Contactado pela Lusa, Carlos Brito, que deixou o partido há quase 20 anos, considerou que a escolha de Paulo Raimundo para secretário-geral do PCP “foi totalmente inesperada”. “Para mim foi uma surpresa”, confessou.

Para o antigo líder parlamentar comunista, a escolha do dirigente de 46 anos como sucessor de Jerónimo de Sousa “não é o que o PCP precisa nesta fase”, com a bancada reduzida a seis deputados e metade das autarquias que tinha perdidas.

“É um nome totalmente desconhecido, embora já fizesse parte do Secretariado e da Comissão Política”, sustentou Carlos Brito, membro do movimento Renovação Comunista.

Paulo Raimundo “pode ser um excelente organizador” e um nome com peso “para dentro”, mas o PCP devia estar a pensar “para as massas, para o povo”.

Domingos Lopes, outro “renovador”, partilha da mesma opinião, mas diverge num detalhe: “Ao contrário do que se podia esperar, não é uma surpresa.”

Para o antigo dirigente comunista, que saiu do partido em 2009, o PCP de 2022 insiste no marxismo-leninismo, logo, “é natural que nestas circunstâncias, a direção tenha encontrado alguém que tenha este perfil, que possa perpetuar a vida do partido de acordo com estes pressupostos ideológicos”.

O PCP de hoje, continuou Domingos Lopes, está “sintonizado completamente” com o “início do século XX” e Paulo Raimundo é alguém “que se situa neste patamar”.

“Surpresa é existir um partido que continua a orientar-se, apesar da implosão da União Soviética e dos países socialistas, pelos mesmos pressupostos que levaram à implosão naqueles países”, completou.

Domingos Lopes discorda que o PCP tenha escolhido alguém da “linha dura”: “Não sei se é dura ou mole. É uma linha que é tão mole que leva a que partido vá perdendo influência.”

A crítica, segundo garantiu, “não é pessoal”, mas havia membros do Comité Central “com grande capacidade política” enquanto de Paulo Raimundo “não sabemos nada”, afirmou.

“Nunca vimos o Paulo Raimundo num debate político, no contraditório com a sociedade. Provavelmente, dentro do partido é capaz de ser um grande quadro, mas […] é necessário convencer não só os militantes comunistas, devia ser alguém que as pessoas conheciam”, elaborou.

Os portugueses “conheciam Carlos Carvalhas” e sabiam que tinha sido candidato presidencial e à Câmara de Lisboa e Jerónimo de Sousa era deputado constituinte, recordou Domingos Lopes.

Já o renovador comunista Cipriano Justo, numa publicação na rede social Facebook, preferiu enaltecer o secretário-geral cessante, Jerónimo de Sousa, que conseguiu “afastar a direita do poder, em 2015, ao subscrever um acordo com o PS”.

O operário de 75 anos foi “sempre uma personalidade decisiva nas campanhas eleitorais da CDU” e a ele “se fica a dever a diminuição dos preconceitos que ainda existem sobre” os comunistas.

“Sempre o tive em elevada consideração, admirando a forma como se dedicou ao mais elevado cargo para o qual os seus camaradas o elegeram. No momento da sua substituição, envio-lhe uma saudação calorosa, com votos de o continuar a ver nos combates que os comunistas têm de continuar a travar”, concluiu.

O dirigente comunista Paulo Raimundo, funcionário do partido desde 2004, apresentado no site do PCP como operário, exerceu vários ofícios, desde carpinteiro e padeiro até animador cultural.

Raimundo vai substituir Jerónimo, “o retrato fiel do operário e a pessoa que melhor representava no parlamento a origem social do PCP”, como o descreveu o antigo deputado António Filipe em 1996, ano em que Jerónimo se apresentou como candidato presidencial.

A proposta de Paulo Raimundo para substituir Jerónimo de Sousa partiu do Secretariado e foi, entretanto, acolhida pela direção comunista, apesar de ter provocado “alguma surpresa” no Comité Central, como admitiu Jerónimo de Sousa, em conferência de imprensa no domingo.

A substituição foi conhecida no sábado passado, através de comunicado enviado pelo gabinete de imprensa do PCP, ao início da noite, que dava conta da iniciativa de Jerónimo de Sousa de colocar a questão da sua saída aos órgãos do partido.