marco Alves, chefe da Missão de Portugal aos JO Paris2024, na apresentação ao presidente da República.

A comitiva portuguesa está fechada em números de atletas, mas nem todos os olímpicos desfilarão, o que não é novidade nestas comemorações para a vida.

“Temos 73 atletas e não estarão todos no dia 26. Quem compete dia 27 não participará com toda a certeza na cerimónia de abertura”, antecipou Marco Alves. “O desgaste físico e psicológico que importa essa participação”, assim obriga.

O número de atletas por país e a diferença no número das delegações impacta no desfile. “O que está previsto é que cada país possa ocupar um barco. O desfile seja feito por país. Na circunstância de não haver atletas suficientes para encher um barco, vai haver mistura de países”, salientou.

 “Teremos de apurar quem poderá ir por cada país. É uma reunião que só teremos com o Comité Organizador no dia antes da cerimónia”, anunciou o chefe da missão portuguesa. “Só teremos confirmação se iremos sozinhos ou com algum país no barco já muito em cima da cerimónia”, explicou. “Acima de tudo, é uma questão logística”.

Na Cidade da Luz, a luz natural do pôr do sol, às 19h30 (18h30, hora Portugal Continental), servirá de pano de fundo para o desfile de atletas e missões olímpicas.

Segurança. Segurança. Segurança

Segurança. É a palavra de ordem durante as olimpíadas – Jogos Olímpicos e Paralímpicos – em Paris, Cidade do Amor e da Luz.

À medida que se aproxima o “Dia D”, 26 de julho, a capital francesa restringe a circulação e estabelece diversos perímetros e níveis de segurança. O SILT, perímetro de proteção antiterrorista, é o mais elevado.

Em obediência a um cronograma, há passes digitais (QR CODES) que permitem entrada e circulação e zonas vermelhas de proibição de acesso. Há ruas e pontes fechadas -  e muitas restrições de trânsito.

O espaço aéreo estará fechado no dia mais esperado.

Os números são estratosféricos. Mais de 10 mil atletas, cerca de 200 representações olímpicas e por volta de uma centena de barcos.

Mais de 100 Chefes de Estado e 300 mil pessoas ao longo das margens. Uma centena de milhar com bilhetes senta-se nas bancadas construídas na parte inferior das margens e nas pontes. Mas a festa é para todos, e, por isso, às 200 mil pessoas que poderão, in loco, ver gratuitamente em locais predefinido, juntam-se 1,3 mil milhões a assistir no mundo. E ainda há oito écrans gigantes espalhados ao longo do percurso.

Haverá escolta da polícia marítima e 45 mil polícias civis e militares.

"Não há uma preocupação particular, temos um dispositivo de segurança robusto, para garantir a segurança dos espetadores no cais, e ao logo de todo o percurso da cerimónia, explicou Laurent Nuñez, secretário de Segurança Pública de Paris.

"Temos um dispositivo anti-drone e forças de intervenção especializadas, todas mobilizadas para o dia 26 de julho, para a cerimónia de abertura, não temos nenhuma preocupação e trabalhamos com muita concentração e determinação para garantir a segurança deste desfile", completou em declarações aos media franceses.

“Daremos o nosso coração e alma para que seja um grande sucesso para o povo francês”, afirmou Amélie Oudéa-Castéra, ministra do Desporto. “Merecem”, rematou.

Que comece a cerimónia.

* O jornalista viajou até Paris a convite do Eurosport/MAX