Em entrevista à agência Lusa, o ministro da Administração Interna anunciou que esta reforma de “separar a natureza da PSP e da GNR” e de partilhar “tudo o que não é estritamente operacional” deve estar concluído até ao final da legislatura.
“Significa cada vez mais olhar para a Polícia de Segurança Pública como uma polícia urbana, uma polícia das cidades, e olhar para a Guarda Nacional Republicana como uma polícia da coesão territorial na sua dimensão terrestre como força que está presente às vezes até em localidades em que a presença do Estado é a Junta de Freguesia e a GNR”, disse.
Eduardo Cabrita frisou que esta clarificação da “natureza urbana da PSP e da natureza de força de coesão territorial e de guarda costeira da GNR” terá “consequências muito significativas” nos modelos de recrutamento e de organização.
Sobre esta dimensão da GNR enquanto “força de guarda costeira”, o governante avançou que está a concluir-se uma rede de radares que vai permitir reforçar a presença da Guarda Nacional Republicana na Madeira, seguindo-se depois um processo similar nos Açores.
O governante salientou também que avançar “com aquilo que é uma dimensão de profunda reforma na área da segurança significa pôr em comum aquilo que é partilhado”.
“Vamos começar por coisas como pagar vencimentos, iremos a seguir para coisas que não têm nenhuma especialidade policial, como comprar combustíveis”, precisou, dando conta que o objetivo “é por em comum os serviços” e “tudo o que é possível de partilhar entre as duas forças”, nomeadamente tecnologias e áreas de suporte e de logística.
O ministro disse ainda que esta intervenção “está a ser feita discretamente porque envolve um trabalho imenso”.
“Recrutamentos adicionais” na PSP e GNR para compensar atrasos de 2020
O ministro da Administração Interna disse hoje que o plano plurianual de admissões nas forças de segurança foi “de algum modo afetado” pela pandemia, mas avançou com “recrutamentos adicionais” a partir deste ano para a PSP e GNR.
“O que foi de algum modo afetado pela pandemia tem a ver com termos pela primeira vez um planeamento plurianual de admissões e não foi possível. Quando as universidades estavam fechadas e as escolas fechadas, ter incorporações [na PSP e GNR] seria um risco para a saúde”, disse Eduardo Cabrita.
O plano plurianual de admissões prevê a entrada de 10 mil elementos para as forças de segurança até 2023 e estava previsto ter começado em 2020 com um curso com dois mil novos elementos para a PSP e GNR.
“Estivemos abaixo disso em 2020 fruto da pandemia, mas vamos ter níveis adicionais de recrutamento, quer em 2021 quer nos anos seguintes”, anunciou, sustentando que ter uma programação plurianual “é essencial”, mas o primeiro ano deste plano foi afetado pela pandemia de covid-19.
O ministro sublinhou que no ano passado foram “recrutadas menos pessoas” do que estavam previstas, não se tendo iniciado qualquer curso na GNR e na PSP apenas se realizou uma incorporação em dezembro com quase 800 alunos.
“Estamos aqui num tempo particularmente difícil e portanto é evidente que a pandemia ao cair-nos em cima de todos, ao cair no primeiro ano desta programação plurianual veio afetar. Em 2020 recrutámos menos pessoas do que devíamos ter feito”, precisou.
Eduardo Cabrita avançou com a abertura de concursos “para reservas de recrutamento significativas”, uma vez que o Orçamento do Estado deste ano permitiu “uma transição de saldos não utilizados”, possibilitando a recuperação em 2021 e nos próximos anos “daquilo que foi um menor recrutamento em 2020”.
Nesse sentido, o governante anunciou que, em abril, vai ter início um novo recrutamento na GNR com um modelo em que entram 200 a 300 formandos em cada dois meses, totalizando 1400 até ao final do ano.
“Em vez de termos um grande recrutamento vamos ter faseadamente 1.400 novos militares da GNR a iniciarem a sua formação entre abril e dezembro. Isto significa o maior quadro de recrutamento desde há bastantes anos”, frisou.
Relativamente à Polícia de Segurança Pública, o ministro afirmou que está a decorrer uma nova reserva de recrutamento que prevê também o início de formação de 1200 elementos.
“Não me recordo neste século de nenhum recrutamento desta dimensão”, disse, recusando que exista um problema de recrutamento nas forças de segurança.
Quando questionado sobre o curso de formação que começou no ano passado na PSP, mas que apenas entraram 793 candidatos para 1000 vagas, o governante referiu que se tratava de “um recrutamento antigo”.
Para o ministro, o problema muitas vezes reside na falta de habitação para os novos polícias que são colocados sobretudo em Lisboa.
De acordo com Eduardo Cabrita, este problema tem uma resposta no Orçamento do Estado e no Plano de Recuperação e Resiliência em que passa por dar prioridade às condições de alojamento adequadas aos jovens polícias.
Inspetores do SEF vão integrar PSP, GNR ou PJ após reestruturação
Os inspetores do SEF vão integrar a PSP, a GNR ou a Polícia Judiciária, forças que vão acolher as funções policiais deste serviço após a sua reestruturação, anunciou o ministro da Administração Interna.
Eduardo Cabrita avançou que o SEF vai passar a chamar-se Serviço de Estrangeiros e Asilo e terá como grande função o apoio aos imigrantes e refugiados que vivem em Portugal.
O governante explicou que a reforma, que passa pela separação entre as funções policiais e as funções de autorização de documentação de imigrantes, está prevista no programa do Governo e irá desenvolver-se ao longo de todo este ano.
“Esse processo foi já discutido no Conselho Superior de Segurança Interna e neste momento o processo legislativo está em curso dentro do Governo”, precisou.
O ministro adiantou que os inspetores do SEF vão passara para a PSP, GNR ou para a Polícia Judiciária, tendo em conta “a reorganização das funções de natureza policial”.
Eduardo Cabrita sustentou que atualmente já cabe à Polícia de Segurança Pública a segurança aeroportuária, sendo o controle sanitário nos aeroportos feito pela PSP e pelo SEF articuladamente, enquanto a Guarda Nacional Republicana tem hoje as responsabilidades de guarda costeira e controlo de fronteira terrestre.
“Nas fronteiras terrestres, tivemos uma articulação entre a GNR e o SEF”, disse, considerando que existem vantagens dos crimes tráfico de seres humanos e de imigração ilegal passarem a ser investigadas pela Polícia Judiciária.
O ministro frisou que o pessoal "da carreira de inspeção beneficiará desta dimensão de escala de estar inserida em forças com uma dimensão diferente”, disse, destacando que a GNR “beneficiará de ter pessoas que são do SEF com uma experiência de controlo de fronteiras” e que a segurança aeroportuária vai ganhar “uma dimensão integrada e global”.
Questionado se o SEF como existe atualmente vai acabar, Eduardo Cabrita limitou-se a responder “que é cumprido [com esta reestruturação] o programa do Governo” e que o Serviço de Estrangeiros e Asilo, designação que o Governo tem apontada preliminarmente, “tem uma função extremamente importante”.
“O Serviço de Estrangeiros e Asilo tem uma função extremamente importante na sua dimensão externa em que apoia aquilo que é o papel de Portugal na discussão da política europeia de asilo e migrações. Os mecanismos de simplificação, nos mecanismos de gestão de vistos, na simplificação de procedimentos que levaram por exemplo a que cerca de 100 mil pessoas tenham tido a sua autorização de residência renovada em tempo de pandemia de forma automática”, disse.
Eduardo Cabrita reafirmou que a reestruturação do SEF não está relacionada com a morte do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk nas instalações deste serviço no aeroporto de Lisboa em março de 2020 e com a acusação de homicídio qualificado a três inspetores, sendo uma matéria que já estava a ser preparada.
Destacou o papel da Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) naquilo que foi o apuramento do que se passou no aeroporto, tendo ido “muito além do Ministério Público”.
“A morte de um cidadão estrangeiro no aeroporto é uma tragédia que não tem nada a ver com a forma de atuação das forças de segurança portuguesas e de um país que é uma referência europeia e mundial na forma como trata refugiados e imigrantes. Portanto isso envergonha-nos a todos e por isso a nossa atuação foi imediata junto da embaixada da Ucrânia”, salientou.
O ministro frisou também que falou com a viúva de Ihor Homeniuk e que a indemnização à família do cidadão ucraniano foi aquela que foi “atribuída em Portugal no prazo mais curto e de maior montante”.
Eduardo Cabrita sustentou igualmente que a questão da indemnização “não podia ter sido atribuída mais cedo, porque não havia acusação”, nem o relatório “final da IGAI, que é uma peça decisiva”.
Questionado se alguma vez pensou em demitir-se, o governante disse: “Não, como disse o único dia em que eu podia ter pensado nisso era no dia 30 de março [quando soube das suspeitas de crime na morte de Ihor Homeniuk], mas exatamente aí o responsável pelo estado de emergência, pela gestão da monitorização do estado de emergência, o que tem de ter é os nervos de aço para atuar de imediato”.
[Célia Paulo (texto) e João Relvas (fotos), da agência Lusa]
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