A informação foi avançada à Lusa pela presidente do Banco Alimentar Contra a Fome (BACF), Isabel Jonet, que lançou a iniciativa há exatamente um ano, durante o primeiro estado de emergência.
Quem agora recorre à rede de emergência tem, na maior parte das vezes, histórias bem diferentes das de quem há muito conta com o auxílio dos bancos alimentares.
“São sobretudo pessoas que nunca recebiam ajuda, que tinham a sua vida organizada. Tinham até dois empregos e perderam um deles ou mesmo os dois”, disse a presidente do BACF.
À Rede de Emergência Alimentar chegam relatos de quem pediu um empréstimo para iniciar um negócio próprio que não chegou a abrir por causa do confinamento ou de quem teve de fechar pouco depois da inauguração.
Às histórias dos empresários, juntam-se os dramas dos seus empregados que também ficaram sem trabalho.
“Estamos a falar, por exemplo, de pessoas ligadas ao setor da estética, da restauração, da cultura, dos ginásios, os ‘personal-trainers’, os higienistas e os dentistas”, deu como exemplo Isabel Jonet.
A presidente do Banco Alimentar lembrou ainda todos os que trabalham em feiras: “Muitas pessoas que por vezes esquecemos, que fazem romarias no verão e que deitam fogo de artifício, os que vendem farturas ou cachorros. Estas pessoas estão desde março do ano passado sem poder trabalhar, sem ter rendimentos”.
Em apenas um ano, os serviços dos centros de emprego registaram um aumento de mais 100 mil pessoas que tinham perdido os seus rendimentos.
Os últimos números do Instituto de Emprego e Formação Profissional apontavam para mais de 400 mil desempregados em Portugal. Mas existem muitos casos que não chegam ao conhecimento dos serviços dos centros de emprego.
“Nós não podemos deixar que estas pessoas percam a esperança e desistam, porque isso seria dramático”, sublinhou Isabel Jonet.
Por isso, quando a pandemia obrigou o país a abrandar, a presidente do Banco Alimentar sabia que “a ajuda não podia parar”, até porque os pedidos de auxílio “estavam a aumentar”.
A 19 de março do ano passado lançou a Rede de Emergência Alimentar, uma plataforma online onde é possível pedir auxílio sem sair de casa.
“Os formulários online permitem resguardar o anonimato e dar uma resposta a quem, não estando habituado a lidar com a pobreza, tinha vergonha ou sentia algum desconforto em mostrar que estava a pedir ajuda”, acrescentou Isabel Jonet.
Este novo projeto não se limita a dar apoio alimentar. Há um atendimento social que faz um retrato da família e permite perceber se, por exemplo, falta “um computador para a criança seguir as aulas online e não perder o ano”.
A Rede de Emergência também ajuda a pagar a renda da casa, a conta da água ou da luz. A ideia é apoiar no momento certo para que possam “dar outra vez a volta à sua vida”.
Mas também o Banco Alimentar se defrontou com problemas complicados quando começou o confinamento.
A descoberta dos primeiros casos de infetados em Portugal levou o país a fechar-se dentro de portas, num movimento nacional ao qual as instituições não escaparam.
No Banco Alimentar Contra a Fome, os voluntários mais velhos foram aconselhados a ficar em casa por precaução e foram suspensas as duas campanhas anuais de angariação de alimentos, que punham nas ruas de todo o país mais de 42 mil voluntários.
As instituições que trabalham com os bancos alimentares, desde associações de bairro a igrejas, também foram obrigadas a fechar as portas.
Mas a ajuda nunca falhou, garantiu Isabel Jonet.
Os alimentos continuaram a chegar ao armazém através de donativos de muitas empresas e da “generosidade de escuteiros, escolas e empresas” que lançaram as suas próprias campanhas.
Os trabalhadores mais velhos dos bancos alimentares – “muitos com mais de 80 anos” - foram temporariamente substituídos por colaboradores mais jovens. Isabel Jonet recorda a ajuda dos estudantes que estavam fartos de estar fechados em casa e dos professores temporariamente sem trabalho, contou à Lusa.
As pessoas, em nome individual, e o conjunto de organizações que estão no terreno a trabalhar para a Rede de Emergência Alimentar “foram a almofada de segurança deste país, evitando casos de rutura social”.
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