“O Governo promete uma reforma florestal e a revogação da chamada lei do eucalipto e continua na mesma, isso é triste”, afirmou à Lusa João Branco, presidente da Quercus.

Para o também engenheiro florestal, “são precisas situações deste tipo para que os políticos se lembrem disso”, referindo-se ao incêndio de Pedrógão Grande, distrito de Leiria, que se iniciou no sábado e já matou pelo menos 61 pessoas, todas civis.

João Branco recordou que este ano foi aprovada uma reforma florestal, mas, dos dez pontos do pacote, “apenas três ou quatro foram publicados e são irrelevantes”.

A reforma florestal, prosseguiu, “até teve um efeito perverso” com a promessa de o Governo acabar com a lei da liberalização do eucalipto, o que provocou “uma corrida” a esta espécie.

Segundo o dirigente ambientalista, só no passado inverno foram vendidas mais de três milhões destas plantas, que são altamente inflamáveis e combustíveis, e cujas folhas e cascas podem ser projetadas em condições de incêndio e iniciar novas ignições a centenas de metros.

O presidente da Quercus destacou que o grande incêndio de Pedrógão Grande aconteceu justamente em grandes manchas de eucaliptal desordenado, numa região conhecida ironicamente como pinhal interior, e de fraca gestão, em que os proprietários só lá voltam basicamente para cortar.

A questão não é nova, assinala, e já no ano passado se discutiu a política florestal no seguimento dos incêndios do Caramulo e Funchal, e também com vítimas mortais.

João Branco disse, ainda, desconhecer o número de municípios que adotaram a legislação da defesa da floresta contra incêndios e, desses, quantos a cumprem, observando que a Quercus apresentou uma queixa à Procuradoria-Geral da República em 2013 sobre este assunto, que foi arquivada.

“É um total laxismo da administração central e de diversos órgãos”, entre os quais os municípios, frisou. “Há responsáveis políticos para isto”, acusou, a começar pelos titulares dos ministérios da Agricultura e do Ambiente.

Outra associação ambientalista, a Zero, também lamentou a tragédia de Pedrógão Grande, alertando que fenómenos como aqueles que parecem ter contribuído para este incêndio terão mais condições de se replicar no futuro.

“Num período de alterações climáticas, que tende a propiciar estas ondas de calor, estes fenómenos vão ser mais frequentes”, referiu Paulo Lucas, dirigente da Zero, assinalando igualmente que se trata de uma região acidentada e de floresta desordenada, maioritariamente de eucalipto, à semelhança de muitas outras no interior do país.

A Zero defende, no entanto, que a maioria dos mecanismos de política florestal já existem, embora se pudesse ter ido mais longe na última reforma, nomeadamente na gestão comum da propriedade, ou na capacidade de resposta de pequenas aldeias, isoladas em manchas florestais, através da instalação de bocas de incêndio, “porque os bombeiros não conseguem estar em todo o lado”.

“Uma reforma florestal não se faz de um momento para o outro, leva tempo, mas há medidas simples que podem ser adotadas”, segundo Paulo Lucas, a propósito de “imagens de pessoas a fazer frente a fogos com mangueirinhas e que acabam por perder os seus bens, o que é perfeitamente lamentável nos tempos que correm”.