Este encontro no Infarmed, na véspera do Conselho de Ministros, ocorre numa altura em que a incidência de infeções com o coronavírus SARS-CoV-2 subiu para 1.805,2 casos por 100 mil habitantes e o índice de transmissibilidade (Rt) também registou um aumento, passando para 1,43.

Situação epidemiológica em PortugalPedro Pinto Leite (DGS)

  • Pedro Pinto Leite, da Direção-Geral da Saúde, começou por referir na sua intervenção que o país está "numa fase diferente da pandemia", com um maior número de casos — "valores históricos";
  • A incidência cumulativa a 14 dias por 100.000 habitantes encontra-se nos 2.007 casos na semana passada, um valor que corresponde a mais de 131% relativamente ao período homólogo de 2021;
  • A incidência tem vindo a crescer "em todas as regiões do país", com destaque para Lisboa e Vale do Tejo e Madeira;
  • As faixas etárias mais afetadas são as mais jovens, a partir dos 20 anos, embora todas tenham visto um aumento da incidência. Pedro Pinto Leite adiantou que o grupo dos 20 aos 29 anos mantém-se como o grupo etário com maior incidência, seguido dos 30 aos 39 anos e depois os grupos progressivamente mais novos;
  • Quanto à vacinação, há 90% da população com uma dose e 89% com duas. Há uma "elevada cobertura vacinal" no país;
  • Apesar da ajuda da vacinação, o aumento do número de casos tem de ser visto "com alguma cautela", devido à questão dos internamentos e pressão no SNS;
  • O número de internamentos total "encontrava-se com mais 28% em relação ao período homólogo", com uma tendência crescente. Contudo, o internamento em UCI mantém-se estável e abaixo do nível de alerta;
  • Casos internados: aumento em todos os grupos etários, mas mais observado a partir dos 80 anos;
  • O risco de internamento mantém-se inferior nos grupos com vacinação completa, relativamente aos que não têm um esquema vacinal completo;
  • Há uma tendência estável quanto à mortalidade — e até decrescente. De momento, o país apresenta uma mortalidade "moderada";
  • O risco de morte é inferior nos indivíduos com esquema vacinal completo.

Prevalência e transmissibilidade da variante Ómicron — João Paulo Gomes (INSA)

  • Segundo João Paulo Gomes, do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), a variante Ómicron domina já "o cenário epidemiológico em muitos países" (mais de 90, de acordo com a OMS);
  • Em Portugal, são utilizadas duas estratégias para monitorizar a prevalência desta variante: sequenciação (que tem sempre um atraso de mais de uma semana) e monitorização da falha de uma proteína (permite vigilância diária, através das amostras dos testes);
  • Há uma linhagem da variante Delta a circular no Algarve, em muito relacionada ao turismo. Representava cerca de 40% dos casos na região, entre o Natal e o Ano Novo;
  • À data de ontem, cerca de 90% dos casos de Covid-19 no país são da variante Ómicron;
  • A grande disseminação da Ómicron ocorreu na faixa etária aos 20-29 anos;
  • A maior transmissibilidade parece estar relacionada com a capacidade de infeção das vias respiratórias superiores, ou seja, a Ómicron afeta os pulmões em menor escala (comparando com a Delta);
  • João Paulo Gomes  explicou porque é que a gravidade de doença com a variante Ómicron é menor, apesar da maior capacidade de transmissão, referindo que esta variante tem mais mutações na zona de ligação com as células humanas, daí escapar mais ao sistema imunitário e disseminar-se mais facilmente, mas tem menor capacidade de se replicar nos pulmões pela “baixa afinidade com as proteínas específicas dos pulmões”;
  • Citando dados experimentais da Universidade Hong Kong, o especialista indicou que, no caso da variante Ómicron, o processo de replicação nas vias aéreas superiores é 70 vezes mais rápido do que na variante Delta, mas 10 vezes mais lento nas células inferiores do pulmão, o que explica a menor severidade da doença;
  • Acrescentou igualmente que “não há diferença significativa entre infetados com a Ómicron e com a delta no que se refere à carga viral”.

Gravidade da infeção e eficácia das vacinas — Ana Paula Rodrigues (INSA)

  • Ana Paula Rodrigues, do INSA, começou por dizer que esta é uma fase com "um novo padrão de infeções" e, por isso, com "novos desafios";
  • A variante Ómicron começou por afetar grupos mais jovens, o que dificultou a perceção do seu impacto nas restantes faixas etárias;
  • Estudos apontam que há uma capacidade de reinfeção 10 vezes maior com esta variante;
  • A efetividade vacinal contra a Ómicron é "mais baixa do que aquela que foi estimada para a Delta", mas após o reforço da vacina "há um aumento" na ordem dos 80% (embora varie em função da idade);
  • Em outubro, 86% da população portuguesa tinha anticorpos contra a covid-19, em grande parte devido à adesão à vacinação. Assim, a população está mais protegida contra internamentos;
  • Contudo, o grupo entre os 50 e os 59 anos deve ter cuidados redobrados, uma vez que ainda nem todas as pessoas têm a vacinação de reforço;
  • A especialista disse ainda que a imunidade baixa mais rápidamente na variante Ómicron do que o que se verificou na Delta, fruto da maior capacidade de escape ao sistema imunitário;
  • Para a especialista, os dados apresentados até agora não significam " que vamos passar a uma infeção ligeira", esta apenas é mais benigna. Assim, é necessário continuar com as medidas em vigor e com a vacinação de reforço.

Impacto da Ómicron na população portuguesa — Baltazar Nunes (INSA)

  • De acordo com Baltazar Nunes, também do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), "há claramente em toda a Europa uma maior incidência" da covid-19, comparando com o mês de novembro;
  • Em Portugal, o crescimento da incidência é mais acentuado do que na Inglaterra e Dinamarca (12% ao dia). Contudo, é menor no que diz respeito às hospitalizações (2% ao dia);
  • Da análise comparativa entre estes países pode afirmar-se que foi observada uma aceleração da incidência acumulada a 14 dias após o predomínio da variante Ómicron, que começa a ser acompanhada por um aumento do número de camas hospitalares ocupadas (mas abaixo dos máximos históricos);
  • Embora não esteja a ser verificado o aumento dos internamentos em UCI, é necessário ir vigiando a situação;
  • Se as medidas implementadas atualmente começarem a fazer efeito, a incidência poderá vir a reduzir;
  • O máximo de casos pode ser esperado na segunda semana de janeiro (a próxima semana) — valores entre os 42 mil e os 130 mil novos casos;
  • Para cada pessoa infetada haverá três que vão necessitar de estar em quarentena, faltando ao trabalho ou à escola. “Nós podemos assumir que o total de pessoas que podem estar isoladas em quarentena pode variar entre 4 % da população a cerca de 12 % da população”, um valor que pode ser observado ou “na primeira semana atual ou entre a segunda semana de janeiro”;
  • Baltazar Nunes recordou que, em setembro de 2021, numa reunião no Infarmed, o INSA apresentou três cenários prováveis para o outono/inverno.“O terceiro cenário era aquele que nós supúnhamos que havia uma perda de proteção da vacina com o tempo e que surgia uma nova variante do SARS-CoV- 2 em dezembro. Era esperado, foi o que aconteceu no ano passado e neste momento é esse o cenário que temos entre mãos”, salientou;
  • Contudo, observou, há fatores diferentes na variante Ómicron, relativamente a uma variante que na altura se podia esperar com a mesma gravidade da Delta, que têm que ser levados em consideração agora nos cenários para se poder projetar o que é esperado para os meses próximos;
  • Considerou-se então que há um aumento dos contactos em dois momentos: no Natal, mais cerca de 25% relativamente ao aumento considerado no período homólogo, e um aumento inferior durante o Ano Novo de 15%, assumindo-se neste caso que algumas das medidas que foram implementadas neste período fizeram reduzir os contactos relativamente ao aumento de contactos observados no Natal;
  • Portugal ainda está “numa tendência crescente”, mas a expectativa é que as medidas implementadas reduzam em cerca 30% os contactos e haja uma inversão da tendência, começando a decrescer;
  • Mas, avisou Baltazar Nunes, ao levantar estas medidas “vai haver um ‘platô’ de casos e que mais tarde vai traduzir-se num decrescimento da incidência, aqui já pela própria evolução da epidemia”.

Certezas e incertezas da pandemiaHenrique Barros (Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto)

  • Comparando com o período da gripe espanhola (1918-1920), não é ainda possível dizer se esta pandemia ficará resolvida nestes dois anos;
  • Estamos a viver circunstâncias que podem facilitar a propagação do vírus (relativamente à mobilidade da população e à diminuição das medidas de controlo), mas não há um aumento da doença grave;
  • A vacinação funciona e há indicadores vários de vantagem na situação atual, como a diminuição em seis vezes do número de surtos em lares e mais de 10 vezes menos pessoas internadas;
  • A variante Ómicron ainda é desconhecida, pelo que há muitas incertezas associadas neste momento. Assim, "o anúncio do fim da pandemia pode ser ainda bastante exagerado".

Comportamentos e as perceções sociais durante o período das festas — Andreia Leite (Escola Nacional de Saúde Pública)

  • Tem sido uma observada a diminuição do uso da máscara em espaços fechados, em particular no período das festas. O mesmo aconteceu em situações de convívio em grupo;
  • Quanto à testagem, esta aumentou na última quinzena. Cerca de 50% reportavam nunca ter feito um teste à covid-19, número que baixou para 30% na altura das festas — especialmente para proteção das famílias durante a quadra festiva;
  • Por sua vez, aumentou a dificuldade em encontrar testes (devido à grande afluência ou falta de autotestes);
  • 96% das pessoas disseram ter adotado medidas na época festiva: realização de testes antes das reuniões familiares, arejamento dos espaços e limitação do número de pessoas, esquema vacinal atualizado.

Recomendações para a gestão da pandemiaRaquel Duarte (Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto)

  • Há recomendações que se mantém: reforço da vacinação, controlo das fronteiras, monitorização qualidade do ar interior, ter atenção às pessoas mais vulneráveis;
  •  Novas recomendações: tornar os autotestes acessíveis e gratuitos a todos; torná-los válidos para certificado com o acompanhamento de um profissional de saúde a monitorizar (mesmo que remotamente);
  • Perante o aumento do número de casos, é necessário que haja um aumento da "autoavaliação do risco";
  • Foi proposta também uma redução das medidas restritivas, mas com adoção de medidas gerais de combate à pandemia;
  • Os peritos que aconselham o Governo sobre a pandemia de covid-19 propõem ainda que 70% de internamentos em cuidados intensivos e índice de transmissibilidade (Rt) acima de 1 sejam critérios para agravar medidas de contenção e insistem na responsabilização da população;
  • As recomendações apresentadas indicam que, se a linha vermelha for atingida, os restaurantes voltarão a ter um limite de seis pessoas por mesa no interior e a ter de privilegiar os espaços exteriores, os espetáculos em espaço delimitado voltam a ter uma lotação de 75%, assim como os centros comerciais;

  • Neste caso, os peritos sugerem igualmente que o convívio familiar se restrinja a grupos inferiores a 10 pessoas, com uso de máscara fora do período da refeição e testagem prévia, e nas celebrações (casamentos, batizados) deve evitar-se grupos com mais de 100 pessoas, com autoavaliação de risco e testagem;

  • Os especialistas propõem ainda a redução da carga da plataforma Trace Covid (sistema de vigilância de contactos) na atividade dos médicos de Medicina Geral e Familiar, para que se dediquem aos doentes de maior risco que estão em isolamento e aos não covid-19.

Ponto de situação da vacinação — Coronel Carlos Penha-Gonçalves

  • 81% das pessoas com mais de 80 ano estão vacinadas;
  • Há 90% da população com a vacinação iniciada e 88% com a vacinação completa;
  • Doses de reforço: 85% da população acima dos 80 anos já está vacinada, 83% na faixa dos 70 e 79% acima dos 65 anos. No total, três milhões de pessoas já receberam esta dose;
  • O plano, adiantou, é administrar doses de reforço nos próximos dois meses e meio, entre janeiro e meados de março, nas faixas etárias dos 50 anos para baixo, admitindo que poderá avançar já em março a vacinação dos jovens;
  • A maior parte das pessoas que ainda estão por vacinar contra a covid-19 são crianças e jovens entre os 5 e os 20 anos.
  • Há uma fração da população que ainda está à espera da segunda dose porque não é elegível, sendo na maior parte crianças que foram vacinadas no dia 18 e 19 de dezembro;
  • “No que diz respeito ao perfil etário da vacinação primária (…) estamos com altas taxas de vacinação até à faixa etária dos 20 anos e a partir daí para baixo estamos agora a vacinar as crianças entre os 11 e os 5 anos que vão ajudar a melhorar a vacinação e a proteção destas nestas faixas etárias mais baixas”.