Nesta história em que o sucesso está em ganhar vontade de sair de casa, aceitar a condição e correr, Alexandre Clementino e Bárbara Pereira formam a equação que permitiu ao projeto “Sexto Sentido” atravessar o oceano Atlântico e convencer cada vez mais pessoas a correr.
Natural de São Paulo, Alexandre, a residir no Porto desde 2017, encontrou na Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal o meio para instalar o projeto, aí conhecendo Bárbara, cega desde o mesmo ano, para dela fazer a “embaixadora” cá, contou à Lusa.
“Está a ser incrível. Conheci o Alexandre em 2018 e comecei a praticar a corrida guiada com ele, pois precisava de ter um escape (…) o desporto trouxe-me essa liberdade de movimentos. Gostei tanto que quando dei por mim estava a arrastar os meus amigos e a chamar outras pessoas cegas e com baixa visão para participar”, testemunhou Bárbara.
A recente chegada de um patrocinador abriu perspetivas para o grupo e é da participação em provas, da chegada de mais guias e do crescimento a nível nacional que é feito o horizonte mais próximo do “Sexto Sentido”.
“Estão a entrar muitos guias para o projeto e estamos a conseguir divulgar por quase todo o país, e já temos um segundo grupo em construção em Lisboa”, revelou a responsável, que se afirma empenhada na criação de “vários polos espalhados pelo país onde as pessoas com deficiência consigam fazer desporto quase autónomo, sem estarem dependentes de familiares ou amigos”.
O projeto começou a ganhar dimensão há um ano e hoje há um grupo no WhatsApp “que pode ser consultado a qualquer hora” para combinar “correr ou caminhar”, explicou Bárbara, referindo-se a uma interação entre atletas e guias que nem “sempre é fácil”.
“Por cada pessoa com deficiência o ideal é termos três guias, pois isto é consoante a disponibilidade dos guias, não há aqui nenhum tipo de obrigação e vamos rodando”, assinalou a responsável para aludir à necessidade de se “juntarem mais guias ao projeto”.
Precisando que o projeto se destina a “pessoas cegas ou com baixa visão”, Bárbara assinalou, também, que “não é apenas corrida, também pode ser marcha acelerada”.
“O engraçado é começar na marcha e depois há quem já queira ir para a corrida. Não conheço nenhum projeto em Portugal como o nosso, lúdico e que faça a inclusão através do desporto”, disse.
Exemplo disso, Ana Eduarda, hoje a “primeira paraciclista cega em Portugal”, contou à Lusa que “não gostava de correr”, mas que em 2019, ao aceitar o convite da Bárbara para integrar a equipa, começou a “desenvolver o gostinho pelo ar livre e pelo desporto”.
“O desporto é altamente inclusivo e, para além disso, ajuda bastante na adaptação da pessoa com deficiência na sociedade. Depois da minha perda de visão foi o desporto que me ajudou na minha inclusão e na minha aceitação da deficiência”, contou.
Guia e marido de Bárbara, Ricardo Ribeiro contou que, no Porto, entre atletas e guias já contabilizam “cerca de 20 duplas a correr”, um número que classificou de “muito bom”.
Recentemente a equipa participou num ‘trail’ em Ferreira do Zêzere com “algumas duplas, creio que cinco”, contou o guia, um desafio que os obrigou a contornar “escadas, ribanceiras, rios, todo um sem número de obstáculos que em corrida é mais difícil de fazer com um atleta cego”.
“Participar já é uma vitória. A ideia, de facto, não é conseguir um tempo, mas, numa primeira fase, juntar as pessoas. Essa é a primeira grande vitória. Depois é pôr a pessoa em contacto com a natureza, em contacto com a rua, pôr o atleta com alguma sensação de liberdade (…) é prazeroso para todos”, assegurou à Lusa.
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