Poucos foram os familiares que visitaram “Zenu”, como José Filomeno dos Santos é conhecido localmente, e que evitaram discretamente a imprensa à entrada do estabelecimento prisional, apesar do aparato de viaturas topo de gama que começou bem cedo.
O antigo presidente do conselho de administração do Fundo Soberano de Angola (FDSEA) está em prisão preventiva desde segunda-feira, pelo seu envolvimento numa alegada transferência ilícita de 500 milhões de dólares e na má gestão do fundo.
Defronte da cadeia de São Paulo, vários populares, em conversas informais, comentavam a sua incredulidade face ao que está a acontecer em Angola, pois nunca esperaram ver a justiça “abanar” personalidades do antigo regime de Eduardo dos Santos.
“Bom trabalho do homem”, afirmou um dos curiosos, referindo-se ao Presidente angolano, recordando as palavras de João Lourenço proferidas no discurso em que tomou posse como líder do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), a 8 deste mês, em que prometeu uma “luta sem tréguas à corrupção”, envolvendo figuras do partido ou outras.
À medida que a incredulidade passava a certeza, vários outros angolanos, na maioria jovens, salientava que Angola está a viver uma “nova era” com o aparente fim da impunidade, fazendo-se apostas sobre quem será a personalidade seguinte a ser detida.
Em contraste, na área defronte ao estabelecimento prisional, era significativo o número de familiares e amigos do antigo ministro dos Transportes angolano Augusto da Silva Tomás, também detido preventivamente há quatro dias na cadeia de São Paulo sob a acusação de prática dos crimes de peculato, corrupção e branqueamento de capitais, entre outros, tal como referiu então a Procuradoria-Geral de República (PGR) angolana.
Irmãos, filhos e a mulher de Augusto Tomás manifestaram-se “solidários” com o antigo ministro e exteriorizaram isso mesmo com a presença no estabelecimento prisional situado no distrito urbano do Rangel, arredores de Luanda, tal como a Lusa constatou no local.
Jornalistas angolanos e de órgãos de comunicação social estrangeiros também marcaram presença, mas não conseguiram obter quaisquer reações de parentes dos detidos.
Segundo fontes contactadas pela Lusa, a direção do Hospital Prisão da cadeia de São Paulo deve transferir apenas para o período da tarde a vista dos familiares de Augusto Tomás e José Filomeno dos Santos no sentido de garantir a “regular e normal” visita a outros reclusos na unidade prisional.
José Filomeno dos Santos foi presidente do conselho de administração do Fundo Soberano de Angola, nomeado pelo pai, então chefe de Estado angolano, e, entretanto, exonerado pelo atual Presidente, João Lourenço, em janeiro deste ano.
“Zenu” é acusado, segundo a PGR, de envolvimento num crime referente a uma alegada burla de 500 milhões de dólares, processo já remetido ao Tribunal Supremo, bem como, ainda em fase de instrução, de num processo-crime relacionado com atos de má gestão do Fundo Soberano de Angola, em que é também arguido o empresário suíço-angolano Jean-Claude Bastos de Morais, sócio de José Filomeno dos Santos em várias negócios, e que está também em prisão preventiva na cadeia de Viana.
Segundo a PGR, da prova recolhida nos autos resultam indícios de que os arguidos incorreram na prática de vários crimes, entre eles, o de associação criminosa, recebimento indevido de vantagem, corrupção, participação económica em negócio, puníveis na Lei sobre a Criminalização das Infrações Subjacentes ao Branqueamento de Capitais e os crimes de peculato, burla por defraudação, entre outros.
“Pela complexidade e gravidade dos factos, com vista a garantir a eficácia da investigação, na sequência dos interrogatórios realizados, o Ministério Público determinou a aplicação aos arguidos da medida de coação pessoal de prisão preventiva”, lê-se no comunicado, salientando que a instrução prossegue os seus trâmites legais, com caráter secreto.
Em relação a Augusto Tomás Silva, também num comunicado, a PGR referiu que o processo corre os seus trâmites na Direção Nacional de Investigação e Ação Penal (DNIAP), relacionado ao caso que investiga atos de gestão do Conselho Nacional de Carregadores (CNC), órgão afeto ao Ministério dos Transportes.
O documento informa também que, além do ex-governante, foi igualmente detido Rui Manuel Moita, ex-diretor-geral adjunto para a Área Técnica do CNC.
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