“A sensação com que fiquei é a de que Portugal não queria se meter para não perigar a relação confortável que hoje tem [com a Frente de Libertação de Moçambique]. Isso foi mau porque se alguma coisa acontece em Portugal que nos preocupa nós vamos falar sobre isso”, disse Stewart Sukuma, em entrevista à Lusa, em Maputo.

Para o músico moçambicano, a posição de Portugal face a eventuais violações de direitos humanos e em relação às próprias eleições, que classificou como fraudulentas, é resultado de uma relação “histórica com o partido Frelimo”.

“Não nos podemos esquecer que Portugal tem um relacionamento histórico não só com Moçambique, mas com o partido Frelimo”, declarou Sukuma.

O músico entende que, desde o registo de votantes, o processo eleitoral foi marcado por irregularidades, mas, no geral, as anomalias foram ignoradas pela comunidade internacional, contrariando uma postura que tem adotado em outros quadrantes do mundo.

“Foram muito comedidos e agiram de uma forma diferente em relação a outros posicionamentos relacionados a outros países. Usaram dois pesos e duas medidas”, acrescentou.

O artista moçambicano considera ainda que é compreensível que a comunidade internacional procure respeitar a soberania dos Estados, optando pelo “respeito diplomático”, mas é inadmissível que a mesma ignore um “objetivo comum”, a proteção dos direitos humanos, que, segundo o artista, foram constantemente violados durante a crise pós eleitoral em Moçambique.

“A comunidade internacional neste aspeto aliou-se ao sistema por interesses e respeito diplomático que existem (…) A comunidade internacional tem os seus próprios interesses, mas há uma coisa que é de interesse comum: os direitos Humanos, que foram constantemente violados, uma situação que nunca foi de uma forma clara condenada”, declarou.

Os números avançados por organizações da sociedade civil moçambicana apontam para mais 350 mortos durante confrontos entre manifestantes, que rejeitam os resultados eleitorais, e a polícia moçambicana durante uma série de protestos que dominaram Moçambique nos últimos meses, com casos paralisações e vandalizações de diversos estabelecimentos.

Para Stewart Sukuma, as autoridades moçambicanas mostraram “despreparo” em casos de protestos de rua, sobretudo de ponto de vista psicológico.

“Mesmo que um cidadão fosse uma ameaça direta para um agente da polícia, disparar deve ser a última das opções para eliminar o perigo. Só quando já não resta opção mesmo. Sabemos que a nossa polícia não está treinada e preparada para enfrentar manifestações”, frisou.

Moçambique vive desde outubro um clima de forte agitação social, com manifestações e paralisações convocadas pelo antigo candidato presidencial Venâncio Mondlane, que rejeita os resultados eleitorais de 09 de outubro, que deram vitória a Daniel Chapo.

Atualmente, os protestos, agora em pequena escala, têm estado a ocorrer em diferentes pontos do país e, além da contestação aos resultados, os populares queixam-se do aumento do custo de vida e de outros problemas sociais.

Desde outubro, pelo menos 353 pessoas morreram, incluindo cerca de duas dezenas de menores, de acordo com a Plataforma Decide.

O Governo moçambicano confirmou pelo menos 80 óbitos, além da destruição de 1.677 estabelecimentos comerciais, 177 escolas e 23 unidades sanitárias durante as manifestações.

Nascido em 1963, em Cuamba, província do Niassa, Luís Pereira, uma referência da música moçambicana, é conhecido no mundo artístico como Stewart Sukuma, nome que significa "Levantar" em Zulu e 'Empurrar' em Suaíli.

Além da Orquestra Marrabenta Star, fez parte de vários projetos e bandas, entre elas, a Alambique, como percussionista/voz, Mbila, como vocalista, e Formação 82, como percussionista/voz, tendo conquistados vários prémios nacionais e internacionais.

Em 1998, Sukuma mudou-se para Boston, onde ingressou na prestigiada Berklee College of Music.

Autor de álbuns como “Afrikiti”, “Nkuvu”, “Boleia Africana” e “O meu lado B”, combina a música tradicional moçambicana, sobretudo a marrabenta, com a contemporânea, criando estilo musical enérgico e dançante, com sons afro, pop e jazz.