Dois anos após o Governo ter avançado com o processo de regularização dos trabalhadores na Função Pública, só foram aprovados 10% dos processos submetidos por 1.509 docentes de instituições de ensino superior e 17% dos 1.668 investigadores doutorados.

Até ao momento, ao abrigo do Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública (PREVPAP) só foram formalizados 16 contratos de docentes e um contrato com um investigador, segundo dados avançados hoje pela Federação Nacional de Professores (Fenprof), Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas (FNSTFPS) e Associação de Bolseiros de Investigação Científica (ABIC).

“Uma das medidas do programa deste Governo é o combate determinado à precariedade. Afinal, nem combate nem determinação. A única coisa que temos é precariedade”, acusou Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, durante uma conferência de imprensa para denunciar a lentidão do processo e “hipocrisia do Governo”.

Mais de seis mil professores, investigadores e outros funcionários de universidades, politécnicos e centros de investigação tentaram regularizar a sua situação profissional. Muitos não foram aceites.

Dos 3.177 processos submetidos por professores e investigadores, as comissões bipartidas (CAB) decidiram corrigir a situação de 434 trabalhadores, segundo dados dos três organismos.

Os trabalhadores queixam-se da lentidão dos processos: Entre os investigadores, “ainda só foi regularizado um caso em mais de 1.600 requerimentos”, alertou Mário Nogueira.

Há investigadores como Luís Coimbra cuja bolsa terminou em maio e está, desde então, “sem qualquer remuneração”.

“Há mais 11 bolseiros do LNEC como eu, sem receber. Há pessoas no LNEC com mais de 20 anos de trabalho”, lamentou o bolseiro no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) há 13 anos, admitindo que o “longo e indefinido” processo do PREVPAP tem causado problemas do foro emocional, que “afetam a produtividade a o ambiente familiar”.

Mas existem outras situações. Na Universidade de Coimbra, por exemplo, “não houve até agora uma única informação sobre se os processos foram deferidos ou indeferidos”, criticou Mário Nogueira.

Eulália Pereira, leitora na Universidade de Coimbra desde 1993, concorreu ao PREVPAP mas ainda não obteve qualquer resposta. Depois de mais de duas décadas de contratos anuais e em exclusividade, Eulália continua a viver na incerteza quanto ao futuro.

A leitora da Universidade de Aveiro Noémia Perez recebeu um parecer negativo. Começou a dar aulas em Portugal em 2001 e decidiu concorrer ao PREVPAP mas o seu requerimento foi indeferido por não ser considerada uma necessidade permanente.

Depois de seis anos com contratos anuais e com um doutoramento, Noémia Perez vai celebrar um contrato parcial como leitora a 50%, o que significa menos horas de aulas e um salário a rondar os 600 euros, contou à Lusa a leitora de Espanhol.

Há ainda os casos dos investigadores que só quando tentaram candidatar-se ao PREVPAP é que descobriram que tinham um contrato com uma instituição privada sem fins lucrativos, apesar de trabalharem em universidades ou laboratórios.

Ana Margarida Ricardo é uma dessas investigadoras. Com uma bolsa da FCT, a jovem tem trabalhado nas instalações do Instituto Superior Técnico (IST), partilha gabinetes, têm horário de trabalho e segue a mesma hierarquia que os colegas com vínculos ao IST. No entanto, não tem os mesmos direitos, contou.

“Foi com alguma surpresa que percebemos que afinal não éramos considerados parte do IST e, portanto, ficávamos fora do PREVPAP quando na realidade todo o nosso trabalho foi sempre vinculado ao IST”, lamentou a bolseira que tem um vinculo à “IST-ID”, uma instituição criada pelo IST.

Ana Margarida diz ter “muitas dezenas ou até centenas” de colegas na mesma situação e nenhum foi admitido ao programa por estarem vinculados a uma instituição privada sem fins lucrativos.

“Nem sequer chegámos à fase de sermos avaliados para se ver se éramos ou não necessidades permanentes”, criticou.

Os representantes dos sindicatos e a ABIC criticaram os valores muito baixos de regularizações entre os trabalhadores do ensino superior e ciência, acusando o Governo de “querer manter a precariedade e assim ter mão-de-obra qualificada e barata”, sublinhou Artur Sequeira, da FNSTFPS.