O Índex Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar, promovido pela Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), indica que, apesar de tudo, este valor baixou relativamente aos dados de 2018, quando era um problema grave para a totalidade das instituições.

As roturas graves de medicamentos e o facto de a utilização de medicamentos não ser baseada em resultados reais são as dimensões que apresentam valores mais baixos no índex, que para 2020 se situa nos 66%.

“Além das roturas há também a incapacidade que atualmente as instituições têm para medir os resultados dos medicamentos, ou seja, não basta termos acesso a um medicamento (…), importa perceber se esse medicamento está a ter resultados clínicos para o doente”, explicou o presidente da APAH.

Alexandre Lourenço lamenta que, apesar da legislação e da própria vontade da agência reguladora (Infarmed), ainda não se consiga avaliar realmente os efeitos dos medicamentos que estão a ser usados, particularmente os muito dispendiosos.

Um em cada três hospitais abrangidos neste relatório considera que as roturas afetam apenas medicamentos com genéricos, mas 44% dizem que afetam todos os medicamentos (eram 26% em 2018). Metade diz que acontecem mensalmente e 30% semanalmente.

Este trabalho, que teve a coordenação científica da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa e o apoio da Ordem dos Farmacêuticos, refere ainda que, dos que monitorizam os resultados das novas terapêuticas, apenas 28% efetuam análises de dados relativos à utilização dos medicamentos em contexto de vida real.

Na identificação das barreiras ao acesso do medicamento, o documento aponta a carga administrativa (70%), a ineficiência dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (50%) e a falta de verbas disponíveis (37%).

Burocracia é a grande barreira na compra de novos medicamentos

A carga administrativa é a grande barreira no processo de compra de novos medicamentos, segundo um relatório hoje divulgado, que indica que 87% dos hospitais utilizam novos fármacos antes da decisão de financiamento.

De acordo com o Índex Nacional do Acesso ao Medicamento Hospitalar, o tempo médio entre o pedido feito pelo médico e a aprovação pelo Infarmed de novos medicamentos baixou para 15 dias (21 dias em 2018).

Já entre a decisão do Infarmed e a compra do medicamento o período aumentou para 13 dias (12 em 2018).

O estudo conclui que a maioria das instituições hospitalares utilizam medicamentos antes da decisão de financiamento, garantindo na globalidade o acesso à inovação terapêutica, embora com níveis de acesso diferentes, o que gera desigualdades.

Os responsáveis continuam a insistir na excessiva carga administrativa como a grande barreira no processo de aquisição de novos medicamentos.

“Têm que existir mecanismos, mesmo na contratação pública, que venham a criar mecanismos mais ágeis para aquisição deste tipo de bens, como os medicamentos”, defende Alexandre Lourenço, presidente da APAH.

Em declarações à Lusa, o responsável defende ainda que “faz algum sentido que possa existir uma maior articulação entre os compradores, neste caso os hospitais, individualmente, ou mesmo através de centrais de compras, como por exemplo os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, para desenvolver parcerias de médio e longo prazo com os próprios fornecedores para que esta carga administrativa seja aliviada”.

“Aqui também existe um caminho a percorrer, necessariamente para uma revisão e adaptação do código da contratação pública ao setor hospitalar, mas também de equacionar novos modelos de parceria com os fornecedores que venham a agilizar a dispensa de medicamento”, acrescentou.

O documento mostra igualmente que 57% das unidades consideram que o processo de aquisição de medicamentos não é desencadeado atempadamente e 10% sentiram que o fator preço/modelo de financiamento foi uma barreira para o acesso a algum medicamento.

A maioria dos hospitais considera que faria sentido a aquisição de medicamentos em determinadas áreas no âmbito de negociações por via europeia e que, desta forma, se poderia acelerar o acesso à inovação e conseguir preços mais baixos.

Pela positiva, o relatório conclui que a maioria das instituições (87%) tem programas de dispensa de medicamentos de proximidade, mais de metade (54%) dos quais criados no contexto da pandemia de covid-19.

A este respeito, Alexandre Lourenço diz que este é um ponto positivo, embora reconheça que “ainda há caminho a fazer”.

“Uma preocupação que as instituições tiveram […] foi o alargamento dos programas de dispensa de medicamentos em proximidade e o facto é que 87% das instituições hospitalares implementaram estes programas”, afirmou o responsável, sublinhando: “É uma grande evolução e é algo que nós consideramos desejável que venha a acontecer de forma mais generalizada, até fora da pandemia”.

Estes programas permitem evitar que os doentes tenham de se deslocar ao hospital para levantar um determinado medicamento, facilitando o acesso através dos centros de saúde, farmácias comunitárias (de bairro) ou até com recurso a transportadoras que levam a medicação até ao domicílio.

Segundo o relatório hoje divulgado, dos 87% dos hospitais que têm programas deste género, mais de metade (54%) criou-os durante a pandemia. Os dados mostram ainda que 58% dos hospitais entregam os medicamentos no domicílio e na farmácia comunitária.

“Não faz sentido ter um doente, muitas vezes com elevada incapacidade, a deslocar-se uma vez por mês a uma instituição hospitalar para levantar o medicamento. O que faz sentido é que sejamos capazes de colocar esse medicamento em proximidade, seja através da rede do SNS seja com recurso às farmácias de oficina ou a outros mecanismos de articulação com outras entidades que possam fazer essa dispensa do domicílio do doente. E aí ainda há um grande caminho a percorrer”, afirmou Alexandre Lourenço.