“O sistema de combate a incêndios está preparado e vocacionado, uma vez que assenta muito no voluntariado e nas corporações locais de bombeiros, para as tarefas de defender pessoas e casas, mas não emprega técnicas e análises do comportamento do fogo. Tudo aquilo que é necessário para controlar incêndios maiores e evitar que se propaguem”, disse o docente da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), em declarações à agência Lusa, a propósito do fim da época crítica em fogos (fase Charlie).
Para o investigador do Centro de Investigação e de Tecnologias Agroambientais e Biológicas (CITAB) da UTAD o dispositivo de combate a incêndios respondeu este ano “como sempre”.
“O sistema português de combate a incêndios é essencialmente orientado para a proteção de casas e pessoas, não está capacitado para enfrentar com eficácia grandes incêndios”, justificou.
Segundo o especialista que já realizou vários estudos sobre os incêndios florestais, Portugal e Grécia são os únicos países da Europa com incêndios de grandes dimensões e que não conseguiram reduziram a área ardida.
No entanto, sustentou, em Portugal nota-se mais a deficiência no sistema de combate aos grandes fogos devido às condições naturais mais favoráveis à propagação de incêndios.
Paulo Fernandes considerou também que os políticos e decisores deviam questionar-se sobre os motivos de Portugal continuar a ser o único país a não conseguir reduzir a área ardida.
“A Espanha, Itália e França reduziram a área ardida por volta dos anos 90. Houve algo que mudou mais no combate. Portugal nunca fez essa evolução", disse, sublinhando que “houve iniciativas muito positivas entre 2006 e 2008”, mas que “foram entretanto perdidas”, como foi o caso dos grupos de análise e uso do fogo.
“Houve uma tentativa de injetar conhecimento técnico. Não existe já esse conhecimento da análise do comportamento do fogo que era essencial para identificar oportunidades e impedir que os incêndios sejam tão grandes e durem tanto tempo”, afirmou.
Nesse sentido, o docente da UTAD defendeu a criação de bombeiros florestais, que são aqueles que têm o conhecimento e a formação para enfrentar os incêndios no seu ambiente florestal.
“Não temos bombeiros florestais, ou temos muito poucos, deveria ser feita uma aposta muito importante na formação e na criação de bombeiros florestais, que integrariam, tal como em Espanha, as brigadas de combate de incêndios, que são sempre dirigidas por um engenheiro florestal”, disse.
Paulo Fernandes destacou as competências da Força Especial de Bombeiros e do Grupo de Intervenção de Proteção e Socorro (GIPS) da GNR, que “atacam com eficácia os incêndios no início”, e os sapadores florestais, usados para o rescaldo.
“Temos pessoas formadas e alguma massa critica para o início e fim dos incêndios, mas não temos uma força substancial de bombeiros com competências necessárias para os grandes fogos”, sustentou.
Esta deficiência prejudica, segundo o especialista, a atuação dos meios aéreos, que dependem “basicamente das estratégias e conhecimento” de quem está no combate
“Os meios aéreos não apagam incêndios sozinhos, é sempre preciso o apoio terrestre. Os meios aéreos arrefecem o incêndio para que quem está no terreno conclua o trabalho”, concluiu.
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