“Na fase pós–covid, nos próximos três a cinco anos, será muito importante promover o crescimento da procura interna, o que só será possível com a melhoria dos salários. […] Repor numa legislatura o peso que os salários tinham há 10 anos no rendimento nacional seria um grande passo nesse sentido”, disse o antigo governante numa conferência sobre “O futuro da negociação coletiva”.

Na conferência, promovida pela UGT, vários sindicalistas defenderam a necessidade de se fixar, como é habitual, um referencial salarial anual para servir de orientação nas negociações com as entidades patronais.

Paulo Pedroso disse, a propósito, que o seu único referencial para o período após a crise pandémica “é encontrar uma fórmula de recuperação faseada” dos rendimentos perdidos na última década.

“Eu poria como objetivo a recuperação de uma década em meia década”, disse o sociólogo.

O académico alertou para elevada percentagem de trabalhadores que em Portugal auferem o salário mínimo nacional, quase 25%, e para a quebra dos salários médios nos últimos 10 anos.

“Tendo em conta as condições de trabalho da última década, a atual fórmula de cálculo das pensões vai gerar pensões muito baixas”, considerou, lembrando a autoria desta fórmula.

Depois de ter sido secretário de Estado do Emprego e Formação, entre novembro de 1997 e outubro de 1999, e do Trabalho e Formação, entre 1999 e 2001, Paulo Pedroso foi ministro do Trabalho e da Solidariedade entre 2001 e 2002 e tutelou a lei de base da segurança social que instituiu a atual fórmula de cálculo das pensões, que têm em conta toda a carreira contributiva dos trabalhadores.

O antigo ministro desafiou a UGT a lutar pela alteração da fórmula de cálculo das pensões ou por sistemas complementares de proteção na velhice para compensar a degradação das pensões que irá resultar da degradação salarial dos últimos anos.

Deixou algumas críticas à central sindical, por, no âmbito do acordo de concertação social do ano passado, não ter tornado mais difícil a caducidade das convenções coletivas.

O professor de direito do trabalho Monteiro Fernandes também alertou para as consequências da caducidade das convenções coletivas, possibilidade legal prevista no Código do Trabalho, que pode “criar o vazio negocial”.

Para este antigo secretário de Estado do Trabalho, a revisão legislativa de 2019 “foi um duro e decisivo golpe na geringonça e constituiu uma vitória patronal”.

António Monteiro Fernandes criticou o baixo valor do salário mínimo (635 euros) em Portugal, comparando com o espanhol (900 euros) e defendeu novos desafios para a contratação coletiva, nomeadamente relacionados com o tempo de trabalho.

Vários sindicalistas da UGT que participaram no debate que se seguiu à conferência falaram das dificuldades que enfrentam na negociação coletiva e de matérias que gostariam de ver em discussão.

O secretário-geral da Federação Sindical da Administração Pública (FESAP), José Abraão, aproveitou a oportunidade para falar da importância da contratação coletiva e, em modo de critica, apelou à UGT que também abordasse esta área, dado que abrange cerca de um milhão de trabalhadores.

O sindicalista defendeu a necessidade de se cruzar a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas com o Código do Trabalho e defendeu que a contratação coletiva deve ser feita entre os sindicatos e as empresas e não na concertação social.

“Quando a administração pública tinha aumentos anuais, estes tornavam-se um referencial para a contratação coletiva, mas hoje temos como referencial o aumento do salário mínimo, o que não faz sentido, pois os salários imediatamente acima estão a ser absorvidos e desvalorizados””, disse José Abraão.